O silêncio dentro do carro era espesso como fumaça. O motor roncava pela estrada escura de volta à cidade, mas ninguém parecia ouvir. Evelyn encarava o vidro lateral como se estivesse em outro lugar. Jules mexia no celular, sem foco real. Mila olhava para o chão. Cassie tamborilava os dedos no apoio de braço. Rafe dirigia.
Cada um com seus pensamentos. Cada um com o mesmo peso na mente.
O R.
A carta.
A foto.
E… o Rafe.
— Vamos falar sobre o óbvio ou fingir que tá tudo normal? — Cassie foi a primeira a quebrar o gelo.
Jules ergueu o olhar.
— Qual “óbvio”? Porque tem uma porção de absurdos pra escolher.
Cassie se virou para o banco da frente, onde Rafe segurava o volante.
— Tipo o fato de que a letra que tá assinando tudo… é R. E a única pessoa com R no nome aqui dentro é ele.
— Sério que a gente vai começar com isso? — Rafe retrucou, sem tirar os olhos da estrada.
— Cass… — Mila começou, hesitante. — Isso pode ser só coincidência.
— Pode — disse Cassie. — Ou pode ser exatamente o que parece.
— Eu tô dirigindo — disse Rafe, mais duro agora. — Talvez esperem a gente chegar vivo antes de me acusar de ser um psicopata.
— Ninguém te chamou de psicopata — rebateu Jules. — Ainda.
— Gente… — Evelyn sussurrou. — Espera.
— Não, Eve, é melhor a gente falar logo — insistiu Cassie. — Vamos juntar as peças. Ele sabe de tudo. Ele vive calado, observando. Sempre tem uma explicação. Sempre um comentário pronto.
— E vocês tão esquecendo que ele desapareceu na noite da festa do ano passado? — Jules completou. — Ninguém sabia onde o Rafe tava quando a Savannah sumiu.
A tensão subiu como um maremoto.
Rafe apertou o volante com força.
— Eu já disse onde eu tava naquela noite. Eu saí mais cedo porque tive uma crise de ansiedade, eu—
— Ninguém viu — cortou Cassie. — E ninguém te encontrou depois.
— Você tá me ouvindo?! — Rafe se virou, o rosto contraído. — Eu não tenho nada a ver com isso. Eu perdi a Savannah também! Ela era minha amiga!
— Então por que você parece saber mais do que a gente? — Evelyn falou baixo, mas firme.
Todos a encararam.
— Você sabia da carta antes da gente, não sabia? — ela continuou. — Você foi direto pra casa dos Penhascos com a gente, mas agiu como se esperasse encontrar algo.
— Porque alguém precisa ter cabeça fria! — ele rebateu. — Vocês tão surtando, fazendo acusações sem provas. Sabe quem age assim? Gente que quer desviar a atenção de si mesma.
— Uau — Jules murmurou, sarcástico. — Agora virou “o atacado se defendendo atacando”.
— Quer saber? — Rafe jogou o carro pro acostamento e freou bruscamente. A tensão explodiu em um solavanco.
Todos se endireitaram, surpresos.
— Se vocês realmente acham que eu sou esse tal de R — disse ele, com a voz embargada — então digam agora. Olhem nos meus olhos e digam.
Cassie foi a primeira.
— Eu não confio mais em você, Rafe.
Ele piscou lentamente.
— E você, Jules?
— Cara… eu não sei. Tá tudo estranho. Mas admito que... tudo isso é suspeito.
— Mila?
Mila hesitou. Seu olhar era triste.
— Eu quero acreditar em você, Rafe… mas... é difícil. As peças estão se encaixando demais.
Ele riu. Um riso seco, ferido.
— Ótimo.
— Eu não disse que acredito que é você — Evelyn falou. — Mas eu também não posso mais confiar cegamente.
Rafe balançou a cabeça devagar.
— Legal. Então é isso. Um ano de amizade jogado no lixo por causa de uma letra pintada na parede.
— Não é só isso — Cassie rebateu. — É o conjunto todo. Você pode ser o R, sim. Você é inteligente, reservado, sabe onde cutucar. E se a Savannah soubesse demais... talvez ela soubesse de você.
O silêncio voltou. Mas dessa vez, era um tipo diferente de silêncio.
Um silêncio que quebrava.
Rafe ligou o carro novamente e dirigiu o resto do caminho sem dizer uma palavra.
—
Na manhã seguinte, Evelyn mal conseguiu dormir. Ela ficou deitada por horas, os olhos grudados no teto, lembrando do olhar de Rafe no banco do motorista. Aquela dor, aquele choque…
Mas algo ainda não batia.
Ela se levantou, pegou o celular e abriu a foto da carta de Savannah novamente.
“Ele está mais perto do que você imagina.”
Mas Rafe nunca foi “perto”. Não dela. Eles eram amigos, sim. Mas a relação dele com Savannah… era distante. Um respeito mútuo, talvez, mas nada íntimo. Nada que justificasse aquele “ele” tão perigoso.
Talvez... o R fosse outra coisa. Outra inicial. Um apelido. Uma pista falsa.
Ou talvez… fosse exatamente o que todos temiam.
—
Mais tarde naquele dia, o grupo se encontrou no parque central. A tensão do carro ainda pairava entre eles como um fantasma.
— O Rafe não respondeu no grupo — disse Mila, sentando-se na grama. — Será que ele vem?
— Eu duvido — disse Cassie, mordendo o canudo do milkshake. — Ele tá provavelmente bolando a próxima carta ameaçadora.
— Você tá indo longe — Evelyn disse, exausta.
— Tô sendo realista — rebateu Cassie.
Jules olhou em volta.
— Ok, e se... e se ele não for o R? E se alguém quer que a gente pense isso?
— Manipulação clássica — disse Mila. — Divide o grupo. Causa briga. Facilita o próximo passo.
— Isso é coisa de filme — retrucou Cassie, mesmo sem tanta certeza.
— E a nossa vida virou um filme — murmurou Evelyn. — Só que sem roteiro feliz.
—
Enquanto falavam, um celular vibrou. Jules olhou o próprio, depois Mila. Todos fizeram o mesmo.
Mas o celular que vibrava… estava ali, no chão. Esquecido.
Era o de Rafe.
Mila pegou.
— Ele deixou isso aqui?
— Abre — disse Evelyn.
Mila hesitou, mas desbloqueou com a digital. A tela mostrou uma única notificação, de uma pasta de notas.
Uma nota fixada.
Ela abriu.
Ali, escrito em caixa alta, estava:
“NEM TODO SEGREDO DESAPARECE COM O TEMPO.”
A mesma frase da tela do celular na casa dos Penhascos.
Todos se entreolharam.
— Isso confirma — disse Cassie, triunfante. — Rafe é o R.
— Ou... — Evelyn disse — ele foi o próximo alvo.
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Atualizado até capítulo 37
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