Apenas Mais Um Dia Para o Início do Fim

Apenas Mais Um Dia Para o Início do Fim

Cinzas do Amanhecer

A bruma rastejava como dedos velhos sobre o musgo frio da floresta. As árvores, tão antigas que os anéis de seus troncos dariam voltas no tempo, permaneciam imóveis. Nenhum vento, nenhum canto de pássaros. Apenas o som distante da água escorrendo entre pedras — como um sussurro antigo demais para ser entendido.

Entre essa imensidão verde e silenciosa, havia uma cabana.

Pequena, torta, feita de madeira bruta e musgo, parecia prestes a ser devorada pela própria floresta. Mas ali, entre raízes e neblina, um homem vivia.

Ryn.

Ele cortava lenha, como fazia todas as manhãs, mesmo que tivesse o suficiente empilhado para meses. Não por necessidade, mas por hábito.

O machado descia com precisão metódica. A lâmina era afiada com pedras que ele próprio polia. Os movimentos eram firmes, cadenciados. Braços que nunca tremeram. Costas retas.

Cabelos pretos caíam sobre o rosto, molhados pela névoa. A barba longa ocultava parte da mandíbula — bem desenhada, mas esquecida de vaidade. Suas roupas eram simples, costuradas de peles e fibras secas, gastas, mas funcionais. Seus olhos, escuros como carvão, observavam tudo… e nada.

Ele não pensava sobre o tempo. Nem sobre o que era, nem sobre o que viria. O passado era um borrão intocado. O futuro, irrelevante.

Na manhã anterior, a árvore que cortava caiu com um estalo surdo.

Naquela manhã, cairia outra.

Era o suficiente.

Ele sentou-se na soleira da cabana. A madeira rangia. O vapor de sua respiração flutuava no ar frio. Seus dedos estavam sujos de terra e seiva, e ele observou as mãos por longos segundos, como quem contempla um objeto esquecido num canto da memória.

Ele lembrou que já havia sentido algo ali — uma vez. Algum calor. Alguma tristeza. Algum tipo de coisa... humana.

Mas era distante demais agora.

Do alto de uma pedra próxima, um veado o observava. Olhos alertas, corpo estático.

Ryn apenas olhou de volta. Nem curiosidade, nem ameaça. Apenas... presença.

O animal, eventualmente, se foi. Como todos.

Na floresta de Mavernia, ninguém chegava. E ele nunca saía.

Ao redor de sua casa cresciam ervas que floresciam fora de estação. Cogumelos que só existiam ali. O solo ao redor parecia mais fértil, o ar mais calmo. Mas não era por desejo. Era simplesmente porque o mundo preferia se adaptar à sua presença do que confrontá-la.

A água que fervia sobre o fogo soltava um leve aroma de folhas. Ele não se lembrava do nome da planta, mas a colhia toda semana. A bebida não tinha gosto. Mas aquecia.

Um pensamento atravessou sua mente como uma brisa inesperada:

"Talvez eu devesse arrumar a cerca."

Mas a cerca estava lá havia milênios. Algumas estacas já tinham virado pó. Outras estavam firmes, apesar de inclinadas.

Ela não servia para nada. Nem para proteger, nem para marcar território.

Mas era a cerca dele.

Ryn caminhou até ela, passou os dedos pela madeira envelhecida. Uma parte quebrou com o toque. Ele a deixou cair.

Não havia planos para o dia. Nem expectativa. Nem tédio.

A existência, para ele, era um rio — e ele havia parado de lutar contra a corrente fazia tempo. Flutuava. E isso bastava.

Quando o sol rompeu finalmente a névoa, seus raios dourados tocaram os galhos mais altos.

O céu clareou devagar, como um véu sendo retirado dos olhos do mundo.

Ryn olhou para cima por um instante.

E então… fechou os olhos.

Não por emoção.

Mas porque a luz era forte demais.

O som da madeira cedendo em estalos pequenos era constante. Uma viga no canto da cabana parecia estar mais inclinada do que no dia anterior. A porta rangia mesmo com o vento parado. O telhado escorria gotas de umidade antiga, mesmo sem chuva.

Ryn olhou ao redor, os olhos escuros varrendo cada rachadura, cada falha no tempo.

A cerca, as paredes, as cordas penduradas com ervas secas. Tudo havia cumprido seu papel.

Ele não suspirou. Nem refletiu muito. Apenas pensou:

"Já cumpri minha estadia aqui."

Sem cerimônia, voltou para dentro, pegou o que considerava essencial: um machado, algumas peles, uma pequena faca de osso que ele mesmo talhou, e um cantil feito de couro e resina.

O resto? Deixaria. A floresta saberia o que fazer com tudo aquilo. Sempre soube.

Sem olhar para trás, ele adentrou a mata.

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A Caminhada pela Floresta de Mavernia

A floresta não era apenas vasta — era viva.

Cada passo era amortecido por uma espessa camada de folhas antigas e raízes entrelaçadas como veias do próprio mundo. O cheiro de madeira úmida, musgo e flores raras preenchia o ar, espesso e puro. A luz filtrava-se entre as copas altas, criando manchas douradas que dançavam sobre a terra.

Ryn caminhava sem pressa. Seus pés já conheciam caminhos onde nem trilhas existiam.

No trajeto, criaturas o observavam à distância.

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Ele conhecia bem a floresta, algumas zonas conhecidas por ele:

Borda de Mavernia – Região que faz fronteira com o mundo humano.

A vegetação ali é mais comum, com algumas trilhas de caça, é o lugar onde crescem as Siltras, ervas com propriedades calmantes, muito popular por quem se aventura nas bordas da floresta garimpando plantas e ervar para vender na cidade.

As Três Fendas – Três desfiladeiros profundos na região de profundidade intermediária da floresta, as pessoas raramente alcançam esta parte por conta dos perigos e caminhos acidentados, esta região é onde vivem as Arak’kui, criaturas insetoides com cascos duros e veneno paralítico.

Ryn evita passar por ali. Não por medo. Apenas porque o som delas o incomoda.

Atravessando a região intermediária, encontra-se a Nascente Branca – Lago de águas cristalinas com fundo leitoso, protegido pelas Myren, serpentes aquáticas que cantam como pássaros ao amanhecer, humanos nao chegam nesta parte da floresta e se chegam, as Myren cuidam para que nunca saiam dali.

Passando pela Nasceste Branca e indo floresta adentro, encontra-se o bosque da Névoa Morta – Parte mais densa da floresta, onde a luz do sol quase não entra.

Criaturas como os Hulgroms — grandes felinos com presas curvas e camuflagem natural — caçam ali. Mesmo eles evitam Ryn enquanto caçam.

O lugar onde Ryn se encontra agora é o coração de Mavernia – Nenhum nome humano alcança essa parte.

É onde as árvores são tão altas que desaparecem na neblina superior, e o chão parece pulsar levemente sob os pés.

É aqui que a Arkheia pulsa mais forte — tão densa que o ar vibra.

Foi lá que Ryn parou, quando seus olhos encontraram a clareira.

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A Clareira na Colina

Um círculo natural de grama macia e baixa se abria entre as árvores.

Era como se a floresta tivesse escolhido, espontaneamente, criar aquele espaço.

No centro, uma colina suave elevava o terreno, permitindo ver o céu por entre os galhos distantes. Havia um pequeno córrego límpido, serpenteando próximo à borda, com água gelada e transparente, onde peixes de escamas azuis deslizavam lentamente.

O ar era fresco, com cheiro de folhas novas e seiva.

O chão era firme, perfeito para construir.

Ryn se abaixou, passou a mão pela grama.

A textura era fria, úmida, e estranhamente agradável.

Ele sentiu que seria ali. Não por razão ou intuição. Apenas... foi.

Sem perder tempo, começou o trabalho.

A construção da nova casa.

Com árvores próximas, ele selecionou madeira de qualidade.

Dessa vez, não apenas cortou troncos brutos, como sempre fez.

Ele descascou, alisou, mediu, empilhou. Trabalhou a madeira com paciência e precisão, decidiu se estabelecer naquele lugar, entao queria fazer bem-feito.

Decidiu a estrutura da casa começando pela sala – Ampla, com uma lareira simples de pedras no canto. Um tapete de pele de cervo cobria parte do chão.

Na cozinha – Separada apenas por um balcão de madeira. Colocou ali na parede ganchos para ervas e raízes secar, um suporte de ferro forjado à mão para panelas.

Banheiro – Simples, mas funcional. Feito com canaletas de pedra e lençol de água subterrâneo que ele desviou manualmente.

Dois Quartos – Um com uma cama larga o suficiente para duas pessoas, coberta por peles macias de raposa-da-névoa. O outro, vazio, mas limpo, sem uso.

Ele não sabia o porquê de construí-lo. Apenas construiu.

Pra quem vive tanto quanto a própria terra, a passagem do tempo é insignificante, e la estava, seu novo lar.

O clima da casa era de aconchego.

O cheiro de madeira fresca impregnava o ar.

A fumaça da lareira ainda nova subia suavemente pela chaminé rudimentar enquanto Ryn assentia com um sorriso satisfeito.

O som constante do córrego próximo servia como fundo, uma trilha natural que ele sempre apreciou.

Durante os dias de construção ele caçou, curtindo o couro, limpando ossos, criando ferramentas, tapetes, bancos e estantes.

Nada era comprado. Tudo era feito com as próprias mãos.

Agora, Mavernia havia ganho um novo centro outrora silencioso: uma casa bem construída, no meio do nada, habitada por um homem que ninguém conhecia.

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