A primeira mensagem dele chegou na manhã de terça-feira.
Rafael Monteiro:
“A sua equipe no instituto é admirável. Queria agradecer mais uma vez por me receber. Estou pensando em voltar, se você não achar que seria incômodo.”
Sorri sozinha, olhando para a tela do celular por tempo demais. As palavras eram formais, mas o que vinha nas entrelinhas era mais suave. Havia delicadeza na forma como ele escrevia. E eu, mesmo querendo manter distância, respondi.
Helena:
“Não seria incômodo. Mas se você aparecer de novo de camisa dobrada e cara de CEO em retiro espiritual, as alunas da costura vão desmaiar.”
Quase imediatamente ele respondeu:
Rafael:
“Se você estiver por perto, garanto que vão continuar respirando.”
Meu coração bateu mais forte.
Era isso que ele fazia. Jogava frases no meio da rotina, como quem atira pequenas faíscas, e eu passava o resto do dia tentando apagar o incêndio que vinha depois.
Aos poucos, nossas conversas se tornaram frequentes. Começamos a trocar mensagens todos os dias — às vezes sobre o projeto, outras sobre coisas banais, como café, livros ou frases aleatórias.
Ele sempre dizia algo que me fazia rir. Ou pensar. Às vezes, as duas coisas ao mesmo tempo.
Mas o pior era que, aos poucos, ele estava entrando na minha rotina. E isso doía.
Doía porque eu queria mais. Doía porque eu ainda achava que não merecia. E doía, acima de tudo, porque sentia que estava me transformando em alguém que poderia se apaixonar — e isso me aterrorizava.
Na sexta-feira à noite, durante o jantar em família, meu pai mencionou casualmente que Rafael Monteiro tinha ligado.
— Ele quer rever o planejamento estratégico. Disse que gostaria de conversar com você também, Helena — ele comentou, pegando mais um pedaço de carne.
Minha mãe, que até então cortava o peixe com concentração cirúrgica, parou o movimento.
— Com a Helena?
Meu pai assentiu, distraído.
Isadora largou os talheres com mais barulho do que o necessário.
— Mas por quê? Ele tem nossa equipe inteira de projetos à disposição.
— Ele disse que a Helena tem uma visão sensível sobre os impactos do projeto social — respondeu meu pai, como se estivesse citando um dado estatístico.
Minha mãe manteve o sorriso social nos lábios, mas o olhar dela queimava. Eu conhecia aquele olhar. O mesmo que ela lançava quando eu dizia que não ia ao salão de beleza, ou quando escolhia um vestido “impróprio para meu biotipo”.
— Acho ótimo você se envolver mais, filha — ela disse, com doçura ensaiada. — Mas cuidado para não criar... expectativas fora da realidade.
Foi como uma facada. Pequena. Precisa. Fatal.
Ela queria me lembrar do meu lugar.
E talvez ela estivesse certa.
No dia seguinte, Rafael apareceu no instituto sem avisar. Vestia jeans escuros, camiseta preta e tênis. A barba por fazer deixava seu rosto mais humano. Menos CEO. Mais homem. E o pior: mais perigoso para o meu coração.
— Achei que não viesse — comentei, surpresa.
— Achei que você estivesse me evitando — ele rebateu, encarando-me de forma direta demais.
— Talvez eu esteja.
Ele sorriu de lado.
— Posso saber por quê?
— Porque eu ainda não sei o que você quer.
Ele parou, cruzando os braços enquanto me olhava.
— Eu quero te conhecer.
— E o que mais?
— Não sei ainda. Mas estou disposto a descobrir. Com você. Sem pressa. Sem máscaras.
Aquilo me desmontou.
Eu queria recuar. Criar uma barreira. Dizer que ele estava apenas brincando, que homens como ele não se apaixonam por mulheres como eu.
Mas em vez disso, levei-o até a estufa do projeto ambiental, o canto mais calmo do instituto. As crianças já haviam ido embora, e a luz do fim da tarde filtrava pelas folhas como em uma pintura antiga.
— Aqui é meu lugar favorito — falei, tentando mudar o rumo da conversa.
— Agora é o meu também — ele respondeu, a voz mais baixa. — Você fica diferente aqui.
— Diferente como?
— Mais leve. Mais você.
Fechei os olhos por um momento, sentindo a garganta apertar.
— Às vezes acho que não sei mais quem sou de verdade.
— Posso te ajudar a lembrar, se quiser.
E foi ali que ele estendeu a mão, sem pressa. Não para me tocar. Mas como um convite.
Eu olhei para aquela mão por um longo tempo. E, pela primeira vez em anos, me permiti aceitá-la.
Os dedos dele se fecharam ao redor dos meus com firmeza, mas com gentileza. Eu tremia. Ele percebeu, mas não disse nada. Apenas me deu tempo. E isso era tudo o que eu mais precisava.
Naquela noite, de volta ao meu quarto, deitei com a mão ainda sentindo o calor da dele.
Ele não me beijou.
Não tentou me seduzir.
Mas me olhou como se eu fosse feita de vidro precioso, daqueles que não se tocam com brutalidade.
E essa delicadeza partiu algo dentro de mim.
Porque nunca, em toda a minha vida, eu havia sido tratada como alguém digna de cuidado.
E agora, com apenas alguns gestos, Rafael Monteiro estava mudando tudo.
Tudo.
Inclusive… a forma como eu olhava para mim mesma.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 68
Comments