Império de Mentiras
Ana tinha 27 anos e sempre foi uma mulher bonita, com longos cabelos castanhos encaracolados. Sua pele, cor de jambo, era tão macia que lembrava a delicadeza de um pêssego. Apesar de levar uma vida simples, sempre enfrentando dificuldades financeiras, vivia cercada de amor, carinho e respeito por parte de seus pais. Ela nasceu em uma família com seis irmãos. Três faleceram ainda na juventude, enquanto os outros dois seguiram seus próprios caminhos. Ana, porém, permaneceu para cuidar dos pais. Sua vida mudou completamente quando o pai adoeceu gravemente e não pôde mais trabalhar. Ana se viu obrigada a conseguir um segundo emprego para sustentar a casa. Trabalhava em dois lugares e, mesmo assim, encontrava tempo para cuidar dos pais. Foi em uma conversa com sua mãe, numa manhã qualquer, que decidiu iniciar um curso superior. Com grande alegria, ingressou em uma faculdade. Naquela época, sua mãe fazia faxinas em casas de famílias ricas. Ana seguiu os conselhos da mãe. Fez uma prova e conseguiu uma bolsa de estudos. Dedicada, acordava às quatro da manhã para chegar à fábrica de chocolate às seis. Saía às 14h e corria por três quarteirões para chegar à lanchonete às 14h30. Depois, seguia para a faculdade, onde estudava pedagogia com muito interesse, afinal, sempre sonhou em ser professora. Quando estava no penúltimo semestre, a saúde de seu pai piorou drasti camente. Ele precisaria de um tratamento específico, disponível apenas em um hospital renomado em São Paulo. No dia em que ouviu o médico falar, com um tom desinteressado, quase como se quisesse encerrar qualquer esperança que ainda restava, Ana sentiu o chão se abrir:
— É isso. Neste hospital, não podemos fazer mais nada pelo seu pai — disse o médico.
— Como assim, doutor? Quem pode? Onde pode? Me fale! Eu darei um jeito, mas vou levar meu pai, e ele vai ficar bom! — Ana, em São Paulo há um tratamento para essa doença, mas é muito caro. — E o que o senhor quer que eu faça? Desista da vida do meu pai? Deixe-o morrer à míngua? Isso, jamais! — Não é isso. Só estou dizendo que não posso fazer mais nada. Mas vou te passar o contato de um hospital. Vá até lá e converse com essa pessoa. O médico rabiscou algo num papel e entregou a ela. Seu olhar, no entanto, denunciava que achava aquilo uma perda de tempo — o tratamento custava cerca de 400 mil reais, e ele sabia das condições financeiras de Ana. — Essa pessoa é o diretor e dono do hospital. Converse sobre o tratamento do seu pai, explique sua situação e pergunte como pode pagar esse dinheiro. Eu vou ligar para ele e explicar as condições do seu pai. Isso é tudo o que posso fazer.
Ana saiu do hospital sem chão. Faltaram-lhe as palavras, a força. Mas a esperança ainda pulsava dentro dela. Ao chegar em casa, sentiu o cheiro de café fresco e ouviu o som suave de sua mãe mexendo na cozinha. Assim que percebeu a filha entrando, correu até ela, ansiosa por noticias do marido. Ana, com o coração partido, explicou a situação. Por fim, disse determinada: — Amanhã vou para São Paulo. Vou conversar com o diretor desse hospital. Doutor Oscar me passou o endereço. Vou descobrir como posso pagar. — Filha, quatrocentos mil é muito dinheiro pra gente. Nós somos pobres. Nem se vendermos essa casa conseguimos pagar isso... — balbuciou a mãe, lembrando que a casa velha, comprada com o marido quando ainda eram noivos, custara no máximo cinquenta mil. — Mãe, vou pedir as contas no trabalho. Assim, junto um dinheiro com a rescisão. — Ana... e como vamos viver? Meu salário mal dá pra me sustentar aqui, imagina manter também você e seu pai em São Paulo. — Mamãe, uma coisa de cada vez. Primeiro vou até o hospital. Ver se aceitam uma entrada. Não sei, mãe... não sei, mas preciso ir lá. — Será que seus irmãos não podem ajudar? — Dificil... Moisés mal tira o suficiente pra ele e a família naquela fazenda, trabalhando de vaqueiro. E o Matheus, a senhora sabe, é borracheiro. Só ganha pra comer. Mas liga pra eles, explica a situação. Vai que conseguem alguma coisa. No dia seguinte, Ana saiu cedo. Pegou o primeiro ônibus rumo à grande São Paulo. Ao chegar, se deparou com outro mundo. Na rodoviária, homens de todos os tipos abordavam os passageiros mais perdidos, oferecendo corridas de táxi, cada um com um preço diferente. Pessoas andavam apressadas de um lado para o outro, sem tempo para um "bom dia" ou um "até logo". Era tudo muito diferente de Linhares, cidade litorânea do Espírito Santo, onde ela nascera e crescera. Com o endereço do hospital na mão, Ana perguntou a um dos taxistas quanto custaria a corrida. Ficou chocada: se pagasse aquilo, não teria dinheiro nem para comer. Sentou-se, desolada, num banco, sem saber o que fazer. Foi quando uma jovem vendedora de balas se aproximou e sentou ao seu lado, insistindo para que comprasse uma. Ana tirou uma moeda do bolso e entregou à moça. Ao receber a bala, a vendedora perguntou: — Pra onde você vai? Ana mostrou o papel com o endereço e perguntou se dava pra ir a pé. A jovem a olhou com compaixão. — Querida, esse lugar é muito longe...
— Mas eu preciso chegar lá. O táxi é muito caro...
— Esquece táxi. Olha só... tá vendo aquele ônibus ali, do outro lado da rua?
— apontou. — Ele te deixa na porta. Vai custar um terço do que aquele homem te cobrou. Ana sorriu, aliviada e grata. Naquele momento, soube que não estava sozinha — Deus estava com ela.
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Atualizado até capítulo 52
Comments
Miran Duarte
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2025-08-09
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