A primeira manhã de Maelys Duarte como secretária da presidência da Alvarén Corp foi como mergulhar em um oceano gelado: tudo à sua volta parecia calmo, mas as correntes por baixo ameaçavam engolir.
O 32º andar era um mundo à parte dentro da própria empresa. O silêncio ali era mais denso, mais afiado. Cada passo ecoava como se o chão cobrasse atenção. Os funcionários que circulavam por aquele corredor se moviam rápido, com olhos baixos e sorrisos tensos, como soldados obedientes demais para respirar fora do ritmo.
A mesa de Maelys ficava a poucos metros da porta dupla que levava à sala de Ciro Alvarén. Era uma mesa ampla, elegante, com dois monitores, um telefone de linha direta e uma agenda digital com a rotina dele já sincronizada. Ela chegou dez minutos antes do horário, respirou fundo e organizou tudo de forma metódica. Cada caneta em seu lugar. Cada papel pronto.
Por fora, ela estava impecável.
Por dentro, uma parte de si tremia.
Mas Maelys aprendera cedo a não demonstrar fraquezas — principalmente diante de homens que adoravam encontrá-las.
Às nove e cinco, a porta se abriu.
Ciro saiu da sala com passos calmos, mas havia algo predatório na forma como se movia. Seus olhos varreram o ambiente até pousarem nela. Houve uma pausa. Um olhar demorado, como se estivesse mapeando um território. Depois, ele apenas disse:
— Traga para mim os relatórios da Jernak Holdings e a ata da última reunião do conselho. Dez minutos.
Sem esperar resposta, voltou para a sala, deixando a porta entreaberta.
Maelys levou exatos oito minutos para encontrar os documentos, organizá-los em uma pasta e levá-los até ele. Bateu suavemente na porta antes de entrar.
Ciro a observou em silêncio quando ela surgiu diante de sua mesa. O terno dele era escuro, a camisa branca, impecável. Nenhum botão fora do lugar. Nenhuma expressão que não fosse calculada.
Ela estendeu a pasta com firmeza.
— Aqui estão os documentos solicitados, senhor.
Ele pegou a pasta sem tocar em sua mão, mas seus olhos ficaram presos nos dela por um segundo a mais do que o necessário. Curiosidade e algo que lembrava provocação. Não disse obrigado. Apenas abriu a pasta e começou a ler.
— Você estudou na Universidade de Elira, certo?
Maelys assentiu.
— Sim, senhor. Bolsista integral. Concluí o curso em tempo recorde.
Ele não levantou os olhos.
— Por que administração?
— Porque é a base de tudo. Famílias, empresas, hospitais, instituições... tudo desmorona sem organização. Eu queria entender como o poder se distribui. E quem fica com os restos.
Aquilo fez os olhos dele se erguerem, quase surpresos.
— Filosófico para alguém que trabalha com agendas.
— Com todo respeito, senhor — disse ela, séria —, a agenda de um CEO pode derrubar ou salvar centenas de vidas. Não subestimo a importância do que faço.
Ciro não sorriu. Mas algo no canto de sua boca pareceu quase se mover. Ele não estava acostumado a esse tipo de firmeza. Estava acostumado a submissões, a risos forçados, a deslumbres. Não a garotas que falavam como se estivessem numa trincheira e não em um prédio de luxo.
— Muito bem, senhorita Duarte. Continue assim.
Ela assentiu e saiu, sem apressar os passos, sem virar o rosto. Apenas fechou a porta com o mesmo cuidado com que se fecha um livro importante.
Ao longo da semana, Ciro observou.
Maelys não conversava com ninguém além do necessário. Recusava convites para café. Não se distraía. Cumpria suas tarefas com precisão quase militar. Havia nela uma compostura que o intrigava. Era como se ela pertencesse a outro mundo e, ainda assim, se encaixasse naquele com uma dignidade que ninguém esperava.
Certa tarde, ao passar pela recepção do andar, ele a encontrou organizando uma série de planilhas manuais que o setor financeiro havia deixado de lado. Era tarefa de outro departamento, mas ela fazia mesmo assim.
— Isso não está entre suas funções — ele disse, cruzando os braços.
Ela olhou para ele com calma.
— E deixar o trabalho acumular também não está entre minhas convicções.
Havia algo irritante e admirável naquela resposta. Ciro a encarou por um instante antes de dar meia-volta e entrar em sua sala.
Ali dentro, sozinho, ele riu — uma risada seca, sem som.
Sim, ela era diferente. E isso estava deixando o jogo mais... perigoso.
Kael apareceu em sua sala no final da sexta-feira, rindo como se já soubesse algo.
— E então? Progresso?
Ciro digitava algo no notebook, sem erguer os olhos.
— Estou conhecendo o campo de batalha.
— Ela parece à prova de você, irmão.
— Ninguém é à prova de mim — respondeu, baixo.
— Humildade nunca foi seu ponto forte.
— Eu não aposto com humildade. Aposto para vencer.
Kael riu, levantando as mãos em rendição.
— Só não se esqueça de que ela não é uma peça no tabuleiro.
Ciro finalmente levantou os olhos, e havia algo diferente neles. Uma fagulha que podia ser desejo. Ou admiração. Ou... curiosidade.
— Ainda não. Mas todos se tornam.
Naquela noite, Maelys voltou para casa exausta. O prédio em que vivia rangia nas estruturas, e o corredor cheirava a fritura. Sua mãe a esperava com um prato aquecido no micro-ondas e os olhos cansados. O pai, adormecido no quarto, respirava com dificuldade.
Ela se sentou à mesa, esfregando as têmporas.
— Como foi o primeiro dia? — a mãe perguntou, baixinho.
Maelys pensou por alguns segundos.
— Como se eu tivesse entrado num lugar onde todos falam uma língua que não entendo... mas esperam que eu finja que compreendo perfeitamente.
— E você vai conseguir.
Ela sorriu, sem brilho.
— Não tenho escolha, mãe.
Em algum lugar de Velmora, Ciro Alvarén observava as luzes da cidade pela janela do apartamento onde morava sozinho. Um copo de uísque na mão, a pasta com os dados de Maelys sobre a mesa. Nome completo. Histórico familiar. Diagnóstico do pai. Registro de escolas públicas.
Ele tinha tudo. Menos a chave para quebrar a muralha que ela erguia em torno de si.
Mas jogos não o assustavam.
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Atualizado até capítulo 56
Comments
Euridice Neta
Não entendo porque ele quer brincar c os sentimentos de alguém que só quer ter o suficiente pra ter uma vida digna e cuidar dos seus pais, será cansaço da vida de riquinho que tem tudo e não sabe o que algumas pessoas passam pra ter o Mínimo de dignidade? Ou será só pra ter o prazer de brincar e humilhar uma pessoa?
2025-07-06
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Mariaadriana Silva
que idiota esse Ciro está sendo aff, mas não sabem o que espera ✋️ ele vai cair do cavalo 🐎 á se vai 🤣🤣🤣🤣
2025-07-09
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bete 💗
vai se arrepender ❤️❤️❤️❤️❤️
2025-07-03
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