ISADORA
O restaurante do hotel cheirava a café moído na hora, croissant recém-saído do forno e gente importante. Ali, não se comia. Se negociava. Se fechavam contratos com um aperto de mão, e sorrisos eram usados como armas diplomáticas.
Mas eu só queria limpar as mesas e sair dali.
— Mesa três precisa ser liberada — murmurou Luan, o garçom. — O executivo grego pediu aquela vista.
— Tudo bem. — Peguei meu pano e me aproximei, discreta.
Foi quando o vi.
Sentado na poltrona de couro branco, lendo algo no tablet com expressão grave, ele parecia pertencer àquele lugar. Tão naturalmente quanto o mármore nas colunas. Era imponente, refinado. Estava de terno agora. Azul-marinho, camisa branca. Nada nele era exagerado, mas tudo nele chamava atenção.
E então ele me viu.
Nosso olhar se cruzou. E por um instante, tudo parou.
A bandeja na minha mão tremeu. Eu respirei fundo e virei o rosto. Não podia me dar ao luxo de parecer desconcentrada.
Mas então…
— Senhorita? — a voz dele ecoou atrás de mim.
Parei. Olhei por cima do ombro.
Ele estava de pé, alto, elegante, como se o mundo ao redor não existisse.
— Sente-se comigo. Por favor.
Eu o encarei, sem entender.
— Perdão, senhor? Eu estou em serviço.
Ele deu um meio sorriso.
— Só por um minuto. Prometo que não vou causar problemas à sua supervisora. — E apontou para a mesa com dois lugares. — Eu só quero conversar. É meu primeiro café do dia, e digamos que prefiro boa companhia.
Meu coração deu um salto. Eu não deveria. Eu sabia.
Mas algo no olhar dele não era arrogante. Era quase solitário.
Assenti, hesitante. Olhei para Marcie, do balcão. Ela ergueu uma sobrancelha, mas não impediu.
Sentei devagar. Cruzei as mãos no colo.
— Qual o seu nome? — ele perguntou, a voz baixa.
— Isadora.
— Isadora — repetiu, como se estivesse provando o som. — Bonito. Firme. Espanhol?
— Espanhol-americano.
Ele assentiu, os olhos fixos nos meus.
— Stephanos — disse, estendendo a mão.
Apertei com cuidado. Era quente. Forte. Mas ele não apertou demais. Não tentou me dominar com o toque.
— O que faz aqui, Stephanos? — perguntei, surpreendendo a mim mesma.
Ele sorriu com um canto dos lábios.
— Trabalho. Diplomacia. Interesses comerciais. Nada poético.
— E costuma chamar funcionárias para o café?
— Nunca. Você foi a primeira.
A respiração me faltou por um segundo. Desviei o olhar. Meu rosto queimava.
— Deve dizer isso para todas.
— Eu nunca digo nada que não sinto.
O silêncio entre nós se estendeu. E foi… confortável.
Até que o rádio da recepção chiou, e meu nome foi chamado.
— Isadora, retorno imediato ao setor da lavanderia. Agora.
Suspirei.
— Foi um prazer, senhor Vasilis.
— Stephanos — corrigiu, com firmeza e gentileza.
Levantei. Fiz menção de sair, mas ele se curvou levemente, como se estivesse em outro século.
— Obrigado pelo café silencioso.
Não foi um flerte. Foi… um elogio à minha existência.
E eu saí dali sabendo que algo havia mudado.
O problema é que, quando algo muda, o coração começa a se apegar.
E eu não podia me dar esse luxo.
STEPHANOS
Não consegui focar no contrato naquela manhã.
E isso era raro.
Eu nunca deixava nada me distrair em viagens de negócios — muito menos uma mulher. Mas havia algo em Isadora que me desarmava sem esforço. Ela não flertava, não provocava, não sorria para me agradar. Ela existia em sua própria órbita — e talvez por isso tenha se tornado o centro da minha.
Isadora. Um nome bonito demais para ser esquecido.
Na sala de reuniões, minha mente vagava entre documentos e memórias recentes: o toque leve das mãos dela, o olhar abaixado, os cabelos castanhos presos de qualquer jeito... e aquele uniforme que tentava esconder o corpo feminino e curvilíneo que ela carregava com uma dignidade que eu raramente via no meio em que vivia.
Meu assistente falou algo sobre cláusulas de renovação. Eu assenti no automático. Mas minha atenção já tinha ido embora.
Depois do almoço, discretamente, pedi acesso aos dados do hotel. Eu queria saber mais — só o suficiente para satisfazer minha curiosidade. Um nome completo, talvez.
Isadora Rivera Walsh.
O “Walsh” me chamou atenção. Típico sobrenome americano. Mas o “Rivera”…
Havia sangue espanhol ali. E algum tipo de história que eu queria desvendar.
No fim do expediente, ao sair para respirar um pouco, a vi de novo — do outro lado do estacionamento interno, ajudando um senhor a se apoiar no braço.
Era um homem mais velho, com roupas simples, aparência cansada e o olhar apagado. Ele andava com dificuldade, mas havia doçura no gesto dela ao seguro.
Então aquele era o pai.
Um aperto inesperado me invadiu o peito. Eu sabia, por poucas palavras, que ela soltou, que ele enfrentava alguma doença. E a forma como ela cuidava dele explicava tudo: por que ela trabalhava tanto, por que seus olhos tinham mais história do que idade.
Ela o ajudou a entrar num táxi. Sorriu para ele com ternura, ajeitou o casaco no peito dele com um gesto maternal, quase infantil. Ele segurou a mão dela com força e beijou seu rosto, emocionado.
Eu me escondi instintivamente atrás de um pilar.
Não queria que ela me visse.
Ainda não.
Alguma coisa em mim… queria observar mais antes de me aproximar.
Com ela, eu não podia errar.
ISADORA
Ele estava me vendo. Eu sentia.
O olhar dele tinha um peso que queimava nas costas, mesmo que eu fingisse não notar.
Stephanos Vasilis. O homem que apareceu na minha vida como uma brisa estrangeira — e que já começava a bagunçar meu fôlego como um vendaval.
Depois do café da manhã, eu tentei ignorar o que sentia. Me escondi no trabalho. Cuidei do meu pai, levei-o à consulta marcada com o psicólogo da clínica e o deixei em casa. Mas, à noite, quando voltei para o hotel para o segundo turno, meu nome estava de novo no papel da suíte 1105.
E lá estava ele.
De pé, de frente para a janela, como da primeira vez. Só que dessa vez… ele se virou quando me ouviu.
— Boa noite, Isadora.
Eu congelei na porta. Com as toalhas na mão.
— Boa noite, senhor Vasilis.
— Stephanos — corrigiu de novo, sem perder a suavidade.
— Estou apenas trazendo os itens solicitados. Depois disso, preciso continuar o expediente.
— Eu sei — disse ele. — Mas... posso te fazer uma pergunta?
Ergui o olhar devagar. Ele estava mais próximo agora. Os olhos cinzentos me estudavam.
— Seu pai está bem?
Meu coração tropeçou.
Como ele…?
— Eu o vi mais cedo — completou. — Você cuidou dele com tanta atenção… me lembrou algo que ando esquecendo há tempo.
— Ele é tudo que eu tenho.
— E você é tudo que ele tem?
Assenti com um aceno contido. Eu não queria me abrir. Mas com ele… era como se minha alma falasse antes da boca.
— Ele teve tempos difíceis… — murmurei. — Mas está melhor agora.
— Se precisar de ajuda, qualquer ajuda, eu conheço excelentes médicos. Clínicas. Psicólogos. Posso...
— Não — cortei, um pouco mais seca do que gostaria. — Agradeço sua gentileza, mas estamos bem.
Ele não se ofendeu. Sorriu, como quem entendia. Como quem respeitava.
— Entendo. E admiro.
Nos encaramos por alguns segundos.
Silêncio.
Então, ele deu um passo para o lado e estendeu a mão, gentil:
— Boa noite, Isadora.
Apertei sua mão, e senti algo pulsar.
Aquele homem era perigoso para o meu coração. E eu... já estava em apuros.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 46
Comments
Gislaine Duarte
ela parece ser tão inocente vai sofrer muito por isso 😔
2025-06-27
1