V.

As semanas se arrastavam pela vastidão das planícies. A vida na caravana estabeleceu um ritmo próprio, uma mistura de trabalho árduo, tédio e a constante vigilância contra os perigos invisíveis que espreitavam além do círculo de carroças. As noites eram particularmente tensas. Após um longo dia de marcha, as famílias se reuniam ao redor das fogueiras, compartilhando refeições escassas e histórias sussurradas, enquanto os homens designados para a guarda, sob o olhar atento de Oscar, patrulhavam o perímetro.

Oscar raramente se juntava às reuniões sociais. Preferia sua própria companhia ou a dos homens de guarda, discutindo estratégias, verificando armas ou simplesmente observando as estrelas com uma expressão indecifrável. Anne, por outro lado, começava a encontrar seu lugar na pequena comunidade itinerante. A Sra. Higgins continuava a lhe oferecer apoio maternal, e outras mulheres, inicialmente desconfiadas, passaram a incluí-la em suas conversas e tarefas compartilhadas, como lavar roupas nos riachos ou preparar a comida.

No entanto, Anne ainda se sentia um pouco à parte, sua condição de viajante solitária marcando uma diferença sutil. E seus pensamentos frequentemente se voltavam para Oscar. Observava-o de longe, intrigada pela dualidade que percebia nele: o pistoleiro implacável e eficiente, mas também o homem que a ajudara sem alarde, cujos olhos azuis às vezes pareciam conter uma profundidade inesperada de sentimento.

Um incidente particular ocorreu durante uma parada ao meio-dia, perto de um pequeno riacho onde os animais podiam beber e as pessoas reabastecer seus barris de água. Um dos rapazes mais jovens da caravana, não muito mais que um adolescente, chamado Billy, estava tentando controlar um cavalo particularmente arisco pertencente a seu pai. O animal assustou-se com algo – talvez uma cobra na grama alta – e empinou, quase derrubando o rapaz e galopando em direção ao descampado.

O pai de Billy gritou, outros homens tentaram cercar o cavalo, mas o animal estava em pânico. A perda de um cavalo era um golpe sério na trilha. Foi então que Oscar, que estava verificando o nível da água no riacho, agiu. Com uma velocidade surpreendente para um homem de seu porte, ele montou em Furacão e partiu em perseguição ao cavalo fugitivo.

O que se seguiu foi uma demonstração de habilidade equestre que deixou todos boquiabertos. Oscar não forçou a perseguição; em vez disso, ele manobrou Furacão com calma, antecipando os movimentos do cavalo assustado, gradualmente diminuindo a distância e guiando-o de volta em direção à caravana, usando apenas a pressão de seus joelhos e comandos de voz suaves. Em poucos minutos, o cavalo, ainda tremendo mas sob controle, estava sendo entregue de volta ao aliviado pai de Billy.

O homem agradeceu profusamente, mas Oscar apenas dispensou os agradecimentos com um aceno. No entanto, quando se virou, viu Billy encolhido, esperando uma repreensão severa do pai ou talvez até mesmo de Oscar. O pai, de fato, começou a gritar com o rapaz por sua falta de cuidado.

Foi então que Oscar interveio, algo que raramente fazia em disputas familiares. Ele desmontou e colocou uma mão firme, mas não agressiva, no ombro do pai.

— Ele é jovem. Cavalos ariscos acontecem — disse Oscar, a voz baixa, mas carregada de autoridade. — O importante é que ninguém se machucou e o animal foi recuperado. Ensine-o a ter mais cuidado, mas não quebre seu espírito com gritos.

O pai de Billy, surpreso pela intervenção e pela calma de Oscar, apenas resmungou e assentiu, puxando o filho para o lado com menos raiva do que antes. Oscar observou-os se afastarem por um momento antes de se virar.

Anne, que testemunhara toda a cena de perto enquanto enchia seu barril de água, aproximou-se hesitante. — Isso foi… gentil da sua parte, Sr. Wise.

Oscar encontrou o olhar dela, uma sombra de surpresa passando por seus olhos azuis antes que a máscara de indiferença voltasse ao lugar. — Apenas prático, senhorita. Um rapaz assustado não aprende nada. E precisamos de todos alertas e capazes nesta jornada.

— Talvez — concordiu Anne, mas ela sentiu que havia mais do que simples pragmatismo na ação dele. Havia uma faísca de compaixão, uma defesa inesperada do mais fraco. — Mesmo assim, foi uma atitude justa.

Um silêncio se instalou entre eles, preenchido apenas pelo murmúrio do riacho e os sons distantes da caravana. Oscar desviou o olhar, parecendo desconfortável com o elogio ou talvez com a intensidade do olhar dela.

— O senhor já fez esta trilha muitas vezes? — perguntou Anne, tentando quebrar o silêncio e satisfazer um pouco de sua curiosidade.

Ele hesitou por um momento, como se ponderasse a resposta. — Algumas. O suficiente para saber que ela cobra seu preço.

— E por que continua voltando? Se é tão perigoso? — A pergunta escapou antes que ela pudesse contê-la.

Oscar olhou para ela novamente, e desta vez, Anne viu algo diferente em seus olhos – um lampejo de cansaço, talvez até de tristeza. — É o que eu faço, senhorita. É onde minhas habilidades são necessárias. E, às vezes… — ele parou, depois deu de ombros. — Às vezes, não há muito mais para onde ir.

A franqueza inesperada da resposta a surpreendeu. Pela primeira vez, ela teve um vislumbre do homem por trás da reputação, um homem talvez tão solitário quanto ela, preso a um caminho que não necessariamente escolhera, mas ao qual se resignara.

— Entendo — murmurou ela, embora não tivesse certeza se entendia completamente.

Oscar pareceu perceber que havia revelado mais do que pretendia. Ele endireitou os ombros, a postura profissional retornando. — A caravana vai partir em breve. É melhor voltar para sua carroça.

— Sim, senhor — respondeu Anne, pegando seu barril de água agora cheio.

Enquanto se afastava, ela não pôde deixar de sentir que algo havia mudado. A barreira entre eles, embora ainda presente, parecera diminuir por um instante. Ela vira um lado mais justo, mais protetor, talvez até mais vulnerável de Oscar Wise. E essa visão, mais do que qualquer demonstração de habilidade com armas, começou a despertar nela um sentimento novo e confuso, uma faísca de interesse que ia além da simples admiração ou medo.

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!