Maria Rita jazia imóvel na cama do hospital, o seu corpo frágil coberto por lençóis brancos. O “bip” ritmado dos monitores preenchia o quarto, o único som que rompia o silêncio pesado. A sua mãe, Maria de Cássia, sentada ao lado, segurava-lhe a mão com delicadeza, a pele marcada pelo tempo e pelo sofrimento. O olhar cansado fitava a filha com esperança, mas também com um medo sufocante.
Médico dissera que ainda não havia previsão para melhora, tudo dependia do destino e da força de Maria Rita.
O acidente que a deixara naquele estado, havia levado o pouco que possuíam. Maria de Cássia vendera os poucos pertences que restavam, desesperada para pagar os tratamentos da filha. Não tinham casa, nem qualquer segurança. Apenas a fé de que a sua filha acordaria um dia.
E então, aconteceu.
Naquela manhã, a luz pálida do sol entrou pelas frestas da cortina, Maria Rita moveu os dedos. Foi um movimento quase imperceptível, mas Maria de Cássia percebeu. Seu coração disparou. Levantou-se de súbito, apertando a mão da filha com mais força.
— Minha menina... Você pode me ouvir?— a sua voz quebrou no ar, carregada de emoção.
Os olhos de Maria Rita tremularam sob as pálpebras, como se um sonho perturbador a puxasse de volta. Então, devagar, abrir os olhos. Por um instante, parecia perdida, como se estivesse presa entre dois mundos. Olhou ao redor, confusa, até que os seus olhos pousaram na mãe.
— Mãe...— a sua voz saiu rouca, fraca, mas o suficiente para encher Maria de Cássia de lágrimas e alegria.
Ela chorou, beijando-lhe a testa, agradecendo aos céus. Mas Maria Rita sentia algo diferente dentro de si. Era como se houvesse algo além dela mesma ali, algo que a puxava para a memórias que não eram suas. Imagens de um Casarão, de um jardim iluminado pelo luar, de um homem chorando diante de um túmulo... tudo parecia tão vívido.
Nos dias que se seguiram, Maria Rita foi recuperando as forças, mas uma inquietação crescia dentro dela. Às vezes, ao olhar-se no espelho, não se reconhecia completamente. Palavras vinham a sua mente sem que soubesse de onde. Sensações estranhas, uma saudade inexplicável de algo que jamais vivera.
Mas dizia ser normal, por conta dos dias em que ficou desacordada. Com o passar dos dias certamente tudo voltria ao normal. Maria Rita sapegou-sea essa verdade.
Sem casa para onde voltar, a assistente social do hospital conseguiu um emprego de cozinheira para Maria de Cássia e de arrumadeira para sua filha. Lá elas teriam moradia e alimentação. A Fazenda Ribeiro sempre acolhia bem os seus empregados. Elas não puderam recusar a oferta, afinal, ficariam bem em uma fazenda.
A própria assistente social colocou no seu carro, mãe e filha, e os seus poucos pertences, levando as até a fazenda.
— Acerca de dois meses o senhor Gustavo Ribeiro deu a sua única filha. Procurem não fazer perguntas esse assunto. — ela desviou por um segundos os olhos da estrada e notou o rosto assustado da mais jovem. — Não se preocupe, senhor Gustavo é um bom homem.
Ao cruzar os portões da Fazenda, Maria Rita sentiu um arrepio na espinha. Um frio que percorreu a sua pele como um sussurro do passado. O casarão branco, as árvores imponentes ao redor, os jardins bem cuidados, tudo parecia absurdamente familiar.
A assistente social dirigia com atenção, ocasionalmente lançando olhares gentis para mãe e filha pelo retrovisor. Rompeu o silêncio com a sua voz calma:
— Eu sei que tem sido um período difícil para vocês. — começou, escolhendo bem as palavras— Mas quero que saibam o senhor Gustavo Ribeiro está ciente da situação, ele sabe que Maria Rita ainda está se recuperando, mesmo assim, fez questão de dar essa oportunidade para vocês, disse que há sempre trabalho para quem precisa.
Maria de Cássia suspirou aliviada.
— Deus abençoe esse homem. Eu só quero um recomeço digno para minha filha.
Maria Rita, porém permaneceu em silêncio, fitando a paisagem rural pela janela do carro. Quando o carro parou diante da casa principal, a assistente social desligou o motor e virou-se para as duas.
— Vocês vão encontrar um lar aqui. O senhor Gustavo pediu que se acomodassem e começassem o trabalho apenas quando estiverem prontas. Quer que se sintam bem antes de tudo.
Maria de Cássia percebeu o olhar perdido da filha e segurou-lhe o braço.
— Está tudo bem, minha filha?— ela perguntou, preocupada.
— Eu... sim.— a sua própria voz soou estranha a seus ouvidos. Algo dentro dela se remexia, despertando uma lembrança enterrada no tempo.
A sua mãe franziu o cenho.
— Filha... se não estiver bem, fala pra mim.
Maria Rita colocou os pés no chão da fazenda e, assim que erguer os olhos para a imponente construção, um arrepio percorreu lhe a nuca. A sensação de que já conhecia aquele lugar era forte demais mesmo sem nunca ter pisado ali antes.
Ela guardou aquela sensação apenas para si. Não queria preocupar sua mãe.
A assistente social abriu o porta-mala para elas pegarem a pouca bagagem que trouxeram e indicou o caminho.
— Vou leva-las até onde ficarão. Não é grande, mas é confortável. Fica perto da casa principal, será fácil para irem e virem quando necessário.
As três caminharam até uma casinha térrea de fachada simples, mas bem cuidada. As janelas tinham cortinas floridas, e o jardim em frente era pequeno e faltavam flores. Ao entrar, Maria de Cássia suspirou aliviada ao ver que o local era mobiliado. Uma sala aconchegante, um sofá modesto, uma cozinha equipada. Para a alegria de Maria Rita, havia uma geladeira e até uma televisão.
— Tem televisão!— exclamou, sentindo um lampejo de felicidade em meio às sensações estranhas que a consumiam.
A assistente social sorriu.
— O senhor Gustavo faz questão de que seus funcionários tenham a vida digna aqui. Ele sabe que não é fácil recomeçar do nada.
Maria de Cássia segurou a mão da filha, descendo em silêncio. Talvez, enfim, aquele fosse um novo recomeço para ambas.
Mas, para Maria Rita, aquele lugar significava muito mais do que um Recomeço.
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Atualizado até capítulo 35
Comments
Frederica Ribeiro
haa! eu pensei que ela teria uma segunda chance e voltaria no tempo antes do assassinato
2025-05-02
1
Maria Oliveira Poranga
Olivia reencarnou na Maria Rita 😱😱
2025-04-19
1