A aula finalmente terminou, e Helena pegou sua mochila com pressa, tentando não chamar muita atenção. Ela gostava da sensação de estar em movimento, de deixar a escola para trás, com os pensamentos da sala de aula se distanciando aos poucos. Clara, como sempre, já tinha saído apressada, provavelmente indo encontrar alguma amiga ou fazer planos para o fim de semana.
Helena caminhava pelos corredores, sentindo o peso das horas passadas na escola. Aquele momento de transição entre o ambiente escolar e a volta para casa sempre a fazia refletir sobre o que aconteceu naquele dia. Ela pensava nas conversas, nas risadas, nas aulas e, inevitavelmente, no novo aluno, Miguel.
Quando saiu pela porta da escola, o céu estava tingido de laranja, anunciando o começo da noite. Era o tipo de dia que começava a esfriar, com o vento suave batendo em seu rosto. Ela respirou fundo, sentindo o cheiro do mar distante e a brisa que vinha do Leblon, onde morava.
E foi nesse instante, enquanto atravessava a rua, que ela o viu. Miguel estava parado do outro lado da calçada, conversando com alguns colegas, mas sua atenção foi imediatamente atraída para ele. Ele parecia tão... à vontade, como se o mundo ao seu redor não o afetasse. Seus cabelos bagunçados, a postura relaxada, e o jeito com que ele sorria de maneira espontânea.
Ela hesitou. A vontade de ir até ele, talvez fazer uma piada ou puxar algum assunto, estava lá, mas a vergonha a paralisou. Ela sabia que ainda não sabia muito sobre ele e, no fundo, ela não estava pronta para ser vista se aproximando de alguém tão diferente do que ela estava acostumada.
Miguel olhou para o lado, seus olhos se encontrando com os de Helena por um breve momento. Ela sentiu uma onda de calor subir pelas bochechas, e, sem saber o que fazer, desviou o olhar rapidamente, abaixando a cabeça e acelerando o passo.
A sensação de desconforto ficou em seu peito enquanto ela caminhava, sem olhar mais para trás. Por mais que tentasse ignorar, seu coração estava batendo mais rápido. Por que não consegui falar com ele?
Ela podia ouvir os passos de Miguel mais atrás, acompanhando o mesmo ritmo enquanto ele atravessava a rua. Helena sentiu um impulso de olhar para ele, mas algo dentro dela a impediu. Talvez fosse o medo de parecer estranha, ou simplesmente a insegurança sobre o que fazer. Afinal, ela não era como as outras meninas da escola, aquelas que sabiam exatamente o que dizer e quando falar.
Ela olhou para frente e seguiu seu caminho, sentindo uma mistura de frustração e curiosidade. Será que ele percebeu que eu estava olhando para ele? pensou, com um leve sorriso tímido no rosto, mas logo o afastando, como se não quisesse se mostrar mais vulnerável.
Miguel passou por ela, sem sequer tentar puxar uma conversa, e ela não soube se deveria sentir alívio ou tristeza por isso. Talvez ele tivesse o mesmo medo que ela. Ou talvez não estivesse interessado.
O reflexo de Helena
Quando chegou em casa, Helena se jogou na cama, ainda com os pensamentos todos bagunçados. Olhou para o teto e suspirou profundamente. Aquela mistura de sentimentos ainda não fazia sentido, mas ela não podia negar que algo naquele encontro a havia tocado. Era algo sutil, uma chama pequena, mas que a deixava inquieta.
O dia seguiu seu curso, e as interações com Miguel ficaram gravadas em sua mente. O modo como ele se comportava, como não parecia seguir o mesmo padrão de todos os outros meninos da escola. Ele tinha algo de inusitado, algo que a fazia querer conhecê-lo, mas ao mesmo tempo a deixava com um receio inexplicável.
Helena estava em conflito. Parte de si queria ignorá-lo, continuar sua vida como sempre fez. Mas outra parte queria algo mais. Algo novo, algo que a tirasse da sua zona de conforto. Mas como dar esse primeiro passo?
Ela pensou nas palavras de Clara mais cedo, e sorriu para si mesma, tentando se convencer de que não era tão difícil assim. Talvez Miguel estivesse apenas esperando um empurrão para se aproximar. Ou talvez ele fosse tão distante quanto parecia.
Ela se levantou da cama, pegou seu celular e começou a pesquisar sobre a Revolução Industrial. Mas sua mente vagava para longe, para o garoto que ela mal conhecia, mas que, de alguma forma, já fazia parte dos seus pensamentos.
Helena não sabia muito bem o que esperar. Clara tinha insistido tanto para que ela fosse com elas, dizendo que seria uma boa "quebrar a rotina" e se divertir um pouco. Helena, um pouco relutante, decidiu seguir o conselho da amiga. Afinal, já fazia um tempo que ela não saia da sua zona de conforto. E quem sabe, poderia ser uma boa oportunidade para esquecer um pouco dos pensamentos que a rodavam.
O lugar para onde Clara as levou não era exatamente o tipo de ambiente que Helena costumava frequentar. Era um barzinho pequeno, mas com uma atmosfera descolada e ao mesmo tempo meio rústica, como se fosse aquele tipo de lugar em que as pessoas relaxaram após o trabalho ou apenas para fugir da rotina. A música, um som alternativo, parecia ocupar o ar de maneira leve, mas cheia de energia.
Helena estava um pouco desconfortável. Não era exatamente o ambiente que ela estava acostumada, e Clara logo percebeu isso.
— Relaxa, vai ser divertido, você vai ver. — Clara sorriu animada e puxou Helena para a pista de dança, onde outras pessoas estavam se soltando ao som da música.
Enquanto elas se moviam entre as mesas e tentavam se acostumar com a vibração do lugar, Helena notou um grupo de garotos em uma mesa ao fundo. Eles não pareciam com os meninos da escola. Não tinham o mesmo jeito de "certinhos", como muitos de seus colegas. A primeira coisa que ela percebeu foi o estilo deles — algo completamente diferente do que ela estava acostumada. Eles usavam roupas mais largadas, com camisetas de bandas e jeans desbotados, mas ao mesmo tempo tinham uma postura descontraída, como se estivessem ali só por prazer e não para mostrar algo para os outros.
E então, ela o viu. Miguel. Ele estava entre eles, com uma expressão tranquila, mas com algo de provocante nos olhos. Ele estava sentado de uma maneira relaxada, como se nada ali fosse tão importante, apenas o momento. Seus cabelos, bagunçados de forma proposital, e seu estilo mais despojado davam a ele uma aura de despreocupado. Ele parecia estar em um mundo à parte, e Helena não conseguiu evitar de olhá-lo.
Ela sentiu um frio na barriga quando seus olhos se cruzaram, mesmo que por um segundo. Havia algo ali, algo que ela não podia explicar. O jeito como ele a olhou era tão simples e ao mesmo tempo intenso, como se já soubesse que ela estava observando. Não foi um olhar curioso ou ansioso, mas sim algo calmo, como se ele estivesse acostumado a ser notado, mas não ligasse para isso.
Miguel e seus amigos estavam sentados em uma mesa ao fundo, rodeados por garotos e garotas que pareciam bem à vontade naquele ambiente. Helena percebeu que nenhum deles parecia com os meninos da escola. Eles tinham algo de rebelde, de descomplicado, como se a vida fosse mais simples do que parecia ser para todos ao redor. Um contraste imenso com os rapazes que ela via todos os dias na escola, aqueles que se preocupavam demais com a aparência e o que os outros pensavam.
Clara percebeu o olhar de Helena e sorriu com malícia.
— Não me diga que você está pensando no Miguel, hein? — Clara se aproximou, com uma expressão de quem sabia exatamente o que estava acontecendo.
Helena ficou sem graça, mas não negou. Não sabia o que estava sentindo, mas algo no ar estava mudando, e ela não queria admitir que Miguel tinha algo de diferente.
— Não sei... ele está ali... — Helena respondeu, tentando disfarçar, mas não conseguindo esconder o interesse que começava a tomar conta dela.
Clara não deixou a oportunidade escapar.
— Ah, você não consegue negar, Helena! É o tipo de cara que faz você se sentir diferente, não é? Não é o tipo que segue a corrente. É o tipo que anda por conta própria, e isso é raro.
Helena olhou para Miguel novamente. Ele estava agora mais descontraído, rindo com os amigos, mas ainda parecia meio distante, quase como se estivesse em outro mundo. Ele não parecia preocupado com o que os outros pensavam. Era algo que ela nunca havia visto em um garoto da sua escola.
Ele levantou a mão, cumprimentando alguém que passava por ele, e foi quando Helena percebeu que ele estava tentando se levantar para ir até o bar. Seus olhos se encontraram novamente, dessa vez por mais tempo, e Helena não sabia se deveria sorrir ou desviar o olhar. Aquele momento foi o suficiente para ela sentir um calafrio correr pela espinha.
— Você vai falar com ele? — Clara sussurrou, quase como se estivesse provocando.
Helena engoliu em seco. Não sabia se devia ou não. Ela não estava nem um pouco acostumada com essa situação. Ele era completamente diferente dos meninos com quem ela interagia todos os dias, e o mais estranho era que ela não se sentia ameaçada por ele. Ele não tinha a mesma arrogância dos outros. Ele simplesmente era.
Miguel, aparentemente percebendo que ela ainda estava olhando, fez um leve aceno com a cabeça, como se estivesse aguardando uma reação dela. Helena, ainda sem saber o que fazer, decidiu dar um passo atrás e se afastar um pouco, mas o coração ainda batia mais rápido.
— Vamos dançar, Helena! Vai ser divertido! — Clara insistiu, puxando-a para a pista de dança, mas o olhar de Miguel continuava na sua mente.
Helena tentou se concentrar na música, mas algo dentro dela não a deixava relaxar completamente. O que ela não sabia era que, naquele momento, o jogo entre ela e Miguel estava apenas começando. Ele, com seu estilo próprio e despreocupado, e ela, com sua vontade de explorar algo novo e desconhecido.
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