Um raio de sol

Ethan sorriu, aquele sorriso grande que parecia iluminar tudo ao redor, e deu mais uma mordida no sorvete. Ele não parava quieto, mexia os pés, gesticulava muito enquanto falava, como se sua energia fosse infinita.

— Sabe, Vic, eu sou daquele tipo de pessoa que as pessoas acham meio exagerada. Eu rio alto, falo muito, brinco o tempo todo… Acho que nasci pra ser assim, meio caótico.

Ele girou o palito do sorvete entre os dedos e continuou:

— Minha mãe diz que, quando eu era criança, eu entrava em qualquer lugar e começava a conversar com todo mundo, até com estranhos. Uma vez, eu me perdi no shopping e, quando me encontraram, eu estava numa loja contando piada para um grupo de velhinhos.

Eu soltei um riso fraco, balançando a cabeça.

— Então você sempre foi assim?

— Sempre! — Ele abriu os braços, como se estivesse mostrando algo grandioso. — Eu sou aquele cara que puxa assunto até com o caixa do supermercado, que cumprimenta as pessoas na rua mesmo sem conhecer, que dança no meio da praça se tocar uma música boa. A vida é curta demais pra ficar quieto, sabe?

Olhei para ele, tentando entender como alguém podia ter tanta energia. Ele parecia elétrico, vibrante, como se o mundo fosse feito para ser vivido intensamente a cada segundo.

— E as pessoas gostam disso?

Ele deu de ombros.

— Algumas sim, outras não. Tem gente que me acha irritante, acha que eu falo demais, que não levo nada a sério. Mas eu levo. Eu só prefiro rir das coisas do que me afundar nelas.

Ele me olhou de lado, como se estivesse tentando me ler.

— Você é diferente de mim, né?

— Como assim?

— Você é mais fechada, mais séria. Parece que carrega o mundo nos ombros.

Suspirei, desviando o olhar.

— Talvez porque eu carregue.

— Hmm… — Ele fez um som pensativo, lambendo o sorvete. — Então talvez eu tenha que te ensinar a soltar um pouco esse peso.

Fiquei em silêncio, sem saber como responder. Ethan não parecia o tipo de pessoa que aceitava tristeza ao seu redor. Ele era barulhento, expansivo, cheio de vida. E eu? Eu só existia.

— Qual foi a última vez que você fez algo espontâneo? — Ele perguntou, inclinando-se na minha direção.

— O quê?

— Algo sem planejar, sem pensar demais. Algo só porque deu vontade.

Pensei por um momento, mas não consegui encontrar uma resposta.

— Sabia! — Ele apontou para mim, animado. — Você pensa demais.

— E isso é ruim?

— Não é ruim, mas às vezes é chato. — Ele riu. — Eu sou o tipo de pessoa que acorda e decide que vai fazer algo maluco no dia. Tipo comprar um bilhete de loteria mesmo sabendo que nunca ganho nada. Ou sair correndo na chuva só porque parece cena de filme.

Eu o observei, intrigada.

— Você já fez isso?

— O quê?

— Correr na chuva?

— Claro! — Ele sorriu, os olhos brilhando. — Já fiz várias vezes. Uma vez, no meio de uma tempestade, saí correndo pela rua só pra sentir a água batendo no rosto. Minha mãe quase teve um ataque quando me viu todo encharcado. Mas valeu a pena.

Eu ri baixinho.

— Você é mesmo um louco.

— E você deveria experimentar um pouco de loucura também.

— Ah é? E como você sugere que eu faça isso?

Ele se levantou de repente, animado.

— Levanta.

— O quê?

— Vamos fazer algo aleatório agora.

— Agora?

— Agora!

Eu o encarei, hesitante. Ethan era do tipo que não aceitava um "não" como resposta.

— O que você tem em mente?

Ele olhou ao redor, pensativo, depois abriu um sorriso travesso.

— Vamos correr até aquela árvore ali. Quem chegar por último paga outro sorvete amanhã.

— Você quer que eu corra com você?

— Sim. — Ele me puxou pela mão, me fazendo levantar do banco. — Vem, Vic!

— Mas eu nem concordei com isso!

— Concordou sim! E se não concordou, agora já é tarde.

Antes que eu pudesse protestar, ele começou a correr.

E, contra toda a lógica, contra tudo que minha mente normalmente me mandaria fazer, eu corri atrás dele.

E pela primeira vez em muito tempo, senti o peso nos meus ombros ficar um pouco mais leve.

Depois de corrermos até a árvore, Ethan parou, rindo e ofegante, enquanto eu tentava recuperar o fôlego.

— Eu ganhei! — Ele ergueu os braços, triunfante. — Isso significa que você me deve um sorvete amanhã.

Cruzei os braços, fingindo irritação.

— Você me enganou. Eu nem tive tempo de concordar.

Ele deu de ombros, rindo.

— A vida é assim, Vic. Às vezes, você só tem que correr antes de pensar.

Eu balancei a cabeça, mas não consegui evitar um pequeno sorriso. Ele era diferente de qualquer pessoa que eu já tinha conhecido.

— Bom, eu preciso ir agora. — Ele ajeitou a postura e deu um passo para trás. — Mas espero você aqui amanhã, hein. Quero meu sorvete.

— Veremos. — Falei, tentando soar indiferente, mas ele percebeu meu tom e sorriu de novo.

— Eu sabia que você gostou da companhia.

Antes que eu pudesse responder, ele virou-se e começou a caminhar, jogando a mão para o alto num aceno despreocupado.

Fiquei parada ali por um momento, observando-o se afastar. Meu coração batia um pouco mais rápido do que o normal, e eu não tinha certeza se era pelo cansaço da corrida ou pelo efeito que Ethan estava causando em mim.

Ele é lindo.

O pensamento veio do nada, e minhas bochechas esquentaram imediatamente.

Ele é lindo e encantador.

Balancei a cabeça, tentando afastar a ideia, mas era impossível. Ele tinha um jeito de iluminar tudo ao redor, como se carregasse o próprio sol dentro de si.

Enquanto voltava para casa, minha mente estava cheia dele. Do seu sorriso grande, da forma como ria, do jeito que falava como se fosse impossível alguém ficar triste perto dele. E, de alguma forma, eu não conseguia parar de pensar nisso.

Quando percebi, já estava na frente de casa. A garagem estava ocupada novamente. Meu pai já tinha voltado.

Respirei fundo e entrei.

O barulho da porta se fechando chamou sua atenção. Ele estava na sala, sentado no sofá, olhando para mim com uma expressão severa.

— Onde você estava?

— Andando.

— Andando? A essa hora?

Assenti, tentando evitar uma discussão, mas já era tarde.

— Você sabe que você é doente, Victoria. — A voz dele saiu carregada de irritação. — E fica saindo assim? Se você pega um resfriado?

Revirei os olhos.

— Pai, eu só fui caminhar…

— Isso não importa! — Ele bufou, se levantando. — Você nunca se cuida direito. Suba e vá tomar seus remédios.

Cruzei os braços, encarando-o.

— Eu não preciso…

— Eu disse para subir, Vic.

Segurei a vontade de responder algo pior. Não valia a pena. Então, apenas virei as costas e subi as escadas.

Mas, mesmo com toda a raiva e frustração que ele me fazia sentir, minha mente ainda estava presa na pracinha, no sorvete, no jeito que Ethan tinha me feito rir.

Subi as escadas em silêncio, fechando a porta do quarto atrás de mim e soltando um suspiro pesado. Joguei-me na cama, encarando o teto. Minha mente ainda estava lá, na pracinha, no sorvete derretendo entre meus dedos, no sorriso de Ethan que parecia iluminar tudo ao redor.

Meus lábios se curvaram levemente sem que eu percebesse.

Mas meu momento de devaneio foi interrompido por uma batida suave na porta. Antes que eu pudesse responder, minha mãe entrou.

— Vic, querida… — A voz dela era suave, doce, como sempre. Ela fechou a porta atrás de si e veio até mim, sentando-se na beira da cama. — Onde você estava?

Diferente do meu pai, a pergunta dela não veio carregada de acusação, e sim de preocupação genuína.

— Eu fui na pracinha… — murmurei, abraçando um travesseiro.

Ela arqueou uma sobrancelha, curiosa.

— Sozinha?

Hesitei por um segundo, depois soltei um suspiro e confessei:

— Conheci um garoto lá.

Os olhos dela se iluminaram instantaneamente, e um sorriso largo surgiu em seu rosto.

— Um garoto? — Ela repetiu, animada. — E ele é bonito?

Balancei a cabeça, rindo um pouco.

— Ele é lindo, mãe. Lindo e… encantador.

Minha mãe juntou as mãos, claramente feliz com a novidade.

— Ai, meu Deus, minha filha finalmente conheceu alguém!

— Mãe… — Revirei os olhos, mas não pude evitar sorrir.

Ela segurou minhas mãos, olhando para mim com ternura.

— Isso é maravilhoso, Vic. Você sempre fica tão fechada, tão dentro de si mesma… Fico feliz que tenha conhecido alguém que te fez sair um pouco da sua bolha.

Suspirei, desviando o olhar.

— Mas o papai não entende…

O sorriso dela diminuiu um pouco, mas a doçura permaneceu em sua expressão.

— Seu pai… bom, ele é explosivo assim mesmo. — Ela acariciou meu cabelo. — Mas é o jeito dele. No fundo, ele só quer o seu bem, mesmo que não saiba demonstrar isso da melhor forma.

Fiquei em silêncio, mordendo o lábio.

— Ele acha que eu sou doente.

Ela suspirou, balançando a cabeça.

— Ele se preocupa demais, Vic. Mas eu sei que você é forte.

Assenti, sem saber exatamente o que dizer. Então, para mudar de assunto, perguntei:

— O Kim já chegou?

O rosto da minha mãe mudou ligeiramente, e ela suspirou.

— Não… Desde de manhã ele saiu.

— Ele anda sumido.

— Ele deve estar trabalhando muito naquela empresa, a C.M.J. — Ela sorriu, orgulhosa. — Estou tão feliz por ele ter conseguido esse emprego.

Fiquei encarando minha mãe por um momento. Ela realmente brilhava quando falava de Kim, como se ele fosse um exemplo perfeito a ser seguido.

— A C.M.J. é uma empresa grande, não é?

— Sim! Uma das melhores do ramo. Ele sempre foi tão esforçado… Desde pequeno, Kim sempre sonhou grande, e agora está realizando tudo isso.

A maneira como ela falava dele me fez sentir… pequena. Kim era o filho perfeito. O orgulho da família. Enquanto isso, eu… bem, eu era só Vic.

Minha mãe percebeu minha expressão e apertou minha mão.

— Você também tem seu caminho, querida.

Assenti, mas por dentro, eu não tinha tanta certeza disso.

Minha mente ainda estava na pracinha, em Ethan, em como ele fazia tudo parecer mais leve. Talvez, só talvez, ele fosse um pequeno desvio na estrada que eu precisava.

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