Hoje cumpri minha promessa: trouxe Duda para a cachoeira. Ela vinha me aperreando há semanas, reclamando que eu nunca trazia ela aqui. Às vezes até esqueço que minha filha só tem três anos, porque fala como se tivesse o dobro da idade.
Ela estava com as maria-chiquinhas balançando enquanto corria de um lado para o outro, deixando seu pequeno pônei, Pimpão, pastando tranquilamente. Sua energia parecia não ter fim, e eu a observava com um sorriso meio preocupado, meio encantado.
— Maria Eduarda! — chamei, tentando usar um tom mais sério. — O que eu disse sobre correr? Você não sabe nadar, e se cair aí sem o papai ver, sabe o que pode acontecer, né?
Ela parou no mesmo instante, os olhinhos grandes se voltando para mim com um brilho de arrependimento.
— Sim... — respondeu, com o tom tristonho que ela sabia que sempre me desarmava.
— Então, pois é. — suspirei, abaixando o tom. — Vem cá, vamos dar água pro Brad e pro Pimpão.
Peguei seu dedinho minúsculo na minha mão enquanto caminhávamos em direção aos cavalos. Duda insistiu em me ajudar com a água, carregando um baldezinho que parecia enorme para ela. Fiz questão de incentivá-la, mesmo sabendo que eu acabaria terminando o serviço.
Depois, enquanto eu organizava as coisas e verificava as rédeas, Duda se aventurou por perto, colhendo amoras na árvore que ficava ao lado.
— Papai, olha! — gritou, me mostrando as mãos manchadas de vermelho com um sorriso radiante.
— Só não come tudo de uma vez, hein? — brinquei, rindo.
Ver minha filha assim, tão feliz e cheia de vida, fazia com que tudo valesse a pena. Por mais trabalhoso que fosse equilibrar a vida na fazenda e ser pai solo, cada momento como esse apagava qualquer cansaço.
Agradeço todos os dias por Duda ser tão apegada a mim a ponto de ainda não questionar sobre a mãe. Mas sei que essa hora vai chegar. E quando chegar, não faço ideia de como vou explicar que sempre foi só nós dois.
Conheci Carla, a mãe de Duda, num dia qualquer aqui na fazenda. Ela era bonita, educada, com aquele sotaque do Rio Grande do Norte que fazia qualquer conversa parecer mais leve. Estava apenas de passagem, turistando por aqui, mas fazia faculdade em Belo Horizonte.
Nos envolvemos por quatro noites, e foi suficiente para que Duda viesse ao mundo. Lembro de Carla começar a se sentir mal: enjoos, náuseas... Fiquei preocupado e insisti para que fôssemos a um posto de saúde. Foi lá que descobrimos a gravidez.
O desespero bateu em mim quando percebi que Carla não queria ter a criança. Ela estava decidida a seguir a vida dela, sem abrir espaço para algo que a prendesse. E tudo bem, o corpo era dela, mas eu sabia que teria que lutar muito para que minha filha viesse ao mundo.
Por nove meses, mudei minha vida. Deixei a fazenda e fui para Belo Horizonte, ficando ao lado de Carla enquanto ela levava a gestação. Fiz tudo que estava ao meu alcance: acompanhei consultas, me informei sobre cada etapa, até mesmo comprei o enxoval sozinho. Quando Duda nasceu, foi a maior alegria da minha vida — mas não para Carla. Ela não quis nem olhar para a filha.
Desde então, somos só eu e Duda. E, apesar de todos os desafios, não trocaria isso por nada. Ela é meu mundo inteiro, minha razão para seguir em frente. Mas sei que o dia em que ela perguntar sobre a mãe vai chegar, e vou ter que encontrar as palavras certas para contar essa parte da história.
Duda estava ocupada brincando com as amoras que tinha acabado de colher, mas, de repente, ela largou tudo e ficou olhando fixamente para a cachoeira. Segui seu olhar e só então percebi o que havia chamado sua atenção.
Lá estava ela. Uma mulher. Não qualquer mulher, mas Evelyn. De maiô, molhada, com a água escorrendo pelos cabelos e pela pele dourada pelo sol. Ela estava de costas no início, mas quando virou de lado, meu coração deu um salto. O tempo parecia ter sido generoso com ela, muito mais do que eu me lembrava.
— Papai! Olha a moça bonita! — Duda exclamou, empolgada, e antes que eu pudesse responder, ela já estava caminhando na direção da água.
— Maria Eduarda! Volta aqui! — chamei, mas era inútil. Duda era teimosa como só ela sabia ser.
Antes que a pequena conseguisse chegar até a borda da água, Evelyn a viu. Ela deixou um sorriso curioso escapar ao ver a criança se aproximar, e, como a Evelyn que eu lembrava, não resistiu a abaixar para falar com ela.
— Oi, princesa! — disse Evelyn com um tom doce, enquanto Duda olhava para ela encantada. — Você quer brincar na água?
Eu me aproximei devagar, meu olhar fixo na cena. Evelyn agora estava totalmente fora da cachoeira, a pele reluzente sob o sol, as gotas de água ainda descendo pelo pescoço e pelos ombros. Era impossível não notar a maneira como o maiô modelava cada curva dela, acentuando o tipo de beleza que parece natural, quase injusta.
— Papai, a moça é minha amiga agora! — Duda anunciou, me tirando do meu transe. Evelyn levantou os olhos para mim naquele momento, e o ar pareceu me faltar.
— Heitor? — ela perguntou, surpresa, um sorriso contido brincando nos lábios.
Eu tentei não olhar demais, mas falhei miseravelmente. Meu olhar descia por ela quase involuntariamente, registrando cada detalhe. Era como se os anos tivessem dado a Evelyn algo mais: uma força, uma confiança que antes eu não via.
— Evelyn... — murmurei, tentando parecer indiferente. — O que você está fazendo aqui?
Ela cruzou os braços, e o gesto fez meu coração bater ainda mais rápido. Não ajudava o fato de que Duda estava entre nós, com aquele olhar esperto que parecia perceber mais do que deveria.
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Atualizado até capítulo 21
Comments
Irene Correa
eita lasqueira que reencontro 👏👏👏👏👏👏 apesar da história está concluída,estou gostando 🌹🌹🌹🌹🌹
2025-02-07
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