Enquanto observava pela janela do carro as paisagens das estradas que levavam à fazenda onde cresci, um turbilhão de memórias invadiu minha mente. Era inevitável lembrar da leveza daqueles tempos, das tardes preguiçosas e do som das cigarras no fim do dia. Mas, ao mesmo tempo, me peguei pensando: será que eu ainda conseguiria me encaixar aqui? Não, provavelmente não. Minha vida tinha mudado demais, e eu também.
Quando atravessamos o portão da fazenda do papai, meu coração deu um salto no peito. Cada detalhe daquele lugar trazia uma lembrança enterrada, um pedaço de mim que parecia distante e, ao mesmo tempo, tão presente. Sérgio, o motorista, estacionou o carro e rapidamente veio abrir a porta para mim.
Onze anos. Era exatamente esse o tempo que eu não colocava os pés aqui. E, nesses anos todos, nenhuma notícia desse lugar tinha chegado até mim. Nem uma carta, nem um telefonema, nem uma palavra. Era como se a fazenda tivesse desaparecido do mapa da minha vida.
Sérgio pegou minhas malas e as levou para dentro da casa. Assim que entrei, fui recebida por uma figura que imediatamente aqueceu meu coração: dona Antonieta. A antiga governanta da casa ainda estava aqui, exatamente como eu me lembrava, com seus cabelos grisalhos presos em um coque perfeito e aquele sorriso acolhedor.
— Oh, veja só! Olha como você está linda! — exclamou ela, juntando as mãos como se estivesse rezando. — Meu Deus, Evelyn. Você mudou muito, mas, ao mesmo tempo, parece a mesma menina que corria por aqui.
— Oi, dona Antonieta. — sorri e a abracei com carinho, sentindo o conforto familiar daquele gesto. — Como a senhora está?
— Estou ótima, minha linda. E você? Como tem passado?
— Estou bem também, obrigada. — assenti, lançando um olhar ao redor da sala.
Tudo parecia diferente. As paredes tinham outra cor, o chão estava renovado, os móveis eram novos e modernos. A essência da casa ainda estava ali, mas era como se a fazenda tivesse passado por uma transformação completa, refletindo os anos que eu estive longe.
— A casa está tão... diferente. — comentei, meio distraída, enquanto meus olhos percorriam cada detalhe.
— Ah, seu pai fez questão de mudar muitas coisas, sabe como ele é. Mas, no fundo, o coração da casa continua o mesmo. — respondeu Antonieta, com um sorriso carinhoso.
E era verdade. Apesar das mudanças físicas, o cheiro de café recém-passado vindo da cozinha, o som das árvores balançando com o vento lá fora e o calor aconchegante da presença de dona Antonieta faziam tudo parecer familiar.
Mas, no fundo, eu sabia que o verdadeiro desafio estava por vir: reencontrar meu passado, encarar as pessoas que deixei para trás e descobrir se ainda havia algum espaço para mim nesse pedaço de mundo que um dia chamei de lar.
— Quando eu soube que você viria, tratei logo de preparar o seu antigo quarto. — disse dona Antonieta, com o mesmo entusiasmo acolhedor de sempre.
— Oh, muito obrigada, Tônia. — respondi com um sorriso, chamando-a pelo apelido carinhoso que eu usava na infância.
Ela deu um sorriso satisfeito, mas, como sempre, não perdeu tempo para ir direto ao ponto:
— Mas então, o que te traz aqui, minha filha?
Engoli seco antes de responder, tentando parecer casual.
— Ah, eu vim a trabalho. Preciso resolver um negócio e volto logo. Mas não se preocupe, prometo visitar vocês sempre.
Ela me lançou um olhar desconfiado, mas não insistiu.
— Entendi. Fique à vontade. Vou voltar para a cozinha, ainda tenho muito o que fazer.
— Tudo bem. Obrigada.
Assim que Antonieta saiu, fechando a porta atrás de si, me permiti respirar fundo e olhar ao redor do quarto. As mudanças eram sutis. O tempo parecia ter parado ali, com os móveis antigos ainda no mesmo lugar, mas algumas peças mais modernas denunciavam os anos que se passaram.
Meus olhos se voltaram para a porta no canto, que levava à varanda. Caminhei até ela, empurrando-a devagar. O ar fresco da fazenda me envolveu imediatamente, trazendo lembranças tão vívidas que quase podiam ser tocadas.
Da varanda, a vista era como eu me lembrava: o horizonte se estendia em vastos campos verdes, pontuados por árvores e cercas que delimitavam as terras. Meu olhar foi direto para a fazenda ao lado, separada da nossa apenas por uma cerca simples.
E lá estava ela. A casa vizinha, com a mesma estrutura que um dia me foi tão familiar. Meu coração deu um salto ao lembrar de quem morava ali.
Heitor.
O nome ecoou na minha mente como uma memória antiga que eu nunca consegui apagar. Era inevitável. A simples menção do nome dele sempre trazia à tona uma mistura de sentimentos que eu achava ter deixado para trás.
Aquele era o lugar dele, o lar dele. E, mesmo depois de tantos anos, parecia que eu ainda podia sentir a presença dele, como se o tempo não tivesse mudado nada entre nós.
Meu celular vibrou, e puxei da bolsa para conferir a mensagem que minha mãe havia mandado.
"Mamãe:
Evelyn? Se eu não pergunto do motorista, nunca vou saber se você chegou, né?"
Logo em seguida, outra mensagem apareceu.
"Mamãe:
Não fica sem me responder! Só Deus sabe o buraco que você se meteu nessa fazenda."
Suspirei, revirei os olhos e digitei uma resposta rápida:
"Evelyn:
Cheguei bem, mãe. Relaxe, está tudo certo."
Guardei o celular de volta na bolsa, sentindo o peso da preocupação constante dela, mesmo à distância. Era o jeito da minha mãe: sempre ansiosa, sempre querendo ter o controle de tudo.
Sem pensar muito mais nisso, fui direto para o banheiro. Depois de horas de viagem e um turbilhão de memórias me invadindo desde que entrei na fazenda, um banho quente era exatamente o que eu precisava.
Deixei a água escorrer pelo meu corpo, relaxando os músculos tensos e tentando limpar, pelo menos por alguns minutos, a avalanche de pensamentos que me rondava desde o momento em que cheguei. Fechei os olhos e respirei fundo.
Eu sabia que estar ali, depois de tanto tempo, não seria simples. Mas, de alguma forma, parecia que o passado estava determinado a me alcançar, quer eu quisesse ou não.
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Atualizado até capítulo 21
Comments
Anonymous
Nossa será quem q quis q eles se separassem
2025-02-19
3
Fatima Maria
ENTÃO AS CARTAS NUMCA CHEGARAM FOI A MÃE DELA QUE NÃO PERMITIU CHEGAR NAS MÃOS 👐 DE EVELYN. MAS A MENTIRA SÓ PREVALECE QUANDO A VERDADE NÃO APARECE. MAIS AGORA VAI APARECER.
2025-02-19
2
Ely Ana Canto
será que a mãe separou eles,🤔🤔🤔🤔🤔🤔🤔
2025-01-19
4