Capítulo 3 — Vozes no Silêncio

Era domingo de manhã, e o sol brilhava intensamente, refletindo nas janelas da pequena casa. Ana acordou cedo, como raramente fazia, e passou um bom tempo sentada à mesa da cozinha, olhando pela janela. A ideia de visitar a igreja ainda parecia desconfortável. Afinal, fazia meses que ela sequer pensava em orar. No entanto, as palavras de Dona Lurdes não saíam de sua mente: "Às vezes, Deus fala conosco nos momentos mais inesperados."

Decidida a tentar, Ana vestiu uma roupa simples e caminhou até a igreja. O trajeto foi acompanhado por sentimentos mistos de ansiedade e curiosidade. Quando chegou, encontrou um grupo de pessoas reunidas na entrada, conversando animadamente. Algumas crianças acorriam pelo pátio, enquanto os adultos pareciam acolhedores e despreocupados.

Ela hesitou antes de entrar, sentindo-se deslocada. Mas, antes que pudesse voltar atrás, uma voz calorosa a chamou:

— Ora, você deve ser a Ana Clara. Seja muito bem-vinda!

O homem que a abordou era jovem, com um sorriso sincero e olhos que transmitiam calma. Era Gabriel, o pastor que Dona Lurdes mencionara. Ele não parecia imponente ou formal, mas tinha uma energia que inspirava confiança. Ana apertou sua mão, tentando disfarçar o nervosismo.

— Dona Lurdes falou muito bem de você — continuou ele. — Estamos felizes por ter você aqui. Venha, entre. Não precisa se preocupar com nada, apenas ouça e sinta-se à vontade.

As palavras gentis de Gabriel a surpreenderam. Ele não parecia interessado em julgá-la ou fazer perguntas desconfortáveis. Isso a encorajou a dar os primeiros passos para dentro da igreja.

O interior era simples, mas acolhedor. Um pequeno grupo tocava músicas suaves, conforme os fiéis se acomodavam em bancos de madeira. Ana escolheu um lugar discreto no fundo e observou o ambiente. Algo ali era diferente. Não havia ostentação, apenas uma atmosfera de paz.

Gabriel subiu ao pequeno púlpito e começou o sermão com uma história sobre José, o jovem que foi vendido como escravo pelos próprios irmãos, mas que, através de sua fé e resiliência, tornou-se governador do Egito. Ele destacou a forma como Deus transformou situações de dor em propósitos maiores.

— Às vezes, o que nos parece um momento de derrota é, na verdade, uma semente de algo muito maior — disse ele, olhando diretamente para a congregação. — Deus não nos abandona, mesmo quando achamos que estamos sozinhos. Ele trabalha nos bastidores, moldando nosso caráter e preparando nosso futuro.

Enquanto ouvia, Ana sentiu como se aquelas palavras fossem dirigidas a ela. Era exatamente como se alguém estivesse descrevendo o vazio que ela vinha enfrentando e oferecendo uma nova perspectiva. Pela primeira vez em muito tempo, ela deixou que suas emoções transbordassem. As lágrimas vieram sem aviso, e ela não tentou segurá-las.

Após o culto, Gabriel se aproximou de Ana novamente. Ele percebeu os olhos avermelhados dela, mas não comentou. Em vez disso, perguntou:

— Gostaria de tomar um café com a gente? Temos um espaço de convivência ali ao lado.

Ela hesitou, mas aceitou. No salão anexo, as pessoas conversavam em pequenos grupos, e Ana foi apresentada a Marina, uma jovem simpática que imediatamente tentou deixá-la à vontade.

— Eu sei como é difícil dar o primeiro passo — confidenciou Marina. — Eu também estava perdida quando cheguei aqui. Mas você vai ver... aos poucos, tudo começa a se encaixar.

A conversa foi leve e espontânea, o que ajudou Ana a relaxar. Aos poucos, ela começou a sentir que talvez pudesse encontrar ali mais do que conforto; talvez pudesse descobrir respostas para as perguntas que a atormentavam.

Conforme conversava com Marina, Ana notou um homem parado próximo à janela, observando a movimentação. Ele parecia pensativo, quase alheio ao burburinho em volta. Gabriel se aproximou dele e trocou algumas palavras antes de chamá-lo:

— Ana, este é Rafael. Ele também é novo na comunidade.

Rafael sorriu levemente e estendeu a mão para cumprimentá-la. Seus olhos tinham algo de enigmático, como se escondessem histórias profundas.

— É um prazer conhecê-la — disse ele, em tom tranquilo. — Espero que este lugar traga paz para você, assim como tem trazido para mim.

Ana não soube explicar, mas sentiu uma conexão imediata. Não era algo romântico, mas uma curiosidade sobre quem ele era e o que o havia levado até ali.

De volta à casa, Ana refletiu sobre o dia. Pela primeira vez, sentiu que havia feito algo produtivo com seu tempo. As palavras de Gabriel ainda ecoavam em sua mente, e as interações com Marina e Rafael despertaram algo que ela não sentia há tempos: esperança.

Antes de dormir, abriu a Bíblia de sua mãe novamente e leu outro trecho sublinhado:

"Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso." — Mateus 11:28.

Naquela noite, Ana orou. Foi uma oração curta, quase um sussurro, mas foi sincera. Ela não sabia ao certo o que esperar, mas estava disposta a continuar dando pequenos passos.

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