O preço de uma amizade

Qual é o valor de uma vida? Qual é o valor da vida do seu melhor amigo? Será o mesmo valor que alguém que não o conhece daria?

As palavras ecoaram pela sala, cada sílaba afiada como uma lâmina. A raiva tomou conta de Asani, queimando como fogo em suas veias.

- Eu não dou a mínima se essa dungeon é de rank S! - gritou ele, sua voz cheia de desespero e determinação. - Deixa o Léo viver. Quer algo? Eu te dou! Faço os desafios, pego o Ring e entrego para você. Quer as recompensas? As comidas? Ou até o próprio Ring? É isso que você quer?!

Os olhos castanhos de Asani estavam escurecidos pela mistura de ódio e medo, o corpo tremendo sob a tensão.

O Tutor sorriu, largo e cruel. Seus olhos grandes pareciam espiar até a alma.

- Você me daria qualquer coisa para salvá-lo? Exceto sua própria vida, é claro. - Ele fez uma pausa, o sorriso se tornando ainda mais sinistro. - Mas você sabe... o Ring é o meu poder. Ainda assim, você acabou de me dar uma ideia interessante. E se eu simplesmente apagar todas as suas lembranças dele?

A sala pareceu congelar.

- O quê?! Nunca! Por que diabos você faria isso?! - gritou Léo, sua raiva transbordando enquanto dava um passo à frente.

O Tutor virou o rosto para ele, sua expressão de superioridade intacta.

- A decisão não é sua. É dele.

Asani hesitou, sua voz vacilante ao perguntar: - Por quê? Por que você faria isso?

O Tutor riu novamente, os olhos semicerrados em diversão cruel.

- Eu não quero nada disso, garoto. Só quero ver como você reage.

A tensão na sala era sufocante.

- Não quer negociar de verdade? - implorou Asani, sua voz crescendo em intensidade. - Então, por favor... só deixa ele viver!

O Tutor inclinou a cabeça, os olhos brilhando como se tivesse acabado de pensar em algo ainda mais perturbador.

- E se o Léo passar pela porta enquanto você fica? Por que ele não oferece algo em troca? Afinal, não é só a vida dele que está em jogo, é?

- Não. - Léo interrompeu antes que Asani pudesse responder. - O Asani tem mais chances de vencer os próximos desafios.

O Tutor gargalhou, jogando a cabeça para trás enquanto o som de sua risada preenchia a sala.

- Vocês realmente se conhecem bem. É adorável. - Ele virou o rosto para Asani, o sorriso agora carregado de malícia. - Lembra que queria me matar, garoto?

- S-sim... - respondeu Asani, gaguejando, mas com o punho cerrado.

- Então vem. Me acerta. Vamos ver do que você é capaz.

Sem pensar duas vezes, Asani golpeou o abdômen do Tutor com toda a força que tinha.

O Tutor riu de novo. Uma risada cruel e insana.

- É só isso? Você acha que pode me matar com isso? - Ele agarrou Asani pelo cabelo e puxou-o para mais perto. Seus olhos brilhavam com malícia. - Não percebe? Eu crio as armas. Eu faço as regras. Aqui dentro, sou um deus. Eu te dou poder e o tomo de volta. Posso matar e trazer de volta à vida. Você não pode me oferecer nada que realmente importe. Você quer salvar seu amigo? Então prove que merece.

Asani lutou para soltar-se, a dor do puxão em seu cabelo intensificando-se, mas ele não cedeu.

- Me dê uma maneira de sairmos daqui, os dois vivos! - implorou ele.

O Tutor soltou seu cabelo, mas segurou-o firmemente pelo ombro.

- Claro, garoto. Eu sou um deus, mas diferente dos outros. Como toda mitologia politeísta, há aqueles que querem destruir e aqueles que querem proteger.

Asani olhou confuso.

- Você... quer proteger?

O Tutor sorriu, mas dessa vez não era um sorriso comum. Era um sorriso carregado de mistério.

- Exatamente. Mas não vou te dizer mais nada. O que eu quero é simples: um peão. Um peão para fazer tudo o que eu mandar.

- Um peão? - Asani murmurou, tentando entender. - E... e o que eu ganho com isso?

- Seu amigo vive. - O Tutor sorriu mais uma vez. - Mas só se você aceitar usar isso.

Ele estendeu a mão, revelando um bracelete negro, pulsando com uma energia sombria.

- Eu aceito. - Asani disse sem hesitar, embora sua voz tremesse.

No momento em que as palavras saíram de sua boca, Léo desapareceu, e uma porta branca se abriu à sua frente.

Asani ficou ali, parado, seus olhos arregalados de surpresa e choque. O peso da escolha o esmagava enquanto ele encarava o vazio à sua frente.

...ΩΩΩΩΩΩΩΩΩΩΩΩΩΩΩΩ...

- A criança passou? – indaga o caçador de Rings barbudo, descrente.

Asani arregala os olhos. Ele reconhece a garota que oferecera algo para os homens em troca de um lugar na "sala de aula". Ela está ali, intacta, ao lado do caçador que antes aguardava o Tutor. Agora, restavam apenas três: ele, a garota, e o caçador.

- Tutor, cadê o resto? Você disse que quatro ou cinco duplas iam passar – não dois ou três sobreviventes – o que aconteceu? – questiona Asani, olhando nervoso para o Tutor.

- Eles se mataram. – responde o Tutor com um sorriso que parece maior que deveria ser, sua grande boca se torcendo em pura satisfação.

- Ei, garoto... Por que você não tem sangue? – a garota avança até ele com passos firmes, uma espada em sua mão direita.

Asani se cala, seu olhar fixa no chão por um momento. As manchas de sangue de antes haviam desaparecido misteriosamente de sua roupa e pele.

- Vai ficar mudo? Aposto que o outro – aquele "amigo leal" – ficou para trás, se sacrificou por você, não foi? – ela provoca, seu tom repleto de desprezo.

- Cala a boca, piranha, ou eu te mato aqui mesmo! – Asani rosna, sua raiva explodindo. Ele avança, agarrando-a pelo pescoço.

O cabelo curto dela balança ao vento enquanto, com a outra mão, ela rapidamente aponta a espada à garganta dele.

- Acha mesmo que venceria um combate comigo? – sua voz é fria e cheia de ameaça, mesmo enquanto sua respiração acelera pela adrenalina.

- Já chega, vocês dois. – o caçador intervém, afastando-os com um empurrão firme.

- Fraca. Você só sabe lutar com essa espada. – Asani rosna, seus olhos queimando de desprezo.

- Hahaha. – ela gargalha de forma sinistra, balançando a espada como se fosse uma extensão natural de seu corpo.

O Tutor, que observava tudo à distância, finalmente se manifesta.

- Vamos ao teste. Parkour. Gostam de correr? Espero que sim. Dois monstros perseguirão vocês, e o campo de parkour foi preparado com neve. Vocês terão 30 segundos de vantagem. Para equilibrar, aumentei a resistência, o pulo e a força de todos vocês. Aproveitem!

Ele bate palmas, e, num piscar de olhos, a cena muda. A roupa dos três é substituída por trajes que suportam o frio, e uma cidade desolada aparece ao redor. Carros retorcidos bloqueiam ruas cobertas de neve, prédios em ruínas erguem-se como gigantes mortos, enquanto estacas de gelo, buracos e lâminas escondidas completam o cenário de destruição.

- Lembrem-se: não precisam ser mais rápidos que os monstros... apenas mais rápidos que seus amigos. – o Tutor diz com um sorriso malicioso. – TRÊS, DOIS, UM... ZERO!

Os três disparam, a neve espirrando sob seus pés enquanto correm pelo cenário. O som dos monstros sendo soltos atrás deles é quase tão alto quanto o rugido das suas respirações desesperadas.

Asani, inicialmente, corre no chão, enquanto os outros dois aproveitam a potência de seus saltos, alcançando a altura de prédios abandonados. Observando isso, ele decide usar sua força para impulsionar saltos longos para frente, ultrapassando-os com agilidade.

- O que é isso?! – ele ouve o rugido grotesco atrás de si. Olhando por cima do ombro, vê os monstros saindo de uma gaiola. Suas garras destroem obstáculos como se fossem papel, e eles avançam com uma velocidade assustadora.

- Merda! Eles são imbatíveis! – Asani grita, o pânico crescendo dentro dele.

Enquanto os três continuam, o caçador pula sobre um carro esmagado.

- Por que vocês vieram para essa dungeon? – ele pergunta, a voz elevada acima do barulho.

- Pelo poder. Quero dinheiro, e o poder traz isso. – responde a garota, correndo enquanto equilibra sua espada no ombro.

- E você, garoto?

- Eu queria aventura, mas encontrei um Tutor lunático! – Asani rebate, sua mente dividida entre a conversa e o foco nos obstáculos à frente.

- Eu estou aqui para impedir que esses Rings caiam em mãos erradas. – o caçador confessa, cerrando os punhos. Sua expressão endurecida parece repleta de lembranças dolorosas.

Um rugido ensurdecedor corta o ar.

- QUE PORRA É ESSA? – a garota grita, quase tropeçando ao ouvir o som.

- CORREEEEE! – o caçador berra, sua adrenalina explodindo enquanto acelera.

Os monstros estão mais próximos. Derrubam prédios e atravessam qualquer barreira no caminho. O chão treme, e os escombros caem como chuva mortal ao redor dos três.

Asani concentra toda sua energia em cada salto, usando sua determinação para continuar.

- Tatakae, tatakae! – ele grita, ecoando sua força de vontade.

A diferença entre os três se intensifica. Asani lidera, a garota está no meio, e o caçador começa a ficar para trás, quase alcançado pelos monstros. O som de dentes afiados e respirações animalescas ameaça engoli-los a qualquer momento.

A corrida continua, e o verdadeiro teste não é apenas físico, mas mental: quem cederá ao medo primeiro?

- SOCORRO! – grita o Ringer que havia saltado alto. Ao aterrissar, percebe tarde demais que o monstro já o aguardava com a bocarra aberta. Seu grito se transforma em um grunhido horrorizado quando é engolido num único movimento.

- AAAAAAAAH, SOCORRO! – a garota berra, girando o corpo para ver o colega sendo capturado. Mas, antes que pudesse reagir, o segundo monstro surge do lado oposto, atingindo-a com uma força brutal na cabeça e lançando-a contra o prédio mais próximo.

Ela colide violentamente contra os escombros congelados, e o impacto ecoa como o som de gelo se partindo. - Asani! Socorr... – sua voz é interrompida por um segundo golpe do monstro, que a atinge na garganta com suas Garras afiadas. Sangue espirra na neve, tingindo o branco imaculado com um vermelho vibrante.

Ela tenta lutar, socando inutilmente o corpo grotesco da criatura, mas sua força é insignificante diante da monstruosidade. Seu corpo é jogado para longe, inerte.

Asani continua correndo. Ele não olha para trás. Seus pés esmagam a neve abaixo de si, enquanto sua mente se recusa a processar os sons de gritos e destruição.

Então, tudo desaparece.

De repente, o mundo inteiro parece ser engolido por um clarão branco. Os prédios desabam como poeira, os monstros se dissolvem no ar, e até a neve evapora sob os pés de Asani.

- Que raios é isso? – ele pergunta, parando de repente, ofegante.

- Você venceu a Dungeon, garoto. – responde uma voz bem-humorada atrás dele.

Asani vira-se para encontrar o Tutor, parado com seu sorriso largo e peculiar.

- Ufa. – resmunga Asani, deixando seu corpo cair de costas no chão que agora parece liso e frio, como mármore. Ele respira profundamente, os braços estendidos ao lado do corpo, enquanto o Tutor dá um passo para trás, evitando o contato.

- Mas... primeiro, você deve colocar a pulseira. Caso contrário, bem... eu te mato aqui e agora.

A voz do Tutor carrega um tom sério que faz Asani sentar-se imediatamente.

- Óbvio. Cadê ela? – ele pergunta, tentando esconder o nervosismo.

Com um estalar de dedos do Tutor, uma pulseira escura materializa-se no ar, flutuando à frente de Asani. Ele a pega com cuidado, observando-a, antes de colocá-la no pulso direito.

Assim que a pulseira se encaixa, ela emite um brilho dourado que cobre todo o braço de Asani por dois segundos. Então, como se puxado para outra dimensão, a sala branca ao seu redor se transforma novamente. Ele agora está em uma sala ornamentada, com um pedestal central onde repousam uma pedra brilhante e um Ring dourado.

- Tutor? Tutor? Cadê você, cara? – Asani se levanta rapidamente, olhando ao redor. – E o Léo? Meu amigo, onde ele está?!

Nenhuma resposta. O silêncio é ensurdecedor, apenas o eco de sua própria voz preenchendo a imensidão da sala.

Ele se aproxima hesitante do pedestal, seu olhar fixo na pedra brilhante. Ela parece pulsar levemente, como se estivesse viva.

- Ele disse que eu tinha que colocar o Ring... Essa é a pedra dos dons? – murmura Asani para si mesmo enquanto estende a mão para pegá-la.

Ao segurá-la, uma série de palavras começam a se formar em sua mente, como se a pedra estivesse falando diretamente com ele:

“Volta-time. O poder de retroceder ou adiantar o próprio corpo no tempo quantas vezes quiser. Permite retornar o tempo de objetos inanimados até mil vezes. Não é capaz de controlar o tempo de outros seres pensantes.”

Asani lê em voz alta, franzindo o cenho. Ele coloca a pedra de volta no pedestal, e sem hesitação, pega o Ring dourado, encaixando-o no dedo indicador direito.

Por um momento, ele espera alguma transformação grandiosa. Algo que anuncie sua vitória.

- Só isso? – ele pergunta para o vazio.

A sala começa a desmoronar, mas não como antes. Agora, tudo desaparece gradualmente, como se fosse absorvido por uma sombra invisível. Em segundos, ele está de volta à realidade, cercado por uma vastidão branca e silenciosa.

- Então é isso. Esse é o resultado da Dungeon. – ele murmura, mais para si do que para qualquer outra pessoa. Mas sua voz logo ganha um tom mais aflito. – Mas... cadê o Léo? E o Tutor?

Nada. Apenas o vento frio acariciando seu rosto enquanto a solidão o envolve.

Capítulos
Capítulos

Atualizado até capítulo 55

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!