Capitulo 1

Teodora terminava de guardar na charrete o que sobrou de mais um dia de trabalho na feira, estava acostumada a acordar todas as manhãs antes do sol nascer e arrumar em cestos as hortaliças e verduras que venderia, a jovem era conhecida no vilarejo, a alegria, o sorriso largo e os enormes cabelos castanhos que voavam soltos chamavam a atenção não só dos comerciantes mas de boa parte dos milionários em Napoli.

Teodora tinha doçura em sua voz, apesar da pouca instrução e de mal ter terminado a quinta série era uma mulher inteligente, agradável, fazia contas como nenhuma outra e tinha tino para os negócios, sua barraca estava sempre cercada por clientes, as empregadas da maior parte das mansões dali a procuravam pelo frescor de suas hortaliças, pelo cuidado e zelo que tinha em trazer todas as manhãs os alimentos que aquelas mulheres serviriam a mesa.

— Já vai menina?

Um dos feirantes se aproximou de Teodora com uma pequena caixa, trazia nas mãos uma dúzia de cerejas, eram as mais doces e suculentas de Napoli e as preferidas da bela moça.

— Sim senhor Rafael, Clarinha ainda não chegou, pedi a ela que não se atrasasse, que viesse direto para cá, já é noite estou preocupada.

Olhava para o velho relógio em seu pulso, a única lembrança que havia sobrado da mãe e que havia sido entregue a ela quando ainda era criança, o homem a ajudou a por na carroça os cestos, lhe entregou a caixa.

— Desculpe, não tenho como pagar, as vendas foram boas mas Clara precisa de um uniforme novo e papai de um médico, a cabeça está cada dia pior.

A voz embargada repleta de vergonha, trabalhava tanto e não tinha dinheiro o suficiente para comprar a fruta que tanto gostava.

— É um presente minha filha, leve.

O homem insistiu, Teodora o beijou no rosto de forma terna, subiu na carroça, uma tempestade forte estava prestes a desabar e com as estradas que levavam ao casebre praticamente em puro cascalho ela e a irmã não chegariam a trilha, ficariam ilhadas.

— Senhor Caetano, pode chamar minha irmã?

Teodora gritou da carroça o guarda que cuidava da portaria,o homem entrou no colégio e saiu de lá acompanhado por uma das freiras e por Clara, o coração de Teodora bateu em desespero ao fitar a irmã.

— Clara, o que houve?

Saltou da charrete, segurou o rosto da irmã entre as mãos, o canto da boca machucado e os cabelos loiros como o sol em um completo emaranhado.

— Sua irmã não estuda mais em nossa escola, eu disse a você da última vez senhorita Santino, essa é uma instituição de respeito, nossas meninas são damas da alta sociedade, abrimos uma exceção para que Clara estudasse aqui primeiramente por caridade e desde que continuasse fornecendo as verduras e hortaliças que trazia como pagamento manteriamos o acordo.

Olhou as irmãs dos pés à cabeça.

— Porém... é óbvio que isso não tem funcionado, Clara não pertence ao mundo dessas garotas, não possui a mesma finesse que elas, é como tentar misturar azeite e água.

A mulher lhes deu as costas.

— Irmã Berenice.

Teodora tentou impedir.

— Por favor não faça isso, eu imploro.

Se ajoelhou sobre o chão quente, segurava o longo e velho vestido com as mãos trêmulas.

— Não tenho condições de pagar por uma boa escola, esse internato é um dos melhores em Napoli e é também o único que aceita minhas mercadorias como pagamento, com meu pai doente, eu trabalhando na feira o dia inteiro não teria como encontrar outra escola, Clara seria obrigada a abandonar os estudos, não quero que tenhamos o mesmo destino, vejo esperança para ela.

— Clara deveria ter pensado nisso antes, sua irmã saiu nos tapas com a filha de Tiziano Rossi, sabe quem é? O dono de metade desse vilarejo, deveria estar feliz por ela ter sido expulsa e não presa, era o que os pais da outra aluna queriam que eu fizesse.

Teodora olhou para irmã com olhos cheios de lágrimas, não disse nada, nunca a repreendia de cabeça quente por medo de magoa-la, subiu na charrete, limpou os olhos molhados, puxou as redias, olhava para estrada quando Clara quebrou o silêncio.

— Mi dispiace, fiore.

Clara balbuciou, a chamava pelo mesmo nome que a mãe, sempre que pretendia acalma-la.

— Não quero conversar agora, Clara, por favor.

Manteve os olhos fixos no cavalo, Clara a encarou com raiva.

— Não é justo me tratar assim, você não sabe o que tive que aturar durante esses malditos meses, todos os xingamentos, os apelidos, as piadas, riam das minhas roupas, dos meus sapatos, do lanche que eu trazia, faziam vômito todas as vezes que eu o colocava sobre a mesa, tudo piorou quando me viram descer da charrete na frente da escola.

— Clarinha, tem vergonha de mim?

— Não Teodora eu não tive vergonha, eu tive raiva, aquelas garotas tem tudo, uma boa casa, carros, empregados que fazem tudo por elas sem sacrificar exatamente nada, ainda assim se acham no direto de nos desprezar como se não fossemos seres humanos, você trabalha tanto, vive para cima e para baixo com esse vestido velho, seus sapatos surrados, elas te chamaram de quitandeira imunda, de feirante de merda, eu queria mata-las.

Clara chorou, Teodora a abraçou com força.

— Clara eu sinto muito, eu não sabia, não fazia ideia que eram tão más com você.

— Eu nunca reclamei porque sabia o quão duro você trabalhava para me manter naquele colégio, o quanto se sacrificava para que eu pudesse estudar, mas não admito que isutem você, se não tivessem me segurado eu teria arrancado um a um cada fio daquela peruca vermelha na cabeça da Marcella.

Teodora limpou as lágrimas no rosto da irmã com as pontas dos dedos, secou as que escorriam de seus olhos.

— Não chore está tudo bem, vamos encontrar um novo colégio, talvez algo mais perto da cidade, o movimento anda mesmo fraco por aqui, será melhor para as vendas.

— Teodora, a cidade fica a vinte quilómetros, se fizermos esse percurso todos os dias vamos matar o Bartolomeu.

Se referia ao cavalo.

— Daremos um jeito, talvez seja a hora de deixarmos o casebre, de encontramos um lugar mais perto da civilização, de escolas, hospitais, quem sabe eu não encontre um novo trabalho?

— Mais e o papai?

— Ele terá que aceitar Clarinha, não tem outro jeito.

Clara

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Comments

Carolina Luz

Carolina Luz

onde vc arruma tanta gente linda pra colocar nos teus livros heim Léia? que bom gosto na escolha, são lindas demais 🥰🥰

2025-10-01

2

Renata Costa

Renata Costa

a pior dor e vc ouvir piadas de pessoa que faz sacrifício por vc que luta para ti dar um conforto que ele não teve ...eu já passei por isso

2025-09-30

13

Drika

Drika

ainda bem que apesar de todas as dificuldades não há inveja entre elas ou disputas o amor entre todos prevalece sendo um pelo outro 🥰

2025-10-02

1

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