O ônibus escolar estacionou em frente ao parque natural de Minami-Kamakura com um rangido longo e preguiçoso. Era um daqueles dias perfeitos de outono: céu limpo, folhas avermelhadas caindo devagar, e um vento fresco que fazia os uniformes balançarem. Os alunos da Escola Hanamori desceram em fila, animados com o passeio anual — uma tradição que misturava trilha leve, piquenique e fotos em grupo que acabariam no mural da escola.
Takumi desceu com calma, ajustando a alça da mochila. Riku pulou do último degrau como se estivesse saindo de um filme de ação.
— Hoje eu vou liderar o grupo mais eficiente da história dos passeios escolares — anunciou, já procurando Daichi com os olhos.
— Você vai liderar o grupo que mais se perde — respondeu Takumi, sem olhar.
— Detalhes técnicos.
A professora distribuiu os alunos em grupos de quatro ou cinco, com a clássica frase “vocês vão aprender a trabalhar em equipe”. Os grupos se formaram rápido, com os amigos se juntando naturalmente. Takumi, Riku, Daichi e Mei já estavam juntos quando a professora se aproximou com uma aluna ao lado.
— Hayasaka-kun, você pode ficar com a Hina? Ela ainda não conhece muita gente.
Hina era uma garota do segundo ano, com cabelo preso em duas mechas e olhos grandes demais para disfarçar o nervosismo. Ela olhou para Takumi como se ele fosse uma celebridade. E talvez, para ela, fosse.
— Claro — disse Takumi, educado.
Riku observou a cena com um sorriso que não chegou aos olhos.
— Bem-vinda ao grupo — disse ele, puxando Daichi pelo braço. — Vamos mostrar pra Hina como não seguir o mapa e ainda chegar no destino.
*
A trilha era leve, com placas em hiragana indicando os pontos de parada e árvores altas que filtravam a luz do sol. O grupo seguia em ritmo tranquilo, com Mei tirando fotos, Daichi tentando encontrar insetos raros e Riku fazendo comentários aleatórios sobre cada pedra que encontrava.
Takumi caminhava ao lado de Hina, que tentava puxar conversa.
— Você gosta de literatura clássica? Eu vi você lendo Botchan outro dia...
— Gosto. Mas prefiro autores contemporâneos.
— Ah... tipo Murakami?
— Mais ou menos.
Hina sorria como se cada resposta fosse uma revelação. Riku, que caminhava logo atrás, observava em silêncio. Não era exatamente incômodo. Mas havia algo ali. Um desconforto leve. Como quando alguém mexe na sua gaveta sem pedir.
— Takumi — chamou Riku, acelerando o passo. — Você viu aquele tronco caído? Parece um dragão.
— Não parece um dragão.
— Parece sim. Mei, tira uma foto. Vai ser a capa do nosso curta.
Mei riu e obedeceu. Hina tentou acompanhar, mas Riku já estava puxando Takumi para o lado, apontando para uma pedra coberta de musgo.
— Isso aqui parece um mapa. Olha, tem até uma linha que parece um rio.
— Você está vendo coisas.
— Ou talvez eu esteja vendo o que ninguém vê. Igual a Mei.
Takumi olhou para ele, tentando entender o que estava por trás da brincadeira. Mas Riku já estava sorrindo de novo, como se nada tivesse acontecido.
Na parada para o piquenique, os grupos se espalharam pelos gramados. Mei abriu uma toalha com estampa de coelhos e começou a organizar os lanches. Daichi tirou uma garrafa térmica com chá gelado e um pacote de senbei. Hina sentou-se ao lado de Takumi, com um bentô cuidadosamente preparado.
— Eu fiz sozinha — disse ela, oferecendo um bolinho de arroz. — Quer provar?
Takumi hesitou, mas aceitou. Riku observava de longe, mordendo um onigiri com mais força do que o necessário.
— Você tá bem? — perguntou Mei, sentando ao lado dele.
— Tô. Só tô mastigando com emoção.
— Tá com ciúmes?
Riku engasgou.
— O quê?
— Da Hina. Ela tá grudada no Takumi desde que a gente chegou.
— Não tô com ciúmes. Só acho que ela devia dividir o tempo. O grupo é de cinco, não de dois.
Mei riu, mas não insistiu. Riku olhou para Takumi, que comia devagar, ouvindo Hina falar sobre o clube de jardinagem. Ele não parecia incomodado. Mas também não parecia envolvido.
— Ele não sabe — murmurou Mei.
— Não sabe o quê?
— Que ela gosta dele.
Riku os olhou com mais atenção. A conversa entre eles fluia e percebeu um sorriso em Takumi que o deixou ainda mais incomodado.
Depois do almoço, os grupos se reuniram para uma atividade de observação. Cada grupo deveria encontrar algo “único” na natureza e apresentar para a turma. Daichi sugeriu uma pedra com formato de peixe. Mei tirou uma foto de uma folha com três cores. Hina apontou para uma flor que crescia sozinha entre as raízes.
— É delicada, mas forte — disse ela, olhando para Takumi.
Riku revirou os olhos.
— A flor não tem nada a ver com ele.
— Eu não disse que tinha — respondeu Hina, corando.
Takumi olhou para os dois, confuso.
— Vocês estão brigando por causa de uma flor?
— Não — disseram os dois ao mesmo tempo.
Mei riu alto.
— Isso vai dar um ótimo capítulo no nosso mangá.
No fim do dia, os alunos voltaram para o ônibus com os rostos corados de sol e os celulares cheios de fotos. Takumi sentou-se na janela, como sempre. Riku jogou a mochila no banco ao lado e se acomodou com um suspiro.
— Você não gostou da flor?
— Não é isso.
— Então o que foi?
Riku olhou para ele, sério por um instante.
— Você não percebe quando alguém gosta de você, né?
Takumi ficou em silêncio.
— E você? Percebe quando alguém gosta de você?
Riku desviou o olhar.
— Você não deveria sair se abrindo pra qualquer pessoa...
Takumi não respondeu. Mas olhou pela janela, vendo o céu escurecer devagar. E, por algum motivo, sentiu que o dia tinha deixado mais do que fotos na memória.
Mais tarde, no quarto, Takumi abriu o diário e escreveu:
> “Hoje ela me ofereceu um bolinho de arroz.
> E ele me puxou pela manga.
> Um gesto doce.
> Um gesto distraído.
> E eu, no meio, tentando entender o que não foi dito.”
Fechou o diário e olhou pela janela. Lá fora, o céu estava escuro, mas ainda havia luz nos postes da rua.
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Atualizado até capítulo 57
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