A manhã seguia seu ritmo habitual na Escola Hanamori. O som dos passos apressados nos corredores misturava-se ao zumbido dos ventiladores de teto, ainda ligados apesar do clima ameno de setembro. Na sala 2-B, Takumi já estava em seu lugar, organizando seus cadernos com precisão. Ao lado, Riku dormia profundamente, com o rosto enterrado nos braços e o uniforme ligeiramente desalinhado.
A professora de história escrevia na lousa com firmeza, explicando os acordos pós-guerra, quando percebeu o estado de Riku. Caminhou até ele e tocou seu ombro com delicadeza.
— Tanabe-kun, acorde. Estamos em aula.
Riku murmurou, sem abrir os olhos:
— Mãe... só mais cinco minutinhos...
A sala explodiu em risadas. Takumi, que raramente se deixava levar por brincadeiras, abaixou o rosto, tentando esconder o sorriso que escapava. Riku abriu os olhos devagar, piscando como se estivesse em outro planeta.
— Isso não é meu quarto?
— Não, e eu não sou sua mãe — respondeu a professora, com um sorriso contido. — Mas agradeço o carinho.
Riku se endireitou, ainda meio perdido, e olhou para Takumi.
— Você devia ter me cutucado... ia me salvar de virar piada no LINE.
— E perder a melhor parte da aula? Nem pensar.
Riku fez uma careta e voltou a encarar a lousa, tentando fingir que estava prestando atenção. Mas seus olhos ainda carregavam o brilho de quem não tinha acordado por completo.
Quando o sinal tocou, anunciando o fim do dia, os alunos começaram a se dispersar. Takumi guardava seus materiais com precisão, enquanto Riku se espreguiçava como um gato preguiçoso.
— Ei, você vai direto pra casa?
— Sim. Por quê?
— Vamos dar uma volta. Só um pouquinho. Preciso respirar depois de ser confundido com um bebê.
Takumi hesitou, mas assentiu. Caminhar com Riku era sempre imprevisível, mas nunca desagradável.
Saíram da escola e seguiram por um caminho que conheciam bem. A trilha entre as árvores os levava à mesma praia que frequentavam desde pequenos, quando ainda corriam descalços e competiam para ver quem encontrava a concha mais bonita. Era um trecho tranquilo da costa de Kanagawa, onde o mar parecia sempre calmo e os sons da cidade ficavam distantes.
— Lembra quando a gente tentou construir um castelo aqui e ele virou uma montanha de lama?
— Você queria fazer um fosso com balde furado.
— Era um fosso estratégico! Você que não entendeu a genialidade.
Takumi sorriu, tirando os sapatos. Riku fez o mesmo e correu alguns passos pela areia, como se tivesse voltado a ter oito anos. Mais adiante, encontraram o velho tronco meio enterrado, onde costumavam sentar para comer biscoitos ou observar o mar.
Sentaram-se lado a lado, em silêncio. O vento soprava leve, e o som das ondas preenchia o espaço entre eles.
— Você acha que as pessoas mudam muito? — perguntou Riku, com a voz baixa, quase como se estivesse falando com o mar.
Takumi demorou a responder.
— Algumas mudam. Outras só se revelam com o tempo.
Riku olhou para ele, curioso.
— E você? Já se revelou?
Takumi desenhou linhas na areia com o dedo, sem olhar para ele.
— Ainda estou tentando entender o que está escondido.
Riku balançou as pernas, observando os próprios pés afundando na areia.
— Eu acho que você é tipo... uma caixa de segredos. Mas não é uma caixa trancada. É só que ninguém sabe onde está a chave.
Takumi parou de desenhar e olhou para o mar.
— Talvez a chave esteja com alguém que não sabe que carrega.
Riku franziu o cenho, pensativo.
— Isso foi profundo. Você devia escrever livros. Tipo... “O menino que falava com o vento”.
Takumi sorriu, discreto.
— E você seria o personagem que dorme nas aulas e acorda achando que está em casa.
— Ei! Isso foi só uma vez. Tá, duas. Mas eu sou bom em outras coisas. Tipo... fazer você rir.
Takumi olhou para ele, e por um instante, o mundo pareceu desacelerar. O mar, o vento, o céu — tudo em silêncio, como se esperasse por uma resposta.
— Você me faz rir. Mesmo quando não entende por quê.
Riku sorriu, satisfeito, e se deitou no tronco, olhando para o céu.
— Então tá tudo certo. Se eu conseguir fazer você rir todo dia, acho que já tô fazendo alguma coisa certa.
O sol começava a se esconder atrás das nuvens, tingindo o céu com tons suaves. Takumi sentia o coração bater mais rápido, mas não sabia se era pelo vento, pela paisagem ou pelas palavras de Riku.
Ao chegar em casa, subiu para o quarto, abriu o diário e escreveu:
> “Hoje fomos à praia. A mesma de sempre.
> Ele falou sobre chaves e caixas, como se soubesse mais do que imagina.
> O mar continua o mesmo. O tronco também.
> Só ele parece mais perto do que antes.
> E eu... talvez esteja mais longe de esconder o que não sei nomear.”
Fechou o diário e olhou pela janela. Lá fora, Riku ainda não tinha entrado em casa, e parecendo que sentia o olhar de Takumi, virou e olhou diretamente para a janela e acenou. Takumi, respondeu ao aceno do outro lado do vidro, com o sentimento de que o mundo realmente estava mudando. Devagar. Mas mudando...
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Atualizado até capítulo 57
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