Augusto Arlott não era homem de palavras vazias. Durante toda a sua vida, aprendera a identificar quando algo ameaçava a integridade da família — fosse um contrato mal redigido, um sócio oportunista ou um rumor espalhado no salão social de Valmont. Mas nada o incomodava mais do que ver a neta, sua herdeira, arrastando a dignidade pelo chão por causa de um homem que devia lealdade àquele sobrenome.
E Rafael, apesar de todo o cuidado que recebera desde menino, começava a decepcioná-lo.
Numa tarde silenciosa, Augusto chamou o mordomo à biblioteca.
— Quero relatórios detalhados sobre os movimentos de Rafael dentro da casa. Onde passa seu tempo, com quem fala, em quais reuniões participa — ordenou, a voz carregada de uma autoridade fria.
O mordomo assentiu sem questionar. Em pouco tempo, os papéis estavam sobre a mesa do patriarca: registros de ausências nas reuniões do conselho, longos intervalos passados nos corredores de serviço, visitas constantes à ala da cozinha. Augusto folheou cada folha com olhar calculista, e a cada página confirmava o que já suspeitava: Rafael se desviava do caminho que lhe fora dado.
Enquanto isso, Isabella tentava manter a compostura diante do mundo. Naquela noite, participava de um jantar com investidores da família. Seu sorriso era impecável, suas palavras medidas, mas por dentro sentia o coração apertado. A ausência de Rafael ao seu lado era gritante. Ele, que sempre estivera presente em ocasiões como aquela, agora desaparecia em desculpas.
De volta ao Solar, encontrou-o no jardim, conversando com Clara. A filha da cozinheira levava um xale simples sobre os ombros, e falava com lágrimas nos olhos. Ao perceber Isabella, rapidamente enxugou o rosto, como se escondesse uma dor que apenas Rafael conhecia.
— O que está acontecendo aqui? — Isabella perguntou, firme, mas sem perder a elegância.
Rafael deu um passo à frente, protetor, como se Clara fosse de cristal. — Ela não está bem. Você não vê?
Clara baixou os olhos, deixando escapar um suspiro frágil. Isabella, ferida pela desconfiança estampada no rosto de Rafael, conteve a vontade de se defender. Não era o momento de se humilhar. Apenas se virou e entrou de volta na mansão, o som dos saltos ecoando contra o mármore.
Dias depois, Augusto reuniu-se com Rafael em particular. O patriarca estava de pé diante da lareira, os olhos faiscando sob as sobrancelhas espessas.
— Rafael, você tem se esquecido de quem é e do que significa carregar o nome Arlott.
— Com todo respeito, senhor, eu nunca esqueci. Mas… às vezes sinto que Isabella não… — ele hesitou, lembrando-se das lágrimas de Clara — … que ela não me respeita como deveria.
Augusto golpeou o chão com a bengala, o som reverberando como um tiro.
— Isabella é a herdeira legítima desta família! Não existe “respeito devido” a você, porque tudo o que tem foi dado por nós. Eu o tirei da rua, dei-lhe um lar, um nome, uma promessa. E agora ousa questionar a dignidade da minha neta?
Rafael empalideceu, mas não recuou totalmente.
— Eu só quero ser ouvido… não sou um acessório na vida dela.
— Você é parte de um destino que eu tracei. Mas se não é capaz de honrar esse papel, perderá tudo o que recebeu. — Augusto aproximou-se, a voz mais baixa, carregada de veneno. — E saiba: ninguém humilha uma Arlott sem pagar o preço.
Naquela noite, Isabella foi surpreendida pelo avô. Ele entrou em seu quarto com a serenidade de quem já tomara uma decisão.
— Minha menina, não se aflija mais com Rafael. — Ele pousou a mão enrugada sobre a dela. — Se ele não souber reconhecer o valor que tem ao seu lado, vou retirar cada privilégio que lhe dei. Você merece mais.
Isabella o fitou em silêncio, sentindo-se dividida. Parte de si ainda guardava a esperança do rapaz que jurara protegê-la diante do piano. Mas outra parte, ferida pela desconfiança e pelas acusações injustas, começava a acreditar que talvez seu avô tivesse razão: Rafael já não era mais o mesmo.
E assim, em silêncio, Augusto começou a mover suas peças. Rafael perdeu a cadeira em uma das reuniões do conselho. Foi excluído de uma viagem de negócios importante. O poder que sempre acreditara ser seu por direito começou a escorrer pelos dedos como areia.
Clara, ao perceber a tensão, intensificou suas manipulações. Agora, além das supostas crises, sussurrava frases carregadas de veneno:
— Se Isabella soubesse que você se importa comigo, faria de tudo para me expulsar daqui… Ela não suporta dividir nada.
Cada palavra era mais uma rachadura no vínculo que unia Rafael e Isabella.
Mas o patriarca já tinha outros planos. No íntimo, sabia que o destino da neta não seria mais com aquele rapaz ingrato. O coração dele começava a buscar outro nome, outro herdeiro digno de ocupar o lugar ao lado de Isabella.
E essa decisão mudaria para sempre o rumo da história.
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Atualizado até capítulo 47
Comments
calloucatty
tá certo, pelo perfil do avô, uma segunda chance só seria dada para um coração firme.. mas se ele é extremamente influenciável e não percebe uma manipulação barata dessa, como iria governar o legado da família?
2025-09-12
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Isabel Bel
E Rafael vai sentir, mas já demonstrou ser fraco de caráter, manipulável e julga muito mal quem lhe valorizava, e Isabella, que já tinha sentimentos, percebeu que só gostar não é suficiente
2025-09-09
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Dilma Melachos
também não acho certo o avó querer empurrar um marido pra neta.ele age como se ela não tivesse capacidade de escolher seu próprio marido.
2025-09-11
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