A madrugada chegou abafada. Lá fora, o vento quente fazia as folhas baterem nas janelas como dedos impacientes. O apartamento, no entanto, permanecia quieto. Lily rolava na cama, os lençóis embolados, o sono leve demais para levá-la.
Um som baixo, quase imperceptível, quebrou o silêncio. Algo entre um suspiro e um gemido abafado. Lily sentou-se devagar, o coração batendo mais rápido. Ajustou o aparelho auditivo e prendeu a respiração.
Havia outro som.
O som de alguém tentando respirar — falhando.
Saiu do quarto com passos leves, os pés descalços contra o chão frio. A luz da sala estava apagada, mas uma faixa fraca escapava pela porta entreaberta do quarto de Kai.
Ela empurrou devagar.
Kai estava encolhido no canto da cama, os joelhos puxados contra o peito. O rosto molhado de suor, o peito arfando como se o ar estivesse em falta. As mãos tremiam. Os olhos estavam fechados, mas se moviam sob as pálpebras, como se fugissem de algo invisível.
Lily hesitou. Depois se aproximou, ajoelhando-se ao lado da cama. Tocou o ombro dele com cuidado.
Kai se sobressaltou. Abriu os olhos, perdidos. Por um segundo, parecia não reconhecê-la. As pupilas dilatadas, a respiração descompassada. Os dedos apertando os lençóis com força.
Ela ergueu as mãos rapidamente e gesticulou com calma:
“Você está seguro.”
“Está tudo bem agora.”
Ele piscou várias vezes, como se voltasse para o presente. Os olhos, antes em frenesi, encontraram os dela. E foi ali que o medo desabou. Não o medo de algo externo. Mas o medo de ser visto.
Lily sentou-se ao lado dele, com calma, sem dizer nada. Apenas ficou ali, presente.
Kai passou as mãos no rosto, tentando conter o tremor.
— Foi só um ataque... acontece às vezes — murmurou, a voz rouca de quem quase se afogou por dentro.
Ela pegou o bloco de post-its na mesinha de cabeceira e escreveu:
“Pesadelos?”
Ele assentiu.
Depois olhou para ela como se tivesse vergonha de tê-la deixado ver aquilo. De ser frágil. Mas ela não desviou o olhar. Nem julgou. Pegou outro post-it:
“Ficar sozinho é pior.”
Ele leu. Depois esticou o braço devagar e segurou a mão dela — quente, pesada, pedindo por algo que ele não sabia nomear. E Lily não recuou.
Deitou-se ao lado dele na cama estreita. Ficaram em silêncio. Não um silêncio desconfortável. Mas um silêncio carregado de presença. De cuidado.
Kai virou-se para o lado, os olhos ainda abertos.
— Eu nunca sei como desligar... minha cabeça, minha música... tudo parece alto demais — disse, baixo, quase para ele mesmo.
Lily estendeu a mão e encostou no peito dele, acima do coração. O toque era leve, mas firme.
Ele cobriu a mão dela com a sua.
Não disseram mais nada.
Ficaram assim até o ritmo da respiração dele desacelerar. Até o peso da noite diminuir. Até, enfim, o sono vencer.
E quando o sol começou a tocar a janela com seus primeiros fios dourados, Lily ainda estava lá — os olhos abertos, o coração em alerta.
Kai dormia. Calmo.
E ela, sem perceber, também estava diferente.
Porque às vezes, o que acorda a gente... é o que o outro esconde no escuro.
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Atualizado até capítulo 32
Comments
Nakayn _2007
Posso dizer que esse livro é vida? Está me dando muitas emoções.
2025-08-03
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