O fim do ano se aproximava.
As próximas semanas marcam as últimas aulas — do ano, do colégio, do ensino médio.
— Nem acredito que já vai acabar. — comentou Jasmine.
Jasmine era a única amiga de Sienna fora da máfia. E, com o fim do ensino médio à vista, ela temia pelo futuro dessa amizade.
— Realmente, foram anos muito bons, sentirei falta.
— Quem sabe a gente não se encontre na faculdade? Você já decidiu para qual irá? — Jasmine pergunta com ânimo.
Jasmine havia escolhido Stanford e até convidado Sienna a ir com ela — ficaria feliz se pudesse.
Mas isso já não era o que Sienna queria.
Não queria ficar longe da família. E a faculdade Stanford ficava há seis horas de voo de Boston. Ou seja, ela teria que morar lá.
O silêncio de Sienna foi suficiente.
— Amiga, tudo bem, sei que não vai.
Sienna apenas a encarou.
— Sempre soube que você não iria, Sienna. Você fala bem da sua família, não teria porque querer ficar longe deles.
Jasmine queria distância. Stanford era mais do que um sonho: era fuga.
Em casa, sua mãe apanhava calada, e por mais que Jasmine tentasse ajudar, ela sempre se recusava a sair.
— Jasmine, obrigada por entender. Poderá sempre contar comigo quando quiser, quero que seja feliz.
Elas se abraçam por um longo tempo, sentindo a mudança de vida que estava prestes a chegar.
Quando o sinal tocou, elas retornaram para a sala e tiveram um longo dia de trabalhos e provas.
Ao chegar em casa, Sienna subiu direto para o banho. Queria relaxar antes de encarar o jantar — e a família.
O som dos saltos de Sienna ecoava pelo mármore da Villa Serpente enquanto ela caminhava em direção à sala de jantar, já sentindo o cheiro dos temperos se espalhando pelo ar. Estava cansada, o dia na Saint Adrian’s fora longo, e tudo o que queria era um jantar em silêncio — ou, no máximo, uma conversa afiada com Lorenzo.
Mas, ao cruzar a entrada do salão, ela parou. O coração disparou.
Sentado à mesa, entre Lorenzo e Dante, estava ele.
Nicolás Esposito.
Camisa preta alinhada, mangas dobradas até os antebraços, a expressão serena demais para alguém que claramente sabia o efeito que causava nela.
— O que ele tá fazendo aqui? — escapou antes que pudesse conter. A voz saiu seca. Fria.
Todos olharam para ela. Lorenzo ergueu uma sobrancelha.
— Eu convidei. Nicolás vai frequentar a academia com a gente e... achei educado integrá-lo melhor à família.
— Família? — Sienna cruzou os braços, parada na entrada. — Ele não é da família. É um parasita infiltrado.
— Sienna, isso são modos?! — Donatela lhe lançou um olhar atravessado.
Nicolás ergueu o olhar devagar, os olhos cinzentos capturando os dela como lâminas afiadas.
— Que recepção calorosa. Quase me sinto bem-vindo.
— Quase? Tô falhando, então.
Lorenzo pigarreou, sem esconder o leve sorriso divertido.
— Sente-se, foguinho.
Ela caminhou até a cadeira oposta à de Nicolás, mas fez questão de manter a postura rígida. A presença dele ali era um incômodo físico, quase palpável. E o maldito ainda parecia se divertir com isso.
— Você sempre chega com essa cara quando está com fome? — ele perguntou, cortando um pedaço de carne.
— Só quando tem coisa podre no prato — respondeu, sem sequer olhar para ele.
— Minha filha, não foi essa a educação que te ensinei. — seu pai observa.
— Uso minha educação com quem merece tê-la, papai.
Dante, que assistia à troca com o prato quase esquecido, riu alto.
— Cara, isso me lembra da garota que tá afim de mim. Ela também me trata assim... cheio de patadas. — Ele apontou com o garfo. — Aposto que é um sinal.
Sienna virou lentamente para ele, os olhos semicerrados.
— Se a garota realmente gostar de você, Dante, então o mundo tá mais perdido do que eu pensava.
Nicolás disfarçou um sorriso enquanto levava a taça aos lábios. Sienna percebeu — e odiou mais ainda.
— Interessante você se incomodar tanto com a minha presença — disse ele, com voz baixa e calculada. — Quem vê pensa que minha simples existência bagunça sua paz.
— Você não tem esse poder.
— Não? Então por que tá tão... nervosa?
Ela largou o garfo, o olhar queimando.
— Eu só não gosto de conviver com gente falsa. E você é isso, Nicolás. Um teatro ambulante.
Lorenzo olhou de um para o outro com um suspiro resignado.
— Por favor, tentem não matar um ao outro antes da sobremesa.
Dante completou:
— Ou pelo menos esperem até eu terminar de comer.
A tensão pairava no ar como um fio de navalha, e mesmo entre provocações e silêncios carregados, havia algo que ninguém à mesa queria admitir — o jogo perigoso entre Sienna e Nicolás já havia começado.
E estava longe de terminar.
Após o jantar, a louça ainda tilintava na cozinha quando Sienna saiu discretamente pela varanda da Villa. O vento da noite soprava leve, mas o incômodo ainda fervia sob sua pele.
— Você está realmente levando isso a sério? — A voz de Lorenzo surgiu atrás dela.
Ela não se virou, apenas cruzou os braços.
— Levar o quê a sério?
— Essa guerra fria com o Nicolás.
Sienna bufou, finalmente encarando o irmão.
— Não é guerra fria. É só... ele me irrita. Tem esse jeito... calmo demais. Como se soubesse de tudo. Como se estivesse sempre um passo à frente.
Lorenzo se recostou no batente da porta, os braços cruzados, observando-a.
— Porque ele provavelmente está.
— Ótimo. Então, ele pode continuar sendo perfeito bem longe de mim.
— Ou, quem sabe... — Lorenzo sorriu de lado — você admite logo que ele cutuca alguma coisa aí dentro.
— Lorenzo.
— Você ficou vermelha, sabe disso?
— Eu estou com raiva.
— Tá. Fica com raiva, então. Mas olha nos meus olhos e diz que não sente nada quando ele te olha daquele jeito.
Ela não respondeu.
Porque não podia.
Porque, por mais que quisesse negar... a resposta queimava por dentro.
Mais tarde naquela noite, Sienna estava na biblioteca da Villa, tentando focar em um livro qualquer. Mas, ao ouvir passos se aproximando, sua mandíbula travou. Já sabia quem era.
Nicolás entrou em silêncio, como se o lugar fosse dele. Como se a casa fosse dele.
— Você se perdeu ou tá me seguindo? — ela perguntou sem desviar os olhos da página.
— Só vim pegar um livro. Mas parece que a biblioteca tem... surpresas.
Ele se aproximou devagar, até estar perto o suficiente para que ela sentisse o calor do corpo dele atrás de si. Fingiu folhear a estante. Ela permaneceu imóvel.
— Você sempre trata todos os convidados da sua família assim?
— Só os que têm essa cara de “não sou confiável”.
Ele se virou, encostando as costas na estante, agora de frente para ela.
— Você realmente me odeia, Sienna?
Ela finalmente ergueu o olhar. Os olhos dele estavam calmos. Observadores. Perigosos.
— Eu só não confio em você. Tem algo no seu jeito... que grita segredo.
— E isso te incomoda?
Ela hesitou por um segundo.
— Me intriga. E isso me irrita.
Um leve sorriso apareceu nos lábios dele.
— Então estamos progredindo.
Sienna fechou o livro com força e se levantou.
— Nicolás...
— Hm?
— Eu não gosto de você aqui.
— Ainda assim, aqui estou. E, curiosamente... você também continua aqui.
Eles se encararam por um longo momento, em silêncio. Uma linha tênue entre a provocação e algo mais.
Algo que nem os dois estavam prontos para nomear.
Ainda.
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Atualizado até capítulo 60
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