O silêncio entre eles se tornara norma.
Naquela manhã, Levi não disse sequer "bom dia". Saiu cedo, com os passos apressados e o rosto sério, sem olhar para trás.
Aurora nem se deu ao trabalho de perguntar onde ele ia. Já sabia. Yasmin.
Ela tomava o café sozinha agora, todos os dias. Sentava-se à mesa ainda posta para dois, por hábito, mas o outro prato permanecia intocado. As flores murcharam. O vinho na prateleira não foi aberto. E o vestido de noiva, cuidadosamente pendurado dias atrás, agora parecia zombar dela toda vez que entrava no quarto.
A lista de convidados? Jogada no lixo.
Os convites? Fechados em uma gaveta.
Os sonhos? Silenciados.
Ela não chorava mais. Não porque não doesse. Mas porque já tinha chorado tudo o que podia. Agora, sentia apenas um vazio constante. Um buraco dentro do peito que nem raiva preenchia mais.
Foi durante esse silêncio que o telefone tocou.
Era Verônica, a mulher que cuidava dos assuntos burocráticos da família que a criara. Não era mãe, nem tia — apenas alguém encarregada de manter as aparências.
— Precisamos que você venha até a casa da família, Aurora. É importante.
Ela hesitou. Aquela casa, com seus tapetes caros e corações vazios, nunca fora lar. Mas algo na voz firme de Verônica a fez sair de casa. Talvez fosse bom sair da cova que Levi transformara o apartamento.
A mansão estava igual. Fria. Elegante. Vazia de qualquer afeto.
Aurora foi recebida no saguão como uma visita inconveniente. Nenhum abraço. Nenhum sorriso. Apenas olhares de julgamento e um toque impessoal no ombro.
Na sala principal, estavam os patriarcas, a filha biológica — recém reencontrada após anos de desaparecimento — e um advogado de expressão tensa. Aurora entendeu imediatamente que não era bem-vinda. Nunca fora. E agora, não passava de um peso que precisavam se livrar com "graça".
A proposta foi feita com frieza.
— O casamento com a família Ferraz não será desfeito — disse o advogado. — A herdeira da casa não será enviada para viver com um homem em coma. Mas o acordo precisa ser mantido. E a única forma de resolver isso… é substituindo a noiva.
Aurora encarou todos à sua frente.
— E vocês querem que eu me case com ele.
— Sim. Você sempre esteve aqui para esse tipo de função. E, de certa forma, é a sua chance de mostrar gratidão. Recebeu teto, estudo, alimentação...
Aquelas palavras a cortaram com precisão cirúrgica.
Ela pensou em recusar. Por instinto. Mas havia perdido tudo. A casa onde morava já não era um lar. O homem que dizia amá-la havia se tornado um estranho. E as poucas amizades que ainda restavam estavam distantes demais para serem apoio.
Aceitar aquele casamento não era uma escolha. Era a única porta que não estava trancada.
Mas, desta vez, ela não iria para lá como vítima.
— Quando?
—Em 3 dias. Você irá morar na mansão Ferraz antes do casamento. Eles querem conhecê-la, ao menos formalmente. — O advogado cruzou os braços. — Seu casamento será em três semanas.
No dia seguinte, Aurora voltou ao apartamento pela última vez. Levi estava em casa, mexendo no celular, com o olhar distante. Quando a viu entrar, arqueou as sobrancelhas, surpreso.
— Você tá bem? Achei que não voltaria tão cedo — comentou ele, sem levantar do sofá.
Aurora respirou fundo. Trazia consigo uma mala pequena e uma serenidade desconcertante.
— Vim buscar minhas coisas… e encerrar o que sobrou de nós.
Levi largou o celular sobre a mesinha.
— Como assim? Você tá exagerando, Aurora. Você sempre dramatiza tudo quando está magoada. É só uma fase.
Ela permaneceu firme.
— Não é drama, Levi. É o fim. Eu não sou mais a mulher com quem você quer casar. Você deixou isso claro quando passou a viver ao redor de outra pessoa… enquanto eu definhava aqui dentro.
— Você não entende. Yasmin está morrendo!
— E eu morri aqui dentro, Levi. Todos os dias em que você saiu e não voltou. Cada vez que escolheu ela ao invés de mim. E você nem percebeu.
Ele se levantou, irritado.
— Você tá sendo irracional! Acha mesmo que vai sair por aquela porta e tudo vai se resolver? Que é só virar as costas pra mim e pronto?
— Não, Levi. Nada vai se resolver. Mas pelo menos eu paro de sangrar sozinha.
Ele tentou tocá-la, segurá-la pelo braço.
— Aurora, olha pra mim. Você tá cometendo um erro. Você é minha noiva!
Ela recuou.
— Eu era sua noiva. Agora, sou só alguém que sobreviveu ao seu descaso.
E, sem mais palavras, Aurora virou as costas e saiu.
Dessa vez, não chorou. Porque toda lágrima que existia já havia secado dentro dela.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 72
Comments
bete 💗
que homem inescrupuloso ❤️❤️❤️❤️❤️
2025-07-15
1