O silêncio começou aos poucos.
Primeiro, foi uma resposta mais curta.
Depois, um toque que não veio.
Em seguida, um beijo esquecido na saída para o trabalho.
Até que, sem perceber, Aurora passou a dormir ao lado de um homem que parecia cada vez mais distante.
Levi já não fazia questão de jantar em casa. As reuniões se tornaram frequentes, as desculpas, vagas. E o telefone dele, que sempre ficava largado na mesa ou no sofá, agora estava sempre no bolso ou virado para baixo. Sempre em modo silencioso.
Aurora tentou não ver maldade. Tentou acreditar no cansaço. Na pressão do trabalho. No estresse com os fornecedores do casamento. Mas no fundo, algo dentro dela sabia. Algo gritava, ainda que em silêncio.
Era como se a presença dela passasse a incomodar. Como se o amor tivesse sido engolido por algo invisível — e cruel.
Foi em uma quarta-feira à noite que tudo começou a se tornar mais claro. Aurora chegou em casa mais cedo, com a intenção de preparar um jantar especial. Pensou em criar uma noite tranquila, a dois. A comida preferida dele, vinho tinto, música suave ao fundo. Vestiu o vestido azul de alças finas, aquele que ele costumava elogiar com um olhar faminto. Prendeu o cabelo em um coque despretensioso e acendeu as velas da mesa. Tudo como nos velhos tempos.
Mas ele não apareceu.
O relógio passou das oito. Depois das nove. Às dez, Aurora ligou. A ligação caiu na caixa postal. Enviou mensagem. Sem resposta.
Ela esperou sentada à mesa, sozinha, olhando para o prato frio e o vinho que não fora aberto. A vela foi consumida lentamente, como o último resquício de esperança.
Às onze da noite, Levi finalmente entrou pela porta, com os olhos baixos e os passos hesitantes.
— Aurora... Eu... — começou ele, mas parou ao ver a mesa posta, a vela já apagada, a comida intocada.
Ela não disse nada.
Ele suspirou, largando as chaves e a mochila em cima do sofá.
— Me desculpa. Tive que sair. Um… um imprevisto.
— Com Yasmin?
O nome saiu baixo, mas firme. Não era uma pergunta. Era uma constatação. Ela já sabia. Não precisava que ele confirmasse.
Levi hesitou. Sentou-se na poltrona, como se o corpo pesasse mais do que devia.
— Ela voltou… e está doente, Aurora. Muito doente.
Ela o encarou, sem mover um músculo.
— E isso justifica desaparecer? Me ignorar? Voltar pra casa como se nada estivesse acontecendo?
— Eu não estou te ignorando. Eu só… não sei como lidar com isso. Ela me procurou chorando. Disse que está em fase terminal. Câncer. Disse que só queria ter paz… E que se arrepende de tudo. Ela só quer se despedir do mundo em paz.
Aurora manteve a voz calma, mas os olhos estavam marejados.
— E por isso você desaparece? Por isso você me deixa sozinha esperando? Por isso você não toca mais em mim?
Levi abaixou a cabeça.
— Ela está morrendo, Aurora. Eu não posso simplesmente virar as costas. Ela… ela foi uma parte importante da minha vida.
— E eu sou o quê? Uma nota de rodapé?
— Claro que não! Mas você precisa entender. Eu não a amo mais, eu só sinto pena. Compaixão. Eu jamais trocaria você por ela. Eu estou com você.
Mas nenhuma palavra que ele dizia encontrava verdade nos olhos.
Aurora o observou por um longo momento. O homem à sua frente não era mais o mesmo. O Levi que prometeu o mundo agora era um estranho que carregava culpa demais para ver o que estava perdendo.
E isso era só o começo.
Nos dias seguintes, Levi passou a sair com frequência. Ele dizia que era para acompanhar Yasmin nas consultas, ajudá-la com exames, estar presente porque ela não tinha ninguém.
Aurora, inicialmente, tentou compreender. Ela sabia o que era não ter ninguém. Sabia como doía ser deixada de lado. Mas o que Levi fazia ia além de um gesto de compaixão.
Ele começou a levar flores para Yasmin — as mesmas lavandas que antes dava para Aurora.
Levou comidas que Aurora preparava, agora cozinhadas por ele.
E, finalmente, passou a usar as ideias que os dois haviam planejado juntos para o próprio casamento… com Yasmin.
Tudo veio à tona quando Aurora viu, por acaso, o celular de Levi destravado sobre o sofá. Ela não era do tipo que mexia, nunca foi. Mas naquela noite, algo a puxou. Algo que precisava de respostas.
E ali estavam elas.
Mensagens de carinho. Fotos de locais de casamento. Provas de bolo. Decoração.
Tudo. Absolutamente tudo o que fora sonhado com ela... agora compartilhado com Yasmin.
A garganta de Aurora se fechou. Ela não conseguia respirar. Aquilo não era mais compaixão. Era traição.
Era perverso.
Naquela noite, ela não chorou. Não gritou. Apenas deitou ao lado dele, como quem dorme com um estranho. Como quem se despede em silêncio.
O dia seguinte foi a gota.
Levi a esperava na sala, de braços cruzados.
— Yasmin está se sentindo muito mal. Disse que está com medo de morrer cheia de mágoas. Ela… ela quer pedir desculpas a você. Mas para isso, você precisa… ir até lá.
Aurora o encarou, perplexa.
— Você quer que eu vá até ela?
— Sim. Ela quer pedir perdão. Mas… quer que você peça perdão também. Por tê-la ofendido nas mensagens que mandou quando ela voltou.
Aurora sentiu a pressão no peito.
— Eu nunca mandei mensagem nenhuma, Levi. Nunca.
— Yasmin disse que foi você. E eu acredito nela.
Ali, Aurora entendeu. Ele já não a via. Já não a ouvia. Ele não a reconhecia mais.
— Você quer que eu me ajoelhe diante da mulher que destruiu tudo o que eu tinha com você?
Levi respirou fundo, como quem dá uma última chance:
— Eu só estou tentando dar paz a alguém que está morrendo. Seja humana, Aurora. Só isso.
Ela o olhou, e por um instante, tudo o que um dia sentiu se partiu em mil pedaços.
— E quem vai dar paz a mim?
Ele não respondeu.
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Atualizado até capítulo 72
Comments
bete 💗
quando ele vê que não tem nada
se arrependerá será tarde
❤️❤️❤️❤️❤️
2025-07-15
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Any Carvalho
ah manda esse nojento se catar.
2025-07-17
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Lorrainecristinioliveira Oliveira
Levi quando perder não adianta chorar
2025-07-15
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