#4

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...Isabelly ...

Acordei como se tivesse levado uma surra.

Literalmente.

Cada músculo do meu corpo doía como se estivesse gritando “por que você fez isso com a gente, Isabelly?”. Meu pescoço estalou quando tentei virar pro lado. Os braços estavam pesados, as pernas? Um desastre. Até meu dedo mindinho parecia participar da vingança coletiva.

— Se isso é empoderamento feminino, quero meu reembolso — murmurei, a voz rouca, encarando o teto como se ele fosse me dar uma explicação.

Sentei na cama com dificuldade. Fiz uma careta digna de novela mexicana e me arrastei até o espelho do banheiro.

Ali estava eu.

Cabelo bagunçado, olheiras marcadas, e a velha cicatriz ainda discreta no canto das costelas, revelada pela blusa levantada. Por muito tempo, aquele corte foi motivo de vergonha. Mas agora… parecia mais um lembrete.

Um lembrete de que eu não estava mais ali.

Que eu não era mais a mulher que apanhava em silêncio e fingia estar tudo bem.

Que ontem, pela primeira vez em muito tempo, eu tinha batido de volta — mesmo que fosse só num saco de pancadas.

Sorri de leve. Um daqueles sorrisos que você solta quando percebe que ainda tem alguma coisa viva dentro de você.

Peguei o celular.

“Aviso de utilidade pública: estou morrendo. Mas sorrindo.”

Marina respondeu em menos de um minuto.

“Parabéns! É oficial: você sobreviveu à primeira aula. Isso já vale um pão de queijo e uma massagem do seu professor deus grego.”

Revirei os olhos. E ri.

A verdade é que Marina tinha um dom especial de colocar leveza até nas minhas tempestades. E sim, ela tinha razão: Lian era um deus grego. Mas um deus com cara fechada e um controle emocional que irritava.

Fui tomar banho devagar. Água morna, shampoo com cheiro de baunilha, um pouco de silêncio. No fundo, uma parte de mim queria que o dia de treino chegasse logo. Outra queria um atestado médico.

Me troquei com mais cuidado do que o normal. Jeans confortável, blusa branca, tênis e um rímel básico — não por ninguém. Por mim. Porque depois de tanto tempo, me arrumar não era mais fingimento. Era afirmação.

Fiz uma trança embutida rápida — minha marca registrada nos dias em que precisava parecer no controle, mesmo que estivesse me desmontando por dentro.

Desci para trabalhar. O café estava cheio como sempre, o cheiro de pão na chapa e café recém-passado me abraçou logo na entrada. Cumprimentei os colegas, amarrei o avental e entrei no ritmo.

Mas a verdade é que hoje, até servir um cappuccino parecia diferente.

É engraçado como, quando você começa a se reconstruir por dentro, o mundo lá fora também parece um pouco mais... gentil. Ou talvez a gente só pare de aceitar migalhas e comece a reparar nas coisas boas que estavam ali o tempo todo.

— Tá com cara de quem dormiu em cima de uma britadeira — disse Vivi, uma das atendentes mais antigas, me entregando a bandeja com três sucos.

— Dormi em cima de mim mesma depois de tentar dar soco em ar, Vivi. Tô treinando defesa pessoal.

— Ihhh, vai virar ninja agora?

— Só se for ninja de meia-calça e cólica — respondi, rindo.

O turno passou rápido. Entre uma mesa e outra, eu me pegava lembrando dos movimentos de ontem, da postura, da forma como Lian corrigiu meu ombro com tanta firmeza, mas tanto cuidado ao mesmo tempo.

Lembrei também do jeito como ele me olhou quando eu finalmente acertei o soco.

Aquele quase-sorriso dele valeu mais que mil palmas.

Às duas da tarde, troquei de roupa no banheiro do café. A legging escura, top firme, camiseta soltinha. Prendi o cabelo de novo. Joguei um pouco de água no rosto. Me olhei no espelho.

— Vamos de novo — falei baixinho. — E dessa vez, sem medo.

Saí do banheiro com a sensação de que algo estava mudando. Não só no meu corpo, mas em tudo ao meu redor. Como se o universo estivesse esperando que eu dissesse “sim” pra mim mesma pra começar a colaborar.

E eu disse.

Peguei minha garrafinha, ajeitei a bolsa no ombro e caminhei até a porta.

Hora da segunda aula.

Hora de me reencontrar mais um pouco.

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