Capítulo 5: O Resgate de Elen e a Transformação
Charlotte irrompeu para fora do apartamento de Ethan, o coração pulsando como um tambor descompassado contra suas costelas, uma torrente incontrolável de fúria e pânico empurrando-a adiante. Cada passo apressado ecoava em sua mente a imagem vívida do olhar de Ethan – aquele lampejo frio e autoritário –, a ordem quase sussurrada sobre as reuniões cruciais e a exigência de uma roupa “adequada”. Aquela imposição, vinda de alguém que raramente se importava com sua vestimenta, era um golpe inesperado. Ela não tinha um segundo a perder. A primeira reunião, implacável, estava marcada para as nove, e ela estava absurdamente despreparada, vestindo as roupas confortáveis de sempre, que agora pareciam um uniforme de rebeldia involuntária.
Assim que a porta do táxi se fechou atrás dela, a mão de Charlotte já estava no telefone, os dedos digitando freneticamente o número. A primeira e única pessoa que veio à sua mente, um farol de esperança em meio ao caos, foi Elen, sua melhor amiga. Elen não era apenas a personificação da elegância e do estilo impecável; ela era a maga capaz de desvendar qualquer crise de moda, qualquer dilema estético. Como produtora de moda autônoma, Elen possuía um olhar clínico para o belo, e, mais importante, ela sempre soube como realçar a beleza de Charlotte, mesmo quando Charlotte, por teimosia ou insegurança, insistia em se esconder por trás de roupas largas e óculos que camuflavam seu rosto.
“Elen, preciso de você. Agora. É uma emergência de moda,” Charlotte disparou, sem preâmbulos, no instante em que a amiga atendeu. A voz, traindo seu desespero, saiu mais aguda e urgente do que ela pretendia. Ela podia sentir o nervosismo roer suas entranhas.
Do outro lado da linha, Elen, ainda envolta em um véu de sono, soltou um bocejo longo e audível. “Charlotte? O que diabos aconteceu? Que horas são? Por que você está tão… histérica?” Havia uma mistura de preocupação e diversão na voz sonolenta da amiga.
“Não importa as horas, Elen! Não importa nada além do que preciso resolver!” Charlotte respondeu, a voz quase um grito abafado. “Estou indo para o seu apartamento agora! Dá tempo de me arrumar em uma hora e meia para a minha reunião, certo? Preciso estar... apresentável. E o Ethan me obrigou a ir! Ele nunca foi de exigir isso, nunca mesmo, mas hoje... hoje foi diferente. Quando eu chegar aí, juro que te conto cada detalhe sórdido dessa história.” Charlotte explicava, as palavras tropeçando umas nas outras, sua respiração ofegante mal acompanhando o ritmo frenético de sua mente.
A viagem de táxi pareceu uma eternidade, mas finalmente, Charlotte chegou ao refúgio seguro que era o apartamento de Elen. O cheiro de café fresco já pairava no ar, um convite ao conforto. Elen, mesmo sem ter acordado completamente, já havia preparado duas xícaras fumegantes. Acomodaram-se no sofá macio da sala, e Charlotte, com o calor da caneca aquecendo suas mãos, deixou que o turbilhão de emoções viesse à tona. O desabafo era urgente, uma necessidade primária.
“Eu não sei o que me deu, Elen. Juro que não sei,” Charlotte começou, a voz embargada pela raiva e pelo constrangimento. “Foi seu conselho, Elen! Você sempre me dizendo para eu viver a vida, para aproveitar cada segundo porque eu só tenho 24 anos uma vez na vida... Aí, eu, na minha mais pura ingenuidade e seguindo seus conselhos ‘inspiradores’, mandei aquela foto ‘ousada’ para o carinha da balada... mas no final das contas, Elen, no final das contas, eu mandei pro meu chefe, Ethan.” Ela balançou a cabeça, uma risada nervosa e uma pontada de revolta misturadas em seu semblante. “Se não fosse você com essa ideia maluca de ‘aproveitar a vida’, nada disso teria acontecido! Eu estaria na minha rotina segura, com minhas roupas largas e meus óculos, invisível para o mundo e para o Ethan!”
Elen, que ouvia com os olhos arregalados e uma mão cobrindo a boca para abafar a surpresa, finalmente explodiu em uma gargalhada genuína, sacudindo a cabeça. “Ah, Charlotte... Você é inacreditável! Eu só quis te ajudar a se soltar um pouco, a aproveitar a vida e a mostrar a mulher linda que você é! Quem diria que o universo teria um senso de humor tão peculiar? Mas olha só o resultado! Você tem que admitir que essa situação toda tá mais do que peculiar, tá digna de um roteiro de comédia romântica, com um toque de drama, claro.”
Charlotte suspirou, um sorriso cansado, mas que lentamente se expandia, surgindo em seu rosto. “Cinematográfica, é? Eu diria que é um filme de suspense com uma pitada generosa de comédia trágica. E eu sou a protagonista que não sabe o que fazer na cena do clímax.”
Elen ergueu uma sobrancelha, um brilho divertido nos olhos. "E o Henrique? Você pelo menos respondeu a ele? Porque até onde eu sei, a foto era pra ele, né?"
Charlotte balançou a mão, descartando. "Nem tive cabeça pra isso, Elen. Depois de tudo, ele foi a última das minhas preocupações. Meu mundo virou de cabeça pra baixo. Mas isso não importa agora. O que importa é que eu tenho uma hora e meia para ficar apresentável, ou o meu chefe... o Ethan, vai me devorar viva!"
“Pois vai lá, menina, e mostra essa história para todo mundo! Mostra para o mundo quem você é, de verdade, e quem sabe, essa bagunça toda não se transforma em algo incrível?” Elen disse, já se levantando do sofá, a energia de produtora de moda acionada. Seus olhos percorriam o guarda-roupa de Charlotte em sua mente, já traçando um plano de ataque. “Agora, vamos resolver o que você vai vestir para essa reunião com o chefe que, pelo visto, virou interesse amoroso/chefia maluca e confusa. Porque, pelo que você me contou, a coisa está mais para uma mistura explosiva do que para uma simples reunião de negócios.” Elen brincou, com um brilho divertido nos olhos, já se dirigindo ao quarto para vasculhar as opções de vestuário.
Charlotte olhou para a amiga com uma mistura de gratidão profunda e um medo velado do que estava por vir. “Por favor... Elen, pelo amor de Deus... me salva. Salva a minha carreira, salva a minha dignidade, salva a minha vida.”
Elen sorriu confiante, um brilho de determinação em seus olhos. “Pode deixar comigo, gata. Você está em boas mãos. E saiba que você não precisa de salvação, você só precisa de um empurrãozinho para mostrar ao mundo a mulher incrível que você já é.”
Em uma corrida frenética contra o relógio, o quarto de Elen se transformou em um campo de batalha de tecidos e cores. Charlotte, com a ajuda incansável da amiga, começou a experimentar diversas combinações. A intenção não era promover uma transformação radical que a tornasse irreconhecível, mas sim uma metamorfose sutil, capaz de transmitir uma imagem de profissionalismo e cuidado, sem, no entanto, apagar a essência de Charlotte. Ela escolheu peças um pouco mais alinhadas e discretas, tecidos que caíam melhor, longe do visual desleixado e excessivamente confortável que costumava usar no dia a dia. Era um desafio pessoal: parecer madura e responsável, mas ainda assim, autêntica. O blazer escolhido era de um tom neutro, com um corte elegante, e a blusa por baixo, de um tecido macio, tinha uma cor que realçava seu tom de pele.
Enquanto Charlotte se trocava, Elen, com uma agilidade e precisão impressionantes, dignas de um artista preparando sua obra, começou a trabalhar no cabelo e maquiagem da amiga. Ela prendeu o cabelo de Charlotte em um coque baixo e simples, que, paradoxalmente, trazia uma elegância natural e deixava o rosto de Charlotte mais aberto e emoldurado, revelando traços que a própria Charlotte muitas vezes escondia. Em seguida, aplicou uma maquiagem leve, focada em disfarçar as olheiras que a noite mal dormida havia deixado e em dar um ar mais descansado e apresentável. Um toque de corretivo, um blush suave, um rímel que alongava os cílios e um batom discreto, mas que realçava o contorno dos lábios. O objetivo não era transformar Charlotte em outra pessoa, mas sim realçar sua beleza natural, dando-lhe um ar de frescor e vivacidade.
Quando Charlotte, hesitante, colocou as lentes de contato, o efeito foi quase imediato. Seus olhos, antes parcialmente ocultos pelas armações dos óculos, agora brilhavam com uma nova intensidade, parecendo um pouco mais despertos e confiantes. Mas ainda era a mesma garota que Elen conhecia e amava — a mesma alma vibrante e, por vezes, atrapalhada, só que agora com um toque inegável de cuidado e um brilho renovado. Ela se olhou no espelho, e pela primeira vez em muito tempo, não viu apenas a Charlotte "desarrumada", mas a Charlotte que podia, sim, ser profissional e elegante.
“Tá bom, não virei outra pessoa, não me reconheço como uma supermodelo, mas estou definitivamente menos ‘desarrumada’ do que o normal,” Charlotte brincou, um sorriso genuíno se abrindo em seu rosto enquanto ela se observava no espelho, admirando o trabalho da amiga. Havia um quê de surpresa em sua própria imagem.
Elen riu, batendo levemente no ombro de Charlotte. “Isso já é um avanço e tanto, minha querida. Um avanço gigantesco! Agora vai lá, arrasa e mostra para o Ethan, e para o mundo, que profissionalismo não tem só a ver com a roupa que se veste, mas com a postura, a confiança e a inteligência que você carrega. E você, Charlotte, você tem tudo isso e muito mais para ajudá-los a alcançar o sucesso.”
Charlotte assentiu, sentindo uma nova onda de determinação percorrer cada fibra de seu ser. Uma chama, antes adormecida, acendia-se em seu interior. Pegou sua bolsa, que Elen havia organizado com os itens essenciais, e olhou para o relógio de pulso. Faltavam apenas quinze minutos para as nove. Era hora de enfrentar Ethan Monteiro novamente. Era hora de mostrar que a Charlotte da foto era também a Charlotte profissional.
O táxi deslizou com suavidade pelas movimentadas ruas de Manhattan, e o coração de Charlotte batia acelerado, mas não apenas pela ansiedade familiar. Havia uma nova sensação, um pressentimento de que aquele dia poderia ser um divisor de águas, um ponto de virada em sua vida. A cada quarteirão que o carro vencia, a insegurança diminuía e a convicção de que ela estava no caminho certo crescia. Ela chegou ao local da reunião com surpreendentes dez minutos de antecedência — um tempo raro para Charlotte, que, em seu ritmo habitual, costumava ser sempre a última a chegar a qualquer compromisso. Era um pequeno triunfo pessoal.
Respirou fundo, sentindo o ar fresco da manhã, e ajustou o blazer, sentindo o tecido firme sobre os ombros, uma espécie de armadura. Com um misto de nervosismo e uma crescente audácia, ela empurrou a porta de vidro e entrou no imponente prédio comercial.
No saguão espaçoso, os seguranças, acostumados à rotina de executivos e engravatados, a olharam com um misto de curiosidade e, para a surpresa de Charlotte, respeito. Aquele reconhecimento em seus olhares a fez sentir um calor de orgulho crescente dentro dela. Ela tinha se arrumado, sim, mas o que realmente importava, percebeu, era a postura ereta, a confiança recém-descoberta e a determinação que ela carregava agora. Não era apenas a roupa; era a mulher que a vestia.
Subiu para a sala de reuniões, seus passos mais firmes do que o usual, e se acomodou discretamente em uma das cadeiras de couro, escolhendo um lugar onde pudesse observar e ser observada, mas sem parecer excessivamente ansiosa. Pouco a pouco, os outros participantes, homens de negócios experientes que acompanhavam Ethan, começaram a chegar, seus olhares curiosos e sorrisos, por vezes, um tanto forçados, ao vê-la Ali. Charlotte podia sentir o burburinho de pensamentos não ditos, a surpresa em seus rostos.
Charlotte cruzou os braços sobre o peito, o queixo ligeiramente erguido, um pequeno gesto de desafio e autoconfiança. Ela estava pronta. Pronta para mostrar que, mesmo com toda a tensão e o constrangimento da noite passada, ela continuava sendo a profissional competente e indispensável que Ethan precisava para sua equipe — e, talvez, percebesse, muito mais do que isso. O palco estava montado.
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Atualizado até capítulo 50
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