O Lugar Perfeito

Capítulo 3

O céu de Mariny amanheceu limpo, com tons de azul pálido escondidos entre nuvens preguiçosas. A neve, ainda recente, repousava sobre os telhados como um cobertor fino e branco. O frio era cortante, mas Herleny se sentia estranhamente aquecida por dentro.

Vestiu o casaco grosso que havia ganhado de Dona Iolanda, prendeu o cabelo em um coque leve e calçou as botas. Aquela manhã seria diferente. Não queria apenas andar… queria sentir. Ver com os próprios olhos o lugar onde deixaria sua marca, onde realizaria o sonho que carregava desde menina: um restaurante com alma.

As ruas da cidade estavam silenciosas, com poucos moradores circulando. Alguns acenavam com gentileza, curiosos com a nova presença feminina. A pequena padaria exalava cheiro de pão fresco, e uma floricultura do outro lado da rua vendia galhos secos com fitas natalinas — tradição da região.

Herleny caminhava com passos lentos, observando as vitrines, o desenho das janelas antigas, os detalhes das portas. A cidade parecia saída de um livro. Tudo era simples, mas havia beleza em cada canto. Um charme frio, delicado, quase mágico.

Dobrou uma esquina e entrou numa rua de paralelepípedo, onde uma praça se abria, como um segredo guardado no coração de Mariny.

Parou por instinto.

Ali estava.

A praça.

Era ampla, com bancos de madeira envelhecidos, árvores altas cobertas de neve e um coreto ao centro, onde sinos pendurados dançavam ao vento. Ao redor, algumas lojas fechadas e um prédio antigo, de fachada de madeira escura, com uma vitrine ampla e delicada.

Herleny sentiu o coração bater mais forte.

Aquele lugar… era como se estivesse esperando por ela.

Aproximou-se devagar. O prédio estava desocupado. A madeira desgastada contava histórias de outros tempos, mas as janelas grandes e o teto inclinado em duas águas mostravam potencial. O local tinha personalidade, charme e silêncio. Era como ela.

Ela colou as mãos enluvadas no vidro da porta. Lá dentro, um salão amplo, com piso de madeira clara e uma escada que levava a um pequeno mezanino. A cozinha ao fundo era simples, mas com espaço suficiente para criar o que sua mente sonhadora já estava começando a visualizar.

Fechou os olhos.

Imaginou mesas com toalhas brancas e pequenos arranjos florais no centro.

Imaginou o cheiro de pão saindo do forno, o som dos talheres, o riso dos clientes.

Imaginou um prato servido com carinho. Um vinho tinto encorpado. Uma lareira acesa ao lado da janela, e neve lá fora.

Era ali.

Sem dúvida alguma.

— “Mesa do Céu.” — sussurrou para si mesma, como quem nomeia algo sagrado.

Ficou parada por vários minutos, apenas sonhando em pé, diante daquilo que agora se tornava uma missão. Estava emocionada. Aquilo não era apenas um prédio. Era o lar da sua liberdade.

Anotou o endereço em seu caderninho de capa azul, e em seguida, seguiu caminhando pelas redondezas, tentando descobrir mais sobre o espaço. Perguntou discretamente a alguns moradores se o prédio estava à venda ou para aluguel. Ninguém soube dizer ao certo, mas todos pareciam felizes com a ideia de ver o local renascer.

— Há muito tempo ninguém usa aquele café. Já foi famoso por aqui — contou uma senhora na quitanda. — Mas fechou depois de um incêndio pequeno. Desde então, ficou parado no tempo.

Herleny agradeceu com um sorriso discreto. Guardava cada informação como se fossem ingredientes raros para sua receita mais importante.

No caminho de volta, entrou numa papelaria e comprou um mapa simples da cidade. Marcou com caneta vermelha o local da praça. Depois, numa cafeteria aconchegante, sentou-se e pediu um chá de maçã com canela. Aconchegou-se perto da janela e abriu seu caderno de receitas.

Começou a rabiscar.

Escreveu:

Menu de boas-vindas — Inauguração do Mesa do Céu

• Entrada: Creme de alho assado com azeite trufado e pão de ervas.

• Prato principal: Peito de frango recheado com queijo de cabra e damascos, ao molho de vinho branco.

• Sobremesa: Torta de frutas vermelhas com chantilly fresco e toque de lavanda.

Ao lado, desenhou pequenos detalhes: copos simples, velas baixas, cortinas brancas, guardanapos dobrados com flor seca no centro. Tudo com delicadeza e identidade.

Mais do que um restaurante, Herleny queria criar um refúgio. Um espaço onde as pessoas pudessem se sentir amadas, acolhidas, alimentadas em todos os sentidos.

Já era final de tarde quando voltou ao chalé. Estava exausta, mas animada. Acendeu a lareira, preparou uma sopa leve com legumes e anotou mais ideias no diário.

“Hoje, encontrei o lugar onde meu sonho vai morar. Ele estava ali, quieto, esperando por mim. Assim como eu estive a vida inteira esperando por ele.”

Antes de dormir, fez uma oração curta. Não mais pedindo forças para suportar o que faltava, mas agradecendo pela coragem de começar.

No silêncio do quarto aquecido, Herleny dormiu com um leve sorriso nos lábios. Pela primeira vez em muitos anos, não sonhou com o passado.

Sonhou com o futuro.

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