Capítulo 2 — Mikhiul
O inverno em Mariny parecia não ter fim. A cidade, encravada nas montanhas nevadas, vivia em constante silêncio, como se até o tempo tivesse medo de despertar antigas lembranças.
Mikhiul Valente observava a neve cair pela janela de seu gabinete na prefeitura. Estava ali, como sempre, sozinho. Tinha a postura impecável de um homem de comando: terno escuro, cabelo penteado com perfeição e expressão dura, quase inquebrável. Mas por dentro... por dentro, ele era uma avalanche prestes a desmoronar.
Fazia sete anos desde que ele perdera tudo o que acreditava. Sete anos desde que entregara o coração a uma mulher que só o quis por conveniência. Uma aliança quebrada, uma traição dolorosa, um nome que ele se proibiu de repetir.
Depois disso, Mikhiul aprendeu a viver no automático.
— O amor não existe. — repetia para si como um mantra.
Desde então, amar se tornou uma ameaça. Confiar, um erro. E sonhar… um luxo que ele não podia mais se permitir.
O trabalho se tornou seu refúgio. Como prefeito de Mariny, era respeitado por todos, mas íntimo de ninguém. Nem mesmo do próprio irmão, o padre local. As reuniões, decisões políticas e cobranças o mantinham ocupado. E, para ele, estar ocupado era uma forma de evitar o vazio.
Naquela manhã, a secretária bateu à porta com delicadeza.
— Senhor Valente… chegou uma nova moradora à cidade. — disse ela, entregando uma ficha simples. — Ela alugou o chalé da dona Iolanda. Diz que vai abrir um restaurante.
Mikhiul arqueou a sobrancelha com leve desinteresse.
— Outro restaurante? No inverno? — murmurou, sem desviar os olhos da paisagem lá fora.
— É o que parece. O nome dela é Herleny Duarte. Ela veio de Lisboa… e, segundo comentam, viveu por anos em um convento.
Dessa vez, ele se virou devagar.
— Uma freira?
A secretária assentiu, com um sorrisinho discreto.
— Ex-freira, ao que tudo indica.
Mikhiul pegou a ficha nas mãos, lendo com os olhos semicerrados. O nome não lhe dizia nada, mas algo naquela informação lhe provocou um incômodo estranho. Não era comum alguém deixar a vida religiosa para vir abrir um restaurante numa cidadezinha esquecida entre as montanhas.
— E o que ela pretende abrir? Um buffet de missa? — ironizou, lançando a ficha sobre a mesa.
A secretária riu, desconcertada, mas ele logo voltou ao seu silêncio habitual. A conversa morreu ali.
No entanto, a imagem daquela mulher — uma ex-freira, vinda de tão longe, decidida a começar do zero em pleno inverno — não saiu mais da cabeça dele. Não que estivesse interessado. Claro que não. Mas ele conhecia muito bem o tipo de gente que aparecia em Mariny buscando recomeço: sonhadores ingênuos ou farsantes disfarçados de boas intenções.
Mais tarde, ao sair do gabinete, Mikhiul cruzou a praça central. A neve cobria tudo de branco, e as luzes de Natal começavam a ser instaladas pelos moradores mais animados. Ele caminhava com passos firmes, como sempre, mas com o olhar distante. Estava cansado. Não do trabalho — mas da solidão disfarçada de rotina.
Passou em frente ao antigo café abandonado, um imóvel que já tinha cogitado demolir algumas vezes. Para sua surpresa, viu uma figura feminina do outro lado da vitrine, medindo o espaço com fita métrica nas mãos. Cabelos soltos, cachecol apertado no pescoço, botas surradas e uma expressão de encantamento no rosto. Era ela.
Herleny.
Ele parou por um breve instante. Não que estivesse curioso — ou ao menos era isso que tentava convencer a si mesmo. Mas havia algo naquele momento que o fez ficar imóvel: ela sorria sozinha.
Um sorriso verdadeiro. Quase infantil. Como se aquele espaço vazio fosse o castelo de seus sonhos.
Mikhiul franziu o cenho, desconcertado com sua própria reação. Estava irritado. E ele sabia: quando sentia raiva sem saber o motivo, era porque alguma parte dele estava sendo tocada onde não devia.
Atravessou a praça sem se deixar ver. Voltou para casa antes do horário de sempre, entrou no casarão gelado e silencioso onde morava sozinho, e acendeu a lareira. Olhou ao redor. Sala impecável, biblioteca em ordem, copo de uísque na mão. Tudo no lugar. Tudo... vazio.
Sentou-se e encarou o fogo.
“Por que uma mulher como ela viria parar aqui?”, pensou.
"Por que alguém largaria a segurança do hábito, da fé... para cozinhar?"
A resposta surgiu como um sussurro incômodo: talvez porque ela também estivesse tentando fugir de algo. Ou encontrar algo que faltava.
Mas ele não tinha mais espaço dentro de si para paixões, esperanças ou recomeços. O amor era uma mentira bem contada. E quem acreditava nele... acabava destroçado.
Não sabia ainda, mas o destino já havia sido lançado.
E mesmo o coração mais congelado, uma hora começa a ceder ao calor de uma presença inesperada. mas o inesperado não é aceito por Mikhail que não acreditava que o amor ainda existia nos corações mas bondosos dentro de um pequenos convento.
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Atualizado até capítulo 37
Comments
Jucelia Oliveira
colocar fotos deles autora fica mais interessante estou gostando muito 👏 👏 👏
2025-07-08
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