O silêncio depois da revelação era quase sólido.
Arianwen olhava para as mãos, que ainda tinham fragmentos de folhas entre os dedos. Aquelas mãos que curavam, que amansavam dor... agora estavam inúteis.
Como se nenhuma erva pudesse curar o que acabava de acontecer.
— Raffi Drustan... — ela repetiu, num sussurro. — Ele me chama de aberração, pai. De “meia-coisa”. Ele me olha como se eu não fosse parte do clã.
Eira deu um passo à frente, entre a irmã e o pai.
— Ela não vai acasalar com ele. — disse, com firmeza. — E eu não vou me unir a ninguém por decreto, muito menos ao Beta, mesmo que ele seja meu companheiro por destino. Isso não é acasalamento, é política disfarçada de tradição.
— Eira... — Cairbre advertiu, com tom pesado.
— Não. — ela rosnou. Literalmente. — Isso não é só uma injustiça. É errado. Vai contra o que o clã sempre pregou: que o vínculo é sagrado. SAGRADO, pai. Ele acontece por instinto, por alma, não por aliança estratégica!
Taran aproximou-se, os braços cruzados e a testa franzida.
— Desde quando o Alpha impõe acasalamentos? — ele perguntou, sem tirar os olhos do pai. — O vínculo sempre foi sentido, não escolhido por outro. Isso... isso nunca aconteceu antes.
Cairbre sustentou o olhar do filho com dificuldade.
— As coisas estão mudando. O Conselho teme os dias que virão. Há sinais. Movimentações nos outros clãs. Os velhos estão inquietos. Querem alianças fortes. Linhagens unidas. Sangue leal.
— Então vamos sacrificar o que é puro dentro de casa para proteger o que está fora? — Eira cuspiu as palavras como espinhos. — Isso não é liderança. Isso é covardia.
Arianwen estava calada, imóvel. Mas dentro dela, algo começava a se partir. Uma rachadura silenciosa que crescia com cada palavra dita.
— Papai… — ela ergueu os olhos, dourados e marejados. — E se eu recusar?
Todos olharam para Cairbre.
— Se recusar, você será banida do clã. Como manda a tradição. — ele respondeu, e sua voz vacilou ao final.
O coração de Arianwen bateu tão forte que ela achou que fosse desmaiar.
— E o que acontece com uma loba sem clã, pai? O que acontece comigo se eu for expulsa?
— Você perde o nome. A proteção. O território. O sangue do clã.
— Perco vocês. — completou ela, num fio de voz.
Maebh deu um passo à frente, os olhos marejados.
— Não se perde o que vive no coração, minha filha. Onde quer que você esteja, você ainda será minha. Nossa.
Eira tocou o ombro da irmã com ternura, e Taran desviou o olhar, engolindo seco.
— Vocês estão tratando isso como se fosse só política. Mas é a vida dela. — disse ele. — E você, pai… você sempre foi contra as ordens cegas. Por que agora aceita calado?
Cairbre olhou para os filhos como quem carrega um fardo que ninguém pode ver
— Porque se eu me opuser… o Alpha pode nos tirar tudo. Até a vida.
Arianwen sentiu um gosto metálico na boca.
Não era medo.
Era algo mais cruel.
Era a certeza de que o clã que a criou não a reconhecia mais como filha, mas como moeda.
A lua ainda não estava cheia. Ainda restavam duas semanas.
Tempo suficiente para sangrar.
Ou para escolher.
Mesmo que fosse a fuga.
Ela olhou para Eira.
Eira entendeu sem que fosse preciso dizer nada.
A rebeldia tinha encontrado forma.
E a Lua... não escolheria por elas.
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Atualizado até capítulo 39
Comments
Marcia Cristina Carneiro
É uma decisão difícil 😲 04/07/25/
2025-07-05
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