O despertador tocou às sete da manhã, como em todas as outras manhãs dos últimos anos. Mas, dessa vez, Clara não o desligou imediatamente.
Ficou deitada, encarando o teto, sentindo o peso da noite anterior ainda pairando sobre ela como um lençol sufocante.
O lado da cama onde Eduardo costumava dormir estava vazio.
Talvez tivesse dormido no quarto de hóspedes. Ou, quem sabe, nem tivesse voltado depois que ela subiu as escadas. Ela não se importava. Pela primeira vez em muito tempo… ela não se importava.
Clara levantou devagar. Foi até o espelho e encarou a própria imagem.
Os olhos estavam inchados, a pele pálida… mas havia algo novo no olhar dela. Algo que ela mal reconhecia. Um brilho que não era de dor… era de raiva. De decisão.
Pegou o celular, abriu o navegador e digitou sem pensar muito:
“Vagas de emprego – Marketing – Centro da cidade”
Ela não sabia por onde começar… mas uma coisa era certa: precisava ocupar a mente. Precisava de um plano. Não dava mais para depender dele para tudo. Não depois de tudo.
Na cozinha, o cheiro de café fresco a surpreendeu.
Eduardo estava lá, como se fosse um marido dedicado, mexendo no celular com uma xícara nas mãos.
— Bom dia. — Ele disse, sem levantar os olhos da tela.
Clara parou na porta, o encarando por alguns segundos. A naturalidade dele a enojava.
— Bom dia. — Ela respondeu, seca.
Pegou uma caneca, serviu café e se encostou na bancada, observando-o de canto de olho.
Ele estava vestido como sempre: terno impecável, gravata perfeitamente alinhada, cabelo penteado para trás. O mesmo Eduardo que ela amou por tanto tempo… mas que agora parecia um estranho dentro da própria casa.
— Dormiu bem? — Ele perguntou, como se não tivesse sugerido, horas antes, que eles tivessem um casamento aberto.
Ela respirou fundo.
— Maravilhosamente bem. — Respondeu, com um sorriso irônico.
Ele finalmente ergueu os olhos para ela, claramente surpreso com a resposta. Mas logo voltou ao celular.
— Tenho uma reunião cedo. Vou sair agora. — Disse, pegando as chaves do carro.
Clara apenas assentiu, dando um gole no café.
Ele foi até a porta, parou por um segundo, como se quisesse dizer algo… mas não disse. Apenas saiu.
O som da porta se fechando soou como um sinal de liberdade.
Depois que ficou sozinha, Clara foi até o quarto, abriu o guarda-roupa e encarou as roupas alinhadas. Vestidos delicados, saias de seda, camisas que ela usava para os almoços sociais, jantares beneficentes e encontros com as amigas de fachada.
Pegou um jeans antigo no fundo da gaveta, uma camiseta branca e um tênis.
Olhou-se no espelho e sorriu de leve.
— De volta à realidade.
Sentou-se à frente do notebook e começou a atualizar o currículo. Fazia anos que não tocava naquele documento. Na verdade, desde que tinha largado o emprego para "se dedicar ao casamento", como Eduardo sugerira na época.
Ela respirou fundo ao escrever o próprio nome no cabeçalho do arquivo.
Era quase simbólico.
Uma nova versão de si mesma nascendo… ali.
Passou a manhã enviando currículos para agências de marketing, consultorias e até startups que ela nem conhecia. Não se importava com o cargo, o salário, nada. O que ela queria era ter uma vida além dele. Ter para onde ir. Ter um motivo para sair de casa todos os dias.
No início da tarde, enquanto fazia uma lista de contatos antigos para reativar, seu celular vibrou.
Uma notificação de mensagem.
Remetente: Miguel Duarte
Clara congelou.
Miguel…
O amigo da faculdade.
O cara que, anos atrás, ela sempre viu como “só amigo”, mas que hoje… de repente… parecia uma lembrança confortável.
A mensagem era simples, mas direta:
“Vi seu currículo no LinkedIn. Está de volta ao mercado? Se quiser, conheço algumas pessoas. Podemos conversar.”
Ela sorriu, pela primeira vez em dias.
O universo… começava a conspirar.
Guardou o celular no bolso e, por um instante, sentiu o coração bater diferente. Não por Eduardo. Não por raiva. Mas por uma curiosidade nova. Por uma leveza que há muito tempo não sentia.
Ela sabia que a estrada seria longa…
Mas, de algum jeito… ela estava começando a gostar da ideia de recomeçar.
E Eduardo…
Ele que se preparasse. Porque aquela Clara…
Não existia mais.
O restante da tarde passou arrastada, mas com um tipo estranho de alívio. Clara manteve-se ocupada enviando currículos, reorganizando a escrivaninha que há tempos não usava e até pesquisando cursos online de atualização profissional.
Cada pequeno gesto parecia uma vitória.
Uma afirmação silenciosa de que ela estava, finalmente, recuperando o controle da própria vida.
Por volta das seis da tarde, ela ouviu o som do portão eletrônico abrindo.
Eduardo estava de volta.
Clara permaneceu no quarto, sentada à frente do notebook, revisando um portfólio antigo de campanhas que tinha feito antes de se casar.
Ouviu o barulho da porta da frente sendo aberta, os passos dele no hall, o som da chave caindo na bancada, como sempre fazia.
Tudo tão igual… e ao mesmo tempo, tão diferente.
Minutos depois, ele apareceu na porta do quarto.
— Você passou o dia aqui? — Eduardo perguntou, encostado no batente, com aquele tom casual que a deixava ainda mais irritada. — Nem desceu pra almoçar.
Ela apenas o olhou de relance.
— Estava ocupada. — Respondeu, seca.
Ele franziu o cenho.
— Ocupada… com o quê?
Ela virou a tela do notebook, deixando que ele visse o currículo aberto, os sites de vagas, as abas de empresas.
Por um instante, Eduardo ficou em silêncio, como se não soubesse o que dizer.
— Você tá procurando emprego? — A voz dele carregava uma mistura de surpresa e desdém mal disfarçado.
Clara deu de ombros.
— Sim. Achei que um casamento aberto combinasse melhor com uma mulher independente. — O sarcasmo pingava de cada palavra.
Ele deu uma risada baixa, um tanto nervosa.
— Clara… você não precisa disso. Não precisa se expor a esse tipo de estresse… de cobrança…
— Não se preocupe. — Ela o interrompeu. — Eu dou conta.
Ele respirou fundo, passando a mão pela nuca. Caminhou até o meio do quarto, parou atrás dela.
— Você sabe que eu sempre cuidei de tudo pra você…
Ela virou a cadeira devagar, encarando-o.
— Você sempre quis que eu dependesse de você, Eduardo. Mas, a partir de agora… isso acabou.
Os dois ficaram em silêncio por alguns segundos.
Ele forçou um sorriso, claramente desconfortável.
— Clara… olha… sobre ontem… Eu sei que foi um choque. Mas… a gente pode encontrar um equilíbrio nisso tudo. Sem drama.
Ela riu, dessa vez sem nenhum humor.
— Sem drama? Depois de tudo? Depois de me trair na cara dura e ainda ter a coragem de sugerir esse circo?
— Eu só tô tentando ser honesto. — Ele rebateu, cruzando os braços. — Pelo menos… tô te dando opções.
— Ah, obrigada pela generosidade. — Ela levantou da cadeira, caminhou até a porta do quarto e, antes de sair, lançou um último olhar por cima do ombro. — Pode ficar tranquilo, Eduardo. Eu vou aproveitar cada uma dessas "opções" que você me deu. E quando você perceber… vai ser tarde demais.
Ela saiu do quarto com o coração disparado, mas com a cabeça erguida.
Pela primeira vez em muito tempo, ela sentia que tinha voltado a respirar.
E, no fundo… ela sabia que aquela conversa tinha sido só o começo.
Porque se Eduardo achava que ela ia continuar sendo a mulher que vivia à sombra dele… estava muito, muito enganado.
Mais tarde naquela noite, antes de dormir, Clara pegou o celular novamente.
Abriu a mensagem de Miguel.
Leu e releu.
E finalmente respondeu:
“Podemos conversar sim. Quando você estiver disponível.”
E, ao apertar o botão de enviar, Clara sorriu.
Dessa vez… um sorriso verdadeiro.
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Atualizado até capítulo 46
Comments
Lucia Carla
quero fotos
2025-06-24
0
Dulce Gama
tomara que ela encontre um bom emprego e de adeus só Eduardo a homem perverso 🌟🌟🌟🌟🌟🌹🌹🌹🌹🌹🎁🎁🎁🎁🎁♥️♥️♥️♥️♥️👍👍👍👍👍
2025-06-19
1