Capítulo 4 – Ecos nas Paredes

Era no silêncio da noite que Ana mais sentia a presença do colar.

Durante o dia, ele parecia apenas um pingente comum — bonito, antigo, discreto. Mas à noite, quando a casa dormia, ele despertava. O brilho suave da pedra azul ficava mais intenso nos momentos em que ela estava sozinha, especialmente quando pensava no parque ou na voz do sonho.

Naquela madrugada, o calor no colar era mais forte do que nunca. Ana acordou com a sensação de que alguém a observava. O quarto estava escuro, exceto por um fio de luar que entrava pela janela.

Levantou-se devagar, tentando não fazer barulho.

O corredor estava mergulhado em penumbra. Os quadros pareciam observá-la à medida que passava. O piso rangia como se reclamasse de cada passo. O ar era mais frio do que deveria ser. Ana seguiu o instinto, o colar guiando como uma bússola invisível.

Chegou até o fim do corredor. Ali havia uma porta trancada, diferente das outras. A maçaneta era dourada, antiga, mas o ferro da fechadura parecia novo. Havia algo naquela porta que a atraía e ao mesmo tempo a fazia recuar.

Foi então que ouviu um sussurro do outro lado.

Baixo.

Familiar.

— Ana...

Ela se enrijeceu. A voz não era exatamente a mesma dos sonhos — era mais áspera, menos nítida — mas chamava por ela.

Estendeu a mão para a maçaneta, hesitante. Mas antes que pudesse tocá-la, ouviu passos rápidos atrás de si. Virou-se.

Tereza.

A menina estava parada a poucos metros, com o urso nos braços. Seus olhos, grandes e fixos, pareciam ainda mais escuros no escuro.

— Você não pode entrar aí — disse ela, em tom firme, quase adulto.

— Por quê? — Ana sussurrou.

— Ninguém pode. A porta guarda coisas que esqueceram de dormir.

— O que tem aí dentro?

Tereza balançou a cabeça, como se as palavras não fossem suficientes.

— O urso disse que, se você abrir agora, vai ser antes da hora.

Ana olhou novamente para a porta. O colar no peito queimava. A voz parecia mais distante agora.

Passos soaram nas escadas. Helena e Maurício.

— O que está acontecendo aqui? — perguntou Maurício, com tom severo.

— Eu... ouvi barulho — disse Ana, sem saber se mentia ou não.

Tereza deu um passo para trás, escondendo-se na sombra do corredor.

— Estava com medo — murmurou. — Acordei e vi Ana fora do quarto.

Helena a envolveu nos braços. Seu olhar para Ana foi frio, avaliador.

— A casa pode ser... estranha no começo — disse a mulher. — Mas você vai se acostumar. Só precisa de tempo.

De volta ao quarto, Ana não conseguiu dormir. O colar estava mais leve agora, como se tivesse voltado ao repouso. Mas sua mente permanecia desperta, inquieta.

No dia seguinte, os irmãos estavam diferentes. Mais calados. Rafaela a olhou de canto. Nicolas parecia tenso. E Violeta apenas a ignorava — o que, para Ana, era ainda pior do que as provocações.

Na cozinha, Rafael murmurava para si mesmo enquanto empilhava talheres. Murmúrios desconexos, como se repetisse frases aprendidas no escuro.

— O que você está dizendo? — perguntou Ana.

— Nada — respondeu ele, abruptamente.

Mas ela ouviu de novo: “A porta deve dormir. Até que a chave lembre.”

Ana saiu dali com um nó no estômago. Estava cada vez mais claro: alguma coisa naquela casa estava se movendo sob a superfície, como raízes crescendo por baixo de tudo. E os irmãos... estavam começando a sentir também.

Ou pior: já sabiam.

No final da tarde, enquanto o céu ficava alaranjado atrás da névoa constante, Ana subiu ao quarto de Tereza. A menina estava desenhando com giz de cera sobre o assoalho.

— O que está desenhando?

Tereza a olhou de relance.

— A casa por dentro. Mas como ela realmente é.

O desenho mostrava escadas que levavam a lugar nenhum. Portas dentro de portas. Um espelho com olhos. E no centro... uma chave. Rodeada de sombras que tinham nomes escritos com letras tremidas.

E entre os nomes, o de Ana.

— Por que o meu nome está aí?

— Porque você é a que lembra — disse Tereza. — Mas lembrar é perigoso.

Ana se ajoelhou ao lado dela. O colar voltou a brilhar, como se reagisse ao desenho.

— Quem te contou tudo isso?

Tereza apertou o urso e respondeu:

— A casa.

Mais populares

Comments

Yue Sid

Yue Sid

Quero mais! 📚

2025-06-01

0

Ver todos
Capítulos
1 Prólogo - A Voz na Névoa
2 Capítulo 1 - Entre Muros e Silêncio
3 Capítulo 2 – A Casa da Colina Nebulosa
4 Capítulo 3 – A Casa Que Observa
5 Capítulo 4 – Ecos nas Paredes
6 Capítulo 5 – Uma Festa Bem Intencionada
7 Capítulo 6 – Parque dos Ecos
8 Capítulo 7 – Vozes entre sombras
9 Capítulo 8 - A Sombra
10 Capítulo 9 - Presenças Invisíveis
11 Capítulo 10 – O Quarto Fechado
12 Capítulo 11 – A Inauguração
13 Capítulo 12 – Sob a Pele
14 Capítulo 13 – Chamas Antigas
15 Capítulo 14 – O Eco da Queda
16 Capítulo 15 – Vozes Contra a Sombra
17 Capítulo 16 – Ecos da Primeira Queda
18 Capítulo 17 – Vozes na Escuridão
19 Capítulo 18 – Entre Beijos e Ruínas
20 Capítulo 19 – Ecos Antigos
21 Capítulo 20 – A Marca e o Laço
22 Capítulo 21 - O Coração da Memória
23 Capítulo 22 - Ecos de Alina
24 Capítulo 23 - Entre Sombras e Promessas
25 Capítulo 24 - Verdades Queimam Como Brasa
26 Capítulo 25 - O Eco do Véu
27 Capítulo 26 - A Primeira Tempestade
28 Capítulo 27 - Fragmentos de Luz e Sombra
29 Capítulo 28 - Memórias que Não São Minhas
30 Capítulo 29 - Sombras Entre Nós
31 Capítulo 30 - Entre Ecos do Tempo
32 Capítulo 31 - Coração Entre Mundos
33 Capítulo 32 - O Preço da Travessia
34 Capítulo 33 - O Silêncio que Precede
35 Capítulo 34 - Entre Ecos e Labirintos
36 Capítulo 35 - A Verdade Esquecida
37 Capítulo 36 - Sombras em Casa, Luz na Perseguição
38 Capítulo 37 - Sentença de Luz e Sombra
39 Capítulo 38 - Fragmentos de Luz
Capítulos

Atualizado até capítulo 39

1
Prólogo - A Voz na Névoa
2
Capítulo 1 - Entre Muros e Silêncio
3
Capítulo 2 – A Casa da Colina Nebulosa
4
Capítulo 3 – A Casa Que Observa
5
Capítulo 4 – Ecos nas Paredes
6
Capítulo 5 – Uma Festa Bem Intencionada
7
Capítulo 6 – Parque dos Ecos
8
Capítulo 7 – Vozes entre sombras
9
Capítulo 8 - A Sombra
10
Capítulo 9 - Presenças Invisíveis
11
Capítulo 10 – O Quarto Fechado
12
Capítulo 11 – A Inauguração
13
Capítulo 12 – Sob a Pele
14
Capítulo 13 – Chamas Antigas
15
Capítulo 14 – O Eco da Queda
16
Capítulo 15 – Vozes Contra a Sombra
17
Capítulo 16 – Ecos da Primeira Queda
18
Capítulo 17 – Vozes na Escuridão
19
Capítulo 18 – Entre Beijos e Ruínas
20
Capítulo 19 – Ecos Antigos
21
Capítulo 20 – A Marca e o Laço
22
Capítulo 21 - O Coração da Memória
23
Capítulo 22 - Ecos de Alina
24
Capítulo 23 - Entre Sombras e Promessas
25
Capítulo 24 - Verdades Queimam Como Brasa
26
Capítulo 25 - O Eco do Véu
27
Capítulo 26 - A Primeira Tempestade
28
Capítulo 27 - Fragmentos de Luz e Sombra
29
Capítulo 28 - Memórias que Não São Minhas
30
Capítulo 29 - Sombras Entre Nós
31
Capítulo 30 - Entre Ecos do Tempo
32
Capítulo 31 - Coração Entre Mundos
33
Capítulo 32 - O Preço da Travessia
34
Capítulo 33 - O Silêncio que Precede
35
Capítulo 34 - Entre Ecos e Labirintos
36
Capítulo 35 - A Verdade Esquecida
37
Capítulo 36 - Sombras em Casa, Luz na Perseguição
38
Capítulo 37 - Sentença de Luz e Sombra
39
Capítulo 38 - Fragmentos de Luz

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!