Melissa passou o final de semana inteiro reescrevendo sua apresentação. Não porque duvidava do conteúdo — ela sabia o que queria dizer. Mas porque havia algo mais ali. Algo entre cada slide, entre cada exemplo que escolhia, entre cada frase que pensava em dizer.
Era mais do que um trabalho sobre comunicação não verbal.
Era sobre eles.
Na segunda-feira, ela entrou na sala com um vestido simples, mas marcante. Azul-marinho, mangas curtas, levemente ajustado na cintura. Nada exagerado, mas algo que dizia: estou segura de mim mesma, e sei que você vai notar.
Carol a encarou como quem já sabia.
— Vai apresentar ou conquistar o coração do professor?
— As duas coisas, se possível — respondeu Melissa, colocando os fones de ouvido como quem se preparava para um combate.
Miguel estava sentado na ponta da mesa, conferindo algo em seu caderno. Quando ela entrou, ergueu os olhos. E parou.
Por um segundo — apenas um — ele a olhou com uma intensidade que fez o ar parecer mais denso. Melissa sentiu o calor subir pela nuca.
— Boa tarde, turma. Vamos às apresentações. Começamos com Melissa?
Ela assentiu. Levantou-se, pegou o pen drive com a mão firme e conectou ao projetor. O título do slide apareceu:
“O Que Não Dizemos: Comunicação Silenciosa e Desejo”
A sala murmurou baixo. Miguel cruzou os braços. Interessado.
Melissa começou.
— A comunicação não verbal é responsável por mais de 60% das nossas interações. Postura, olhar, respiração, proximidade... tudo fala. Mesmo quando o outro não está pronto pra escutar.
Ela caminhava devagar, falando com calma. Seu tom era confiante, envolvente. A cada exemplo que dava, olhava para Miguel. Ele a observava com atenção absoluta. Não havia mais sala, alunos, slides. Só eles dois. Jogando um jogo perigoso com palavras e silêncios.
— Às vezes, o corpo responde antes da mente permitir. Um passo mais perto. Um toque que demora meio segundo a mais. Um olhar que insiste. Uma respiração que vacila. Tudo isso diz algo.
Silêncio.
— E há casos em que a comunicação se torna um segredo compartilhado. Quando o que não é dito... é exatamente o que precisa ser sentido.
A última frase caiu como uma confissão disfarçada.
Miguel não piscava.
— Obrigada — disse Melissa, encerrando a apresentação. O coração batendo descompassado.
A sala aplaudiu. Alguns elogiaram. Mas ela só ouvia o som da própria respiração — e o silêncio de Miguel.
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Quando a aula terminou, ele a chamou.
— Melissa.
Ela virou-se.
— Sim, professor?
Ele hesitou por meio segundo.
— Pode me acompanhar até a coordenação? Preciso entregar um material e queria falar um pouco mais sobre sua apresentação.
— Claro.
Saíram juntos, o corredor meio vazio. Miguel caminhava ao lado dela, sem dizer nada por alguns instantes. Só quando chegaram perto da escada de emergência — um local mais isolado — ele parou.
— O que você fez hoje... foi ousado.
Melissa o encarou.
— Mas funcionou?
— Funcionou bem demais. — A voz dele saiu mais baixa, mais densa. — Talvez até demais.
— Eu só falei sobre comunicação não verbal. — Ela sorriu. — Foi puramente acadêmico.
— Você sabe que não foi só isso.
— Você também sabe.
Silêncio.
E então, como se ambos soubessem que aquele momento era inevitável, Miguel deu um passo à frente. Os olhos fixos nos dela. Os dedos roçaram de leve no braço dela, só por um instante.
— Isso é um erro — murmurou ele.
— Talvez — sussurrou Melissa. — Mas é o único erro que eu venho querendo cometer há semanas.
O toque se transformou em um roçar de mãos. Ele ainda hesitava. A tensão entre os dois era absurda.
— Me diz pra parar, Melissa — ele pediu, num fio de voz.
— Eu não posso. Porque eu quero tanto quanto você.
E ali, no silêncio de um corredor esquecido da faculdade, ele se aproximou de verdade. Os lábios dele tocaram os dela com cuidado — como quem cruza uma linha e sabe que não há volta. O beijo foi lento no início, explorando. Depois, mais intenso. Como se quisessem recuperar o tempo perdido entre olhares, entre frases ambíguas, entre a vontade reprimida.
Quando se afastaram, os dois ainda estavam ofegantes. Os olhos diziam mais que qualquer palavra.
— A gente precisa ser discreto — ele disse.
— Eu sei.
— Isso... não pode atrapalhar sua vida acadêmica.
— E nem seu emprego.
— Mas se você quiser continuar esse erro...
— Eu quero.
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Naquela noite, Melissa deitou na cama, os lábios ainda quentes. Repassava cada segundo. O olhar dele. O toque. A frase final.
Estava acontecendo.
E, pela primeira vez em muito tempo, ela não se sentia perdida.
Sentia-se exatamente onde deveria estar.
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Atualizado até capítulo 32
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