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Capítulo 5 – Memórias de Sangue e Luz
A clareira silenciou após a batalha, como se o mundo ao redor tivesse parado para absorver o que acabara de acontecer. Os corpos dos cavaleiros sombrios se dissiparam em névoa escura, tragados pela própria maldição que os mantinha vivos.
Aurora estava imóvel. A espada ainda em suas mãos tremia levemente, mas não de medo. Era como se ela vibrasse, viva, reagindo a algo que ainda se formava dentro dela.
Kael se aproximou em passos lentos, seu olhar fixo no rosto dela — não mais em alerta, mas em reverência. Ele parou diante dela e, com um movimento cuidadoso, tocou de leve o punho da espada.
— Você lutou como Lyara — ele murmurou, quase em um sussurro.
Aurora ergueu o olhar para ele, os olhos ainda brilhando de adrenalina e confusão.
— Quem foi ela… realmente?
Kael hesitou. Parecia buscar palavras em uma língua antiga demais para se dizer em voz alta. Então apontou para a árvore de casca prateada, onde agora, no tronco, brilhava um símbolo em relevo: uma rosa com espinhos voltados para dentro.
— A primeira guerreira da Rosa Branca. A portadora da luz em meio ao caos. Ela selou a Fratura entre os mundos há séculos, sacrificando tudo o que era. Ela não era só uma guerreira… era uma lenda.
Aurora se aproximou da árvore, tocando o símbolo com os dedos. No instante em que fez isso, seu corpo enrijeceu.
A visão veio como uma onda.
Ela se viu em outro tempo. Em outro corpo. Cabelos longos e prateados dançavam ao vento enquanto empunhava a mesma espada com fúria e elegância. Estava cercada por sombras, protegendo uma vila em chamas. E Kael… ele estava lá. Mais jovem, os olhos mais suaves, mas o mesmo rosto. O mesmo silêncio.
Aurora recuou, ofegante. Seu coração batia rápido demais.
— Eu fui ela? — perguntou, com a voz quase falhando.
Kael assentiu, sério.
— Ou parte dela vive em você. Algumas histórias são cíclicas. Algumas almas… retornam.
— E você? — ela o encarou. — Quem era você, naquela vida?
Kael desviou o olhar. Havia dor ali. Antiga. Mal curada.
— Aquele que não conseguiu salvá-la.
O silêncio caiu entre os dois como uma sombra densa. Mas algo mais nascia sob ela: uma corrente invisível, um elo que se estendia entre o passado e o presente, entre a lenda e a realidade.
Kael se aproximou, e seu olhar escureceu com emoção contida.
— Você pode mudar o fim, Aurora. Pode fazer diferente. Mas para isso… vai ter que lembrar de tudo. Inclusive do que te destruiu da última vez.
Aurora abaixou o olhar, sentindo o peso da responsabilidade tomando forma. E ainda assim, uma parte dela — talvez a mais escondida — sentia excitação.
Não por poder. Mas por, finalmente, ser alguém. Ser vista. Ser necessária.
Ela ergueu a cabeça e o encarou.
— Então me ensine. Tudo. Me mostre como lembrar.
Kael segurou o cabo da espada dela por um instante, as mãos deles se tocando. Um arrepio subiu pela espinha de Aurora. Mas ela não se afastou.
— Amanhã ao amanhecer, começamos. E quando isso acontecer, não haverá mais volta.
— Eu nunca quis voltar — ela respondeu, firme.
E naquele instante, no olhar trocado, algo entre eles se acendeu. Um reconhecimento silencioso. Um desejo ainda não dito. Um passado que, talvez, tivesse uma segunda chance.
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