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Capítulo 3 – O Homem Sem Nome

O silêncio entre eles era quase tão espesso quanto a névoa que começava a subir do chão da floresta. Aurora sentia o peso daquele momento nos ombros, como se as árvores, os ventos e até mesmo o tempo segurassem a respiração para ouvir o que viria a seguir.

O homem ainda a observava. Seus olhos, escuros como a noite antes da tempestade, a percorriam com uma atenção desconcertante. Não era desejo, nem julgamento — era como se ele buscasse nela um nome esquecido, uma memória antiga, algo perdido entre as páginas do tempo.

Ela tentou manter a postura firme, mas a verdade é que suas pernas tremiam. Não de medo, mas da sensação de que algo dentro dela havia se quebrado... ou despertado.

— Quem é você? — ela perguntou, enfim. A pergunta saiu num fio de voz, mas havia coragem nela. Havia sede por respostas.

O homem virou o rosto levemente, como se ponderasse se valia a pena dizer a verdade. Quando enfim respondeu, sua voz era grave, arrastada, marcada por algo mais profundo que o cansaço.

— Já tive nomes demais para contar. Fui soldado numa guerra que ninguém lembra. Prisioneiro de um reino que caiu. Fui traído e chamado de traidor. Fui um herói por um único dia... e isso me custou tudo. Agora? Agora sou só uma sombra com lembranças demais e paz de menos.

As palavras dele cortaram o ar como lâminas. Aurora prendeu o fôlego. A cada frase, aquele homem — aquele guerreiro de expressão contida e alma rachada — parecia mais um personagem de um épico que alguém esqueceu de terminar.

— E você? — ele devolveu a pergunta, sem mudar o tom. — Já descobriu quem é neste lado da história?

Aurora hesitou. O nome dela parecia pequeno agora, frágil diante daquele mundo tão grandioso, tão perigoso. Mas também era um ponto de partida.

— Eu sou Aurora... ou, pelo menos, era. O livro me chamou de Lyara. Mas eu não sei o que isso quer dizer.

Ele assentiu lentamente, como quem já esperava essa resposta.

— Quer dizer que você não está mais lendo a história. Você se tornou parte dela.

Um arrepio percorreu sua coluna. Era loucura. Ou talvez... fosse o que ela sempre esperou que acontecesse. Desde criança, ela se via dentro dos livros. Vivendo entre espadas, reis, maldições e promessas antigas. Mas nada a preparou para a sensação de realmente estar ali — viva em um universo que não seguia as leis do mundo que conhecia.

Ela o encarou. Havia mais perguntas queimando em sua língua.

— Você... me conhece?

Por um segundo, ele pareceu congelar. Os olhos escureceram ainda mais, como se uma lembrança o tivesse atravessado. Mas quando respondeu, sua voz era contida, como alguém que andava em um campo minado de palavras.

— Não da forma que você imagina. Mas sei o suficiente. Sei que o livro não aparece por acaso. E que se ele te escolheu... então há algo em você que precisa ser lembrado.

Aurora sentiu algo se agitar em seu peito. Uma chama. Uma força antiga. Ela não sabia empunhar uma espada. Nunca havia sequer segurado uma. Mas algo dentro dela sabia.

— E você? — ela insistiu, com mais firmeza. — Tem nome? Ou vai continuar fingindo que é só um fantasma com uma espada nas costas?

Dessa vez, ele sorriu. Não um sorriso completo — mas um canto de lábio curvado que sugeria ironia, tristeza... e um pouco de admiração.

— Aqui, sou conhecido como Kael. Mas os nomes verdadeiros... eles pertencem a uma vida que já não existe.

Kael.

O nome pousou na mente de Aurora como uma lembrança antiga, embora ela tivesse certeza de que nunca o ouvira antes. Ainda assim, havia algo nele — um som, uma energia — que fazia seu coração bater mais forte.

— Você me conhece — ela disse, quase sem perceber.

— Eu conheço seu destino — ele respondeu, simplesmente.

Antes que ela pudesse questionar mais, um som cortou o ar da floresta: o trotar pesado de cavalos, vindo de leste. Não era um passeio. Era perseguição. Caçada.

Kael ficou tenso num instante. Seus olhos varreram a floresta com precisão militar. Ele se virou para Aurora, e o tom em sua voz mudou — mais urgente, mais afiado.

— Eles te encontraram antes da hora. Isso não deveria acontecer. Rápido — ele estendeu a mão. — Precisamos sair daqui.

— Quem são eles? — ela perguntou, o medo começando a se infiltrar por suas costelas.

— Aqueles que querem que essa história nunca chegue ao fim. Ou que nunca comece.

Aurora hesitou por um segundo. Mas quando seus dedos tocaram os dele, algo dentro dela estalou. Como um selo sendo quebrado.

E naquele toque breve, pele contra pele, ela entendeu.

Kael fazia parte do livro. Da história. E agora, da vida dela.

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