Capítulo 4 – Se Eu Me Entregar, Você Me Derruba

[ Início da Noite]

Kael abriu a porta assim que Ethan bateu. Dessa vez, estava de camisa, mas com os olhos mais fundos, como se tivesse dormido mal ou... bebido demais.

— Entra logo — disse. — Tá um lixo lá fora.

A chuva caía fina, o céu já escuro. Ethan tirou o casaco, cumprimentou com um aceno de cabeça. Kael trancou a porta e ficou ali por um segundo, parado, observando ele tirar os instrumentos da bolsa.

— Eu não gosto de esperar — disse Kael, andando até o sofá. — E você tá dois minutos atrasado.

— Desculpa, tinha trânsito — respondeu Ethan, calmo.

— E se eu tivesse ido embora?

— Você não teria.

Kael riu, jogando o corpo pesado no sofá.

— Tá confiante hoje.

Ethan se ajoelhou no tapete.

— Tô começando a entender como você funciona.

— Entende nada — Kael respondeu, encarando-o de cima. — Você acha que entende porque eu deixo você chegar perto. Mas chegar perto não é o mesmo que entrar.

— Eu não quero entrar — Ethan respondeu, firme. — Só quero que você recupere seu ombro.

— Pena. — Kael desviou o olhar. — Por um momento, quase acreditei que você tava aqui por outro motivo.

[Durante a sessão]

Ethan apertava os músculos ao redor da escápula com precisão. Kael gemia baixo, segurando a dor nos dentes.

— Você tensionou isso de novo. Fez esforço?

— Treinei leve ontem. Só sombra.

— Sombra? — Ethan parou. — Por que você mente?

Kael o olhou de lado.

— Porque às vezes dói menos do que admitir que tô com medo.

Ethan encarou ele por alguns segundos, sentindo o peito apertar.

— Medo de quê?

— De não voltar a ser quem eu era. — A voz de Kael vacilou um pouco. — De ser só um corpo quebrado. Inútil. Um fardo.

— Você não é só isso.

Kael riu com escárnio.

— Você me conhece há uma semana, Ethan. Mal sabe meu sobrenome direito.

— Mas sei reconhecer quando alguém carrega mais dor do que quer mostrar.

Silêncio.

Kael se levantou, se afastando, o ombro ainda nu.

— É esse seu truque? Falar bonito pra quebrar os outros?

— Não. Meu truque é não desistir.

Kael virou, com os olhos ardendo.

— Então para. Porque se continuar tentando, eu vou deixar você entrar. E eu não sei o que acontece comigo se alguém entrar de novo.

[Flashback de Kael | Sozinho no apartamento, depois que Ethan vai embora]

Kael está no chuveiro, a água batendo forte. Apoia a cabeça na parede, o ombro latejando. Lembra da última vez que deixou alguém "entrar".

Foi com o treinador que ele admirava. Um homem que dizia proteger, mas cobrava isso com chantagem e mãos que apertavam demais. Kael tinha 17. Nunca contou pra ninguém.

“Se eu deixar alguém ver de novo, talvez eu quebre de um jeito que não dá pra colar.”

Ele soca a parede do banheiro. A dor no ombro o derruba de joelhos.

[Dia seguinte]

Ethan quase não foi. Pensou em cancelar, em fugir dessa coisa que estava crescendo e escapando do controle.

Mas foi.

Kael abriu a porta sem camisa. O corpo estava marcado. Havia hematomas novos.

— O que aconteceu? — Ethan perguntou, entrando com pressa.

— Nada que você precise saber.

— Kael, eu sou seu terapeuta. Se você tá se machucando de propósito...

— Não foi de propósito.

— Foi quem, então?

Kael desviou os olhos.

— Só alguém que achou que podia me ensinar a obedecer.

Ethan se aproximou devagar, a voz baixa:

— Isso ainda acontece?

Kael respirou fundo.

— Não. Mas ainda me assombra.

Ethan tocou o braço dele, com cuidado.

— Você não precisa viver com isso sozinho.

Kael olhou pra mão dele, ainda encostada.

— Cuidado, Ethan.

— Por quê?

— Porque parte de mim quer te afastar. Mas outra parte quer... puxar você pra perto. E essa parte é perigosa.

Ethan manteve a mão ali. Olhos nos olhos.

— Então me puxa. Mas não mente pra mim.

Kael deu um passo pra trás. O olhar era quase de súplica. Mas disse:

— Vai embora hoje. Só por hoje. Antes que eu me arrependa de não ter te beijado.

Mais populares

Comments

Dennis Rodriguez

Dennis Rodriguez

Não consigo parar de pensar nele! 💭

2025-04-16

1

Ver todos
Capítulos
1 Capítulo 1 – O Corpo Quebra, o Orgulho Não
2 Capítulo 2 – Ninguém Toca Sem Deixar Marca
3 Capítulo 3 – Rachaduras no Silêncio
4 Capítulo 4 – Se Eu Me Entregar, Você Me Derruba
5 Capítulo 5 – O Que Você Faz Com o Que Eu Sinto?
6 Capítulo 6 – Eu Não Queria Precisar de Você, Mas Preciso
7 Capítulo 7 – Se Você Me Tocar Agora, Eu Não Vou Fugir
8 Capítulo 8 – Me Deixa Ficar, Mesmo Que Eu Não Saiba Como
9 Capítulo 9 – Me Desarma Devagar, Mas Não Para
10 Capítulo 10 – E Se Você For Embora Quando Eu Já Tiver Ficado?
11 Capítulo 11 – Quando Vira Real, Vira Risco
12 Capítulo 12 – Eu Sobrevivi, Mas Nunca Escapei
13 Capítulo 13 – Quando Te Ver Vira Arma Pro Mundo
14 Capítulo 14 – Se For Pra Afundar, Que a Gente Respire Antes
15 Capítulo 15 – Se o Mundo Vai Invadir, Que Veja Tudo
16 Capítulo 16 – Vejo Você Mesmo Nos Dias Que Você Não Aguenta Se Olhar
17 Capítulo 17 – A Verdade é Bonita, Mas Machuca Quando Cai no Mundo
18 Capítulo 18 – O Tiro Veio de Dentro
19 Capítulo 19 – Que Eu Suba no Ringue Sem Esquecer Quem Me Levantou
20 Capítulo 20 – O Peso do Silêncio Antes do Primeiro Golpe
21 Capítulo 21 – Eu Quase Caí, Mas Lembrei Quem Me Esperava no Canto
22 Capítulo 22 – O Silêncio Depois da Tempestade
23 Capítulo 23 – O Amor Mora Onde Ninguém Filma
24 Capítulo 24 – Me Toca Como Quem Não Tem Medo de Ficar
25 Capítulo 25 – Quando o Mundo Encosta na Porta Mas a Gente Não Abre de Cara
26 Capítulo 26 – Quando o Mundo Bate Forte e Eu Só Quero Que Você Segure Minha Mão
27 Capítulo 27 – Se For Pra Mostrar, Que Seja de Mãos Dadas
28 Capítulo 28 – Às Vezes Não É o Passado Que Volta, É a Dor Que Nunca Foi Embora
29 Capítulo 29 – Quando as Palavras Saem da Nossa Boca e Entram na Boca do Mundo
30 Capítulo 30 – Eu Também Tenho Dias em Que Eu Não Sei Me Carregar
31 Capítulo 31 – Quando a Dor Vira Documento e a Voz Ganha Forma
32 Capítulo 32 – Se For Pra Falar, Que Seja Pela Nossa Voz
33 Capítulo 33 – Quando a Data Chega, E o Silêncio Também
34 Capítulo 34 – Quando o Corpo Vai Antes da Voz
35 Capítulo 35 – Quando Eu Falo, Eu Não Tô Voltando, Eu Estou Me Libertando.
36 Capítulo 36 – Depois da Tempestade, a Paz Não Faz Barulho
37 Capítulo 37 – Nem Toda Porta Precisa Ser Aberta
38 Capítulo 38 – A Voz Começa Onde o Grito Acabou
39 Capítulo 39 – A Dor Que Vem de Outro Corpo, Mas Que Já Morou no Seu
40 Capítulo 40 – Quando a História de Outro Parece Ter Saído do Seu Corpo
41 Capítulo 41 – Crescer Também é Ser Visto Por Quem Você Queria Esquecer
42 Capítulo 42 – Vozes que Escutam, Vozes que Sabem
43 Capítulo 43 – Quando o Silêncio Revida
44 Capítulo 44 – Voz que Quebra Correntes
45 Capítulo 45 – A Pele Começa a Queimar
Capítulos

Atualizado até capítulo 45

1
Capítulo 1 – O Corpo Quebra, o Orgulho Não
2
Capítulo 2 – Ninguém Toca Sem Deixar Marca
3
Capítulo 3 – Rachaduras no Silêncio
4
Capítulo 4 – Se Eu Me Entregar, Você Me Derruba
5
Capítulo 5 – O Que Você Faz Com o Que Eu Sinto?
6
Capítulo 6 – Eu Não Queria Precisar de Você, Mas Preciso
7
Capítulo 7 – Se Você Me Tocar Agora, Eu Não Vou Fugir
8
Capítulo 8 – Me Deixa Ficar, Mesmo Que Eu Não Saiba Como
9
Capítulo 9 – Me Desarma Devagar, Mas Não Para
10
Capítulo 10 – E Se Você For Embora Quando Eu Já Tiver Ficado?
11
Capítulo 11 – Quando Vira Real, Vira Risco
12
Capítulo 12 – Eu Sobrevivi, Mas Nunca Escapei
13
Capítulo 13 – Quando Te Ver Vira Arma Pro Mundo
14
Capítulo 14 – Se For Pra Afundar, Que a Gente Respire Antes
15
Capítulo 15 – Se o Mundo Vai Invadir, Que Veja Tudo
16
Capítulo 16 – Vejo Você Mesmo Nos Dias Que Você Não Aguenta Se Olhar
17
Capítulo 17 – A Verdade é Bonita, Mas Machuca Quando Cai no Mundo
18
Capítulo 18 – O Tiro Veio de Dentro
19
Capítulo 19 – Que Eu Suba no Ringue Sem Esquecer Quem Me Levantou
20
Capítulo 20 – O Peso do Silêncio Antes do Primeiro Golpe
21
Capítulo 21 – Eu Quase Caí, Mas Lembrei Quem Me Esperava no Canto
22
Capítulo 22 – O Silêncio Depois da Tempestade
23
Capítulo 23 – O Amor Mora Onde Ninguém Filma
24
Capítulo 24 – Me Toca Como Quem Não Tem Medo de Ficar
25
Capítulo 25 – Quando o Mundo Encosta na Porta Mas a Gente Não Abre de Cara
26
Capítulo 26 – Quando o Mundo Bate Forte e Eu Só Quero Que Você Segure Minha Mão
27
Capítulo 27 – Se For Pra Mostrar, Que Seja de Mãos Dadas
28
Capítulo 28 – Às Vezes Não É o Passado Que Volta, É a Dor Que Nunca Foi Embora
29
Capítulo 29 – Quando as Palavras Saem da Nossa Boca e Entram na Boca do Mundo
30
Capítulo 30 – Eu Também Tenho Dias em Que Eu Não Sei Me Carregar
31
Capítulo 31 – Quando a Dor Vira Documento e a Voz Ganha Forma
32
Capítulo 32 – Se For Pra Falar, Que Seja Pela Nossa Voz
33
Capítulo 33 – Quando a Data Chega, E o Silêncio Também
34
Capítulo 34 – Quando o Corpo Vai Antes da Voz
35
Capítulo 35 – Quando Eu Falo, Eu Não Tô Voltando, Eu Estou Me Libertando.
36
Capítulo 36 – Depois da Tempestade, a Paz Não Faz Barulho
37
Capítulo 37 – Nem Toda Porta Precisa Ser Aberta
38
Capítulo 38 – A Voz Começa Onde o Grito Acabou
39
Capítulo 39 – A Dor Que Vem de Outro Corpo, Mas Que Já Morou no Seu
40
Capítulo 40 – Quando a História de Outro Parece Ter Saído do Seu Corpo
41
Capítulo 41 – Crescer Também é Ser Visto Por Quem Você Queria Esquecer
42
Capítulo 42 – Vozes que Escutam, Vozes que Sabem
43
Capítulo 43 – Quando o Silêncio Revida
44
Capítulo 44 – Voz que Quebra Correntes
45
Capítulo 45 – A Pele Começa a Queimar

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!