Lin Yue — agora no corpo de Yun Qing — observava a criada com olhos semicerrados. Por fora, fingia confusão. Por dentro, sua mente trabalhava freneticamente, costurando as lembranças da verdadeira Yun Qing com sua própria lógica moderna.
A jovem à sua frente chamava-se Mei, e parecia devotada à senhorita que agora habitava aquele corpo.
— O médico disse que a senhorita só sobreviveu porque a água com ervas que lhe deram estava envenenada de forma “imprecisa” — disse Mei, enxugando os olhos. — Eles queriam matá-la… e fazer parecer um acidente.
Lin Yue apertou os lençóis com força. As mãos ainda eram finas e frágeis, mas dentro dela pulsava uma raiva crescente. Queriam matar Yun Qing antes do casamento? Quem faria isso? E por quê?
— Mei… me diga, quem exatamente sou eu? — perguntou, tentando soar confusa, mas firme.
A criada assentiu com preocupação, como quem fala com alguém ferido na alma.
— A senhorita é Yun Qing, filha ilegítima do general Yun Zhen. Sua mãe era concubina de terceiro grau, e morreu pouco depois do seu nascimento. Desde então, viveu trancada no pátio oeste da mansão, sem direitos nem educação apropriada.
Uma filha esquecida… oculta da sociedade.
— E esse casamento? — perguntou Lin Yue, franzindo o cenho.
Mei hesitou.
— O imperador emitiu um decreto… forçando a união entre a senhorita e o Terceiro Príncipe, Long Yan. Dizem que é uma forma de punição disfarçada de recompensa, porque o príncipe se recusou a obedecer à última ordem do imperador.
Long Yan… o nome ecoou na mente de Lin Yue. Lembranças da verdadeira Yun Qing se misturaram com rumores: o Terceiro Príncipe era conhecido por sua frieza, seu exército próprio e seu exílio voluntário nas fronteiras, onde liderava batalhas sangrentas.
Um homem temido por todos.
— Então… estão me enviando como noiva para um homem que o próprio imperador quer controlar. — Lin Yue sorriu com amargura. — Estou sendo usada como moeda de troca.
Mei assentiu, baixando a cabeça. Seus olhos tremiam de medo.
— E se eu me recusar? — perguntou, apenas para ver a reação.
— Isso seria considerado desrespeito ao decreto imperial. — A criada empalideceu. — Poderiam mandar matá-la… de verdade, desta vez.
Lin Yue se encostou no travesseiro. Precisava pensar. Planejar. Aquilo não era apenas um novo corpo. Era um novo jogo — e as peças já estavam se movendo.
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Mais tarde, sozinha no quarto, ela se olhou no espelho de bronze polido. O reflexo era sutilmente diferente do que lembrava. O rosto era ovalado, os olhos grandes, mas com uma expressão melancólica. A beleza era discreta, quase apagada pela vida de reclusão e descaso.
Mas há potencial aqui, pensou. Com cuidado, posso transformar essa aparência, como se transforma um vestido em alta-costura.
Ela abriu o armário e encontrou alguns trajes simples. Vestiu-se com firmeza, como quem veste uma armadura.
— Se querem que eu me case com esse príncipe, tudo bem. Mas será do meu jeito.
Ao sair do quarto, a mansão parecia um campo de batalha silencioso. Criadas cochichavam. Guardas desviavam o olhar. Ninguém parecia esperar que ela vivesse, muito menos andasse de cabeça erguida.
No salão principal, a família Yun estava reunida.
Yun Zhen, o general, era um homem rígido, de olhar cortante. Sua esposa principal, Lady Wen, mantinha uma expressão fingida de neutralidade. Ao lado dela estavam os filhos legítimos — Yun Li, o primogênito arrogante, e Yun Fei, a filha preferida, vestida como uma verdadeira dama da corte.
— Olhem só quem voltou dos mortos — disse Yun Li, com um sorriso torto.
— Deve ter sido um erro do destino — comentou Yun Fei, abanando-se. — A criada deve ter preparado mal o veneno.
Lin Yue os ignorou e se aproximou do pai.
— General Yun, agradeço por não ter me enterrado viva. Mas não se preocupe, cumprirei o decreto imperial. — Sua voz era firme, sem tremores. — Casarei-me com o Terceiro Príncipe.
Lady Wen arqueou uma sobrancelha.
— Tem certeza? Ele é conhecido por ser cruel. Dizem que até os próprios soldados o temem.
— Crueldade reconhece fraqueza — respondeu Lin Yue, encarando-a diretamente. — E eu não sou fraca.
A sala ficou em silêncio. Aquela não era a mesma Yun Qing que todos conheciam. Algo havia mudado — e isso os assustava.
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Naquela noite, Lin Yue revisou tudo o que sabia sobre o mundo em que agora vivia. O Reino de Tian era vasto, composto por famílias poderosas, clãs antigos e uma corte cheia de intrigas. As mulheres não tinham muito poder — a menos que fossem imperatrizes, concubinas influentes… ou extremamente inteligentes.
Ela não tinha aliados. Não tinha dinheiro. Mas tinha conhecimento.
Sabia manipular emoções, interpretar expressões, reconhecer mentiras. Sabia como funcionava o poder — porque vinha de um mundo onde aparência e influência eram tudo. Onde bastava uma imagem para destruir uma reputação.
Se usasse bem o que sabia, poderia não só sobreviver… como dominar.
Mas antes… precisava conhecer seu futuro marido.
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Dois dias depois, a carruagem chegou para levá-la ao palácio do Terceiro Príncipe.
O caminho era longo, passando por campos floridos e vilas pobres. Mei a acompanhava em silêncio, com os olhos preocupados.
— Senhorita… ouvi dizer que o príncipe mata criadas só por olhá-lo nos olhos.
— Então é melhor não olhá-lo — disse Lin Yue, com um pequeno sorriso. — Mas observe tudo ao redor. Quero saber quem o serve, o que temem… e o que escondem.
Mei assentiu, impressionada.
Quando chegaram, a mansão do príncipe parecia mais uma fortaleza. Muros altos, soldados em armaduras negras, silêncio absoluto. Nenhuma risada. Nenhum som desnecessário.
Ao descer da carruagem, Lin Yue manteve a postura ereta. Usava um vestido simples, mas com um toque de refinamento que ela mesma adaptara. Nada de jóias exageradas. Apenas confiança.
Foi recebida por um homem alto, de cabelos presos em rabo de cavalo e expressão indiferente.
— Você é Yun Qing?
— Sou. E você é?
— Sou Zhao Min, capitão da guarda pessoal de Sua Alteza. O príncipe está esperando.
Lin Yue assentiu e seguiu o capitão por corredores de pedra fria. Quando finalmente chegou à sala principal, a luz do entardecer atravessava as janelas, tingindo tudo de dourado.
E ali estava ele.
Long Yan.
Sentado, como um imperador em seu próprio trono. Vestia preto e dourado, o olhar obscuro como uma noite sem lua. Observou-a de cima a baixo com frieza calculada.
— Então você é a mulher que o imperador jogou no meu caminho — disse ele, sem se levantar.
Lin Yue não se curvou. Caminhou até a metade da sala, parou e o encarou com firmeza.
— E você é o homem que todos temem. Mas eu não vim aqui para implorar clemência, nem para ser submissa.
Ele ergueu uma sobrancelha, curioso.
— Vim para propor um acordo.
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Atualizado até capítulo 40
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