Capítulo 5 – Faíscas no Olhar
O vento soprava suave sobre a margem do rio, agitando as folhas das árvores e carregando o cheiro terroso da floresta. O sol, já baixo no horizonte, pintava o céu com tons de laranja e vermelho, refletindo-se nas águas calmas como um espelho de fogo. Ardan nunca havia notado como aquele lugar era bonito—mas talvez fosse porque, até então, ele nunca estivera tão distraído.
À sua frente, encostado contra uma árvore, Kael o observava com um sorriso de canto, os braços cruzados e a postura relaxada. Seu olhar, porém, dizia outra coisa.
Havia algo perigoso na forma como Kael o encarava.
Uma tensão invisível pairava no ar entre eles, algo não dito, mas impossível de ignorar.
— Você não deveria se aproximar tanto da fronteira. — Ardan finalmente quebrou o silêncio, cruzando os braços.
Kael sorriu, o olhar carregado de diversão.
— Engraçado. Eu poderia dizer o mesmo para você, príncipe.
A maneira como ele dizia "príncipe" sempre parecia carregada de ironia, como se fosse uma piada interna que só ele entendia. Isso irritava Ardan mais do que gostaria de admitir.
Ele bufou e desviou o olhar para o rio.
— Por que continua aparecendo?
Kael descruzou os braços e deu um passo à frente, os olhos brilhando à luz do entardecer.
— Talvez eu goste da sua companhia.
A resposta fez Ardan travar. Ele se virou para encará-lo, os olhos estreitados.
— Você está brincando comigo?
Kael riu baixinho, uma risada rouca e cheia de mistério.
— E se estiver? Vai me prender de novo?
Ardan sentiu uma onda de irritação subir por seu peito. Kael parecia se divertir às suas custas, como se tudo aquilo fosse apenas um jogo.
Ele apertou os punhos.
— Você deveria me temer.
Mas, para sua surpresa, Kael apenas sorriu, dando mais um passo na direção dele.
— E você deveria me odiar.
As palavras ficaram suspensas entre eles, carregadas de um significado muito mais profundo do que qualquer um dos dois estava disposto a admitir.
Ardan sentiu algo perigoso borbulhar dentro de si.
Ele deveria odiá-lo.
Era o que foi ensinado desde criança. Magos eram inimigos. Seres traiçoeiros que não podiam ser confiáveis. E Kael, mais do que qualquer outro, deveria ser aquele a quem ele mais desprezava.
Mas então por que não conseguia afastar o olhar?
Por que, toda vez que se encontravam, ele sentia esse maldito formigamento sob a pele?
Kael notou sua hesitação.
Ele inclinou ligeiramente a cabeça, como um predador estudando sua presa, os olhos percorrendo cada mínima reação de Ardan.
O silêncio entre eles era tão denso que o rio parecia ter parado de correr.
E então, Kael se moveu.
Foi um movimento sutil, apenas um leve inclinar para frente, quase imperceptível, mas suficiente para encurtar ainda mais a distância entre os dois.
Ardan não recuou.
Faíscas dançaram no ar entre eles. Invisíveis, mas impossíveis de ignorar.
Ardan sentiu o coração acelerar contra o peito. Ele sabia que deveria acabar com aquilo ali. Podia sacar sua espada, dar um passo atrás, fingir que nada estava acontecendo.
Mas não o fez.
Em vez disso, permaneceu imóvel, permitindo que aquele momento proibido se estendesse por mais um segundo.
E foi tempo suficiente para perceber a verdade: o ódio entre eles não era tão puro quanto deveria ser.
***
A tensão só se dissipou quando um barulho no mato fez Ardan se virar rapidamente, os sentidos aguçados para qualquer ameaça. Sua mão foi instintivamente para o cabo da espada, os olhos varrendo a floresta.
Kael não demonstrou a mesma pressa, apenas suspirou e cruzou os braços.
— Relaxe, príncipe. Não é um inimigo.
Ardan franziu o cenho e voltou a atenção para a direção do som. Um pequeno animal saiu do mato e correu para o rio, se escondendo entre as pedras.
O príncipe exalou pesadamente, sentindo-se um tolo.
Kael riu.
— Você realmente acha que eu o traria até aqui se houvesse perigo?
— Você não me trouxe até aqui. — Ardan rebateu, irritado.
— Não? — Kael arqueou uma sobrancelha. — Então me diga, quem de nós dois foi o primeiro a cruzar a fronteira?
Ardan abriu a boca para responder, mas a fechou logo em seguida.
Kael sorriu, como se soubesse que havia vencido aquele pequeno embate.
— Você sente, não sente? — O mago disse de repente, e sua voz estava diferente agora. Mais baixa. Mais séria.
Ardan ficou tenso.
— Sinto o quê?
Kael inclinou a cabeça, e por um breve instante, seus olhos brilharam com algo que Ardan não conseguiu identificar.
— Isso. — Ele apontou sutilmente entre eles. O que quer que esteja acontecendo. O que quer que seja essa... coisa entre nós.
O coração de Ardan disparou.
— Está delirando. — Ele respondeu rapidamente, com um tom mais seco do que pretendia.
Mas Kael não pareceu convencido.
— É mesmo?
Houve um momento de silêncio.
Kael suspirou e desviou o olhar para o céu escurecendo.
— Eu deveria ir.
Ardan deveria ter ficado aliviado com isso. Mas, em vez disso, sentiu um incômodo inexplicável no peito.
O mago se afastou alguns passos, mas antes de desaparecer completamente na floresta, lançou-lhe um último olhar.
— Acredite no que quiser, príncipe. Mas nos encontraremos de novo.
E então, ele se foi.
O vento soprou suavemente sobre Ardan, como se zombasse dele.
Ele soltou a respiração que não percebeu que estava prendendo e fechou os olhos por um momento, tentando controlar o turbilhão dentro de si.
Isso não pode estar acontecendo.
Mas a verdade era que já estava.
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Atualizado até capítulo 32
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