Era fim de tarde. Lara estava sentada no terraço da casa, os pés descalços apoiados no mármore gelado, observando o céu mudar de cor. Em uma das mãos, uma xícara de chá frio; na outra, uma carta que nunca enviaria.
“Querido futuro marido,
Você não me conhece, e eu te odeio por isso.
Você quer uma esposa perfeita, mas não faz ideia de quem sou.
Eu gosto de correr na chuva, de andar descalça, de dormir tarde e de rir alto. Gosto de música alta, de falar palavrão e de não me encaixar.
E tudo isso, dizem que preciso matar.
Preciso aprender a sorrir com delicadeza, cruzar as pernas e dizer ‘sim, senhor’.
Mas sabe o que é pior? Não é o controle.
É o vazio.
É não saber quem sou sem as ordens que me deram desde os cinco anos.
Talvez, quando você vier me buscar, já tenha esquecido como é ser eu.”
Ela dobrou a folha e guardou dentro do livro de etiqueta que deveria estar lendo. Um livro cheio de anotações da professora — "coluna ereta", "nunca falar antes do homem", "não demonstrar cansaço". Quase um manual de submissão disfarçado de refinamento.
A mãe entrou na varanda e avisou que o jantar estava pronto.
Lara levantou devagar, olhando o horizonte com um gosto amargo na boca.
Talvez ele fosse bonito. Talvez até gentil.
Mas isso não apagava a certeza que ela tinha desde criança: ela não pertencia a esse mundo — e jamais aceitaria isso em silêncio.
Eu nunca fico sozinha. Sempre tem um segurança me vigiando de perto.
Agora estou no jardim da nossa casa. Há um canteiro de rosas maravilhoso e um pergolado de madeira coberto por uma trepadeira com flores azuis. Embaixo dele, um banco onde passo boa parte do dia, com meus livros... e os meus amigos beija-flores, que estão sempre por perto.
Hoje resolvi pesquisar um pouco sobre a máfia italiana e os casamentos. Descobri que a maioria acontece como será o meu: programado desde a infância. Estava desolada por não encontrar nenhuma saída para escapar de me casar com aquele tal Capo.
Mas então li algo que me deu um fio de esperança: a mulher que vai se casar com o Capo precisa ser virgem. Ele tem três meses para mostrar a um grupo selecionado a dedo o lençol da primeira noite, manchado de sangue.
Minha mãe não era virgem quando foi roubada pelo meu pai... e mesmo assim virou esposa dele. Preciso perguntar sobre isso sem levantar suspeitas.
Vou arrumar um jeito de descobrir. Se for verdade, basta eu perder minha virgindade e estarei livre desse casamento.
Mas… como será que isso acontece? Dizem que sangra. Se sangra, deve doer. Ainda assim, se isso for o que me livrará daquele homem, estou disposta a enfrentar. Lógico, se eu tiver certeza.
Voltei para casa e observei bem o segurança. Talvez ele possa ser um candidato... mesmo sem me olhar na cara. Todos têm tanto medo do meu pai e do Don Antônio que quase fogem de mim.
Entrei. Minha mãe estava na cozinha — um dos lugares prediletos dela. Ela sempre diz que um homem se conquista todos os dias pelo estômago... e depois, na cama.
— Oi, mãe. O que a senhora está fazendo de gostoso?
— Filha! Que bom que veio. Vou te ensinar esse prato. Tenho certeza de que o Don Antônio vai adorar quando vocês saborearem juntos.
Eu nunca vou cozinhar para aquele cretino. Mas, por enquanto, deixo minha mãe acreditar que estou interessada.
— Seu pai adora feijoada. Quando chegamos ao Brasil, foi o primeiro prato que preparei para ele.
— Mãe… a senhora era virgem quando meu pai a sequestrou?
— Já te disse pra não falar assim. Eu amo seu pai.
— Mas ele não te sequestrou?
— Sim… mas logo me apaixonei por ele. Fiquei porque quis.
— Mas a senhora não respondeu. Era virgem?
— Não, filha. Já tinha namorado alguns caras aqui no Brasil. Estava recém-separada, fui à Itália para esquecer e curar o coração. Foi lá, na praça São Pedro, que esbarrei no seu pai e selei meu destino. Ele me seguiu, me sequestrou, me levou pra uma casa particular… Ficamos lá um mês. Até eu entender que não havia como fugir.
— Então não precisa ser virgem pra se casar com alguém da máfia?
— Só o Capo tem que casar com uma mulher pura.
Abri um sorriso.
— Quer dizer que, se eu já tiver sido de outro homem, ele não vai me querer como esposa?
Minha mãe parou o que estava fazendo, veio até mim, me segurou pelos ombros e olhou fundo nos meus olhos.
— Filha… se isso acontecer, todos estaremos mortos. Uma das condições para morarmos no Brasil foi manter você pura até esse casamento.
Meu pai estava vindo dizer algo à minha mãe e ouviu parte da conversa.
— Lara Beatrice Morabito, se você me envergonhar, vou ser obrigado a te matar.
— Me mata logo, pai! Assim não vou precisar me casar com um homem que nem conheço.
— Já disse que não vou discutir isso com você. Dei minha palavra há muito tempo... e vou cumpri-la.
Ele virou as costas, indo em direção à sala. Fui atrás.
— O senhor está me condenando sem direito a defesa! Eu não quero me casar desse jeito! E se ele for um homem que agride mulheres? Vai se arrepender quando me vir toda machucada?
— Filha, nós, homens da máfia, respeitamos nossas esposas. Não existe essa possibilidade.
— O senhor é tão nojento quanto ele. Sequestrou minha mãe, obrigou ela a ficar com o senhor... e vem me falar em respeito?
Meu pai sempre foi agressivo. De uns tempos pra cá, parou de me corrigir com surras porque, segundo ele, não pode me marcar. Mas eu o irritei tanto que ele virou com força e me deu um tapa no rosto.
— Cale-se e me respeite! Não sou seu amiguinho. Sou seu pai, e você vai me obedecer, entendeu?
Saí correndo da sala, chorando. Voltei para o único lugar onde ainda me sinto viva: junto dos meus beija-flores.
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Atualizado até capítulo 48
Comments
Sol Oliveira
/Slight//Smug//Sweat/ Deve ser terrível viver assim, casar com quem nem conhecemos e ainda ser prometida pelos pais ainda criança...mais se lá é assim se deve respeitar.
Ele vai ganhar o coração dela.
/Chuckle//Chuckle//Chuckle/
2025-08-02
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Jabass Silva
Eita ele caiu como uma luva na vida dela , ela quer perder a vingidade e vai ser com ele, repara o que eu tô dizendo
2025-06-20
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Andréa Debossan
Será que vai ser com ele? Pois eu acho que ela vai se apaixonar por ele sem saber quem ele é
2025-07-09
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