Depois de me despedir de dona Charlotte, voltei para casa com a cabeça cheia. A proposta dela fazia sentido. Seria uma forma de ganhar dinheiro e, de quebra, me manter ocupada até juntar o suficiente para ir embora. Ainda assim, algo dentro de mim hesitava.
Montar de novo, depois de tantos anos?
A ideia me assustava.
Mas não podia negar que uma parte de mim sentia saudade daquele mundo.
Na hora do almoço, sentei-me à mesa com meus pais, e entre uma garfada e outra, decidi contar sobre o emprego.
— Dona Charlotte me ofereceu um trabalho na fazenda Primavera. Como professora de montaria.
Minha mãe parou no meio do movimento de levar a colher à boca e arregalou os olhos.
— Sério? Isso é maravilhoso, Emma!
— Acho que pode ser bom para você, filha — meu pai concordou.
— Só quero deixar claro que é algo temporário. — Cruzei os braços. — Só até eu juntar dinheiro suficiente para voltar para Seattle.
O entusiasmo deles diminuiu um pouco, mas não tanto.
— Só de ver você fazendo algo que gostava já é uma vitória — minha mãe comentou, sorrindo.
Engoli um pedaço de carne e me concentrei no prato.
Talvez ela tivesse razão.
Depois do almoço, peguei o carro e segui em direção à fazenda. A estrada de terra era conhecida, e o caminho, ainda que ligeiramente modificado pelo tempo, parecia o mesmo. As árvores altas e o cheiro de campo me trouxeram lembranças que tentei ignorar.
E então, ao avistar a porteira com o letreiro “Fazenda Primavera”, percebi que estava de volta.
Depois de dez anos, ali estava eu de novo.
Uma nova mulher.
O portão foi aberto por um peão, um homem alto e forte, vestindo um chapéu surrado e uma camisa de manga dobrada nos cotovelos.
Abaixei o vidro do carro e sorri.
— Boa tarde!
Ele me olhou com curiosidade, como se tentasse me reconhecer.
— Boa tarde, moça. Posso ajudar?
— Sou Emma. Dona Charlotte me contratou.
O peão abriu um sorriso amigável e assentiu.
— Ah! Então você é a Emma! Seja bem-vinda de volta. Pode seguir em frente, dona Charlotte está lá no estábulo.
Agradeci e dirigi pelo caminho de terra que levava até as instalações da fazenda. O lugar parecia bem-cuidado, com cercas novas e pastos verdes a perder de vista. O cheiro de feno e cavalo me atingiu assim que estacionei o carro perto do estábulo.
Respirei fundo antes de sair.
O barulho de cascos ecoava pelo ar, misturado ao relinchar dos cavalos e ao som de vozes ao longe.
E então, lá estava ela.
Dona Charlotte, com sua calça jeans e blusa de manga longa, dando ordens a um jovem domador que segurava um potro inquieto.
Quando me viu, abriu um sorriso satisfeito.
— Chegou rápido!
— Tinha medo de mudar de ideia — brinquei, fechando a porta do carro.
Ela riu.
— Vamos ver se ainda lembra de alguma coisa.
Olhando para os estábulos, senti uma onda de nostalgia.
— Está tudo diferente — comentei.
— O tempo passa, minha querida. Mas algumas coisas nunca mudam.
Ela me guiou até uma das baias, onde um cavalo castanho com uma faixa branca no focinho nos observava.
— Este é o Estrela. Um dos nossos melhores cavalos para iniciantes.
Aproximei-me devagar e passei a mão pelo pescoço do animal. O cheiro dele me atingiu em cheio, trazendo lembranças de quando eu passava horas nesses mesmos estábulos, treinando, cuidando dos cavalos, sonhando com competições.
— Ele é lindo — murmurei.
Dona Charlotte cruzou os braços.
— Vamos ver se ainda sabe montar.
Hesitei por um segundo, mas então assenti.
— Tudo bem.
Com a ajuda de um dos peões, preparei Estrela, sentindo os movimentos voltarem automaticamente, como se fossem parte de mim.
Assim que montei, percebi que dona Charlotte tinha razão.
Era como andar de bicicleta.
Eu nunca esqueci.
Com um leve toque dos calcanhares, fiz Estrela trotar pelo cercado. O vento bagunçou meu cabelo enquanto eu me ajustava à sela, sentindo os músculos trabalharem como antes.
Por um instante, um pequeno sorriso surgiu no meu rosto.
Talvez… só talvez… isso não fosse um erro.
Quando parei ao lado de dona Charlotte, ela me olhava com um brilho satisfeito nos olhos.
— Acho que encontramos a nossa professora.
Engoli em seco, ainda processando tudo, e então assenti.
— Acho que sim.
E naquele momento, percebi que, gostando ou não, Davall ainda fazia parte de mim.
Eu estava levando Estrela de volta para o estábulo ao lado de dona Charlotte quando percebi uma presença forte vindo em nossa direção.
Um homem alto, de postura rígida, vestindo botas de couro, calça jeans e uma camisa xadrez azul escura. Os cabelos eram curtos e escuros, combinando com a barba bem aparada. Mas o que mais chamava atenção eram os olhos verdes intensos, que me analisavam com um olhar frio e calculista.
— Você ainda lembra do meu sobrinho Dylan Collins? — perguntou dona Charlotte, com um tom animado.
Meus olhos se fixaram nele. Claro que lembrava. Quando éramos adolescentes, ele era um garoto rebelde, sempre com um sorriso travesso no rosto. Agora, parecia uma geladeira de tão frio.
— Parker. — Ele me cumprimentou secamente.
Ergui uma sobrancelha, cruzando os braços.
— Collins, quanto tempo.
Ele assentiu brevemente, mas a tensão no ar era quase palpável.
Dona Charlotte pareceu ignorar o clima estranho entre nós e continuou:
— Emma será a nova instrutora de montaria da fazenda.
O olhar de Dylan se estreitou.
— Ela vai?
— Sim. — Dona Charlotte cruzou os braços. — E eu espero que você colabore, Dylan.
Ele apertou a mandíbula, claramente contrariado, mas antes que pudesse responder, uma menininha apareceu correndo em nossa direção.
Ela tinha cachos dourados, olhos tão verdes quanto os de Dylan e vestia um vestidinho floral. Corria com tanta determinação que mal notei quando ela agarrou minha perna com força.
— Papai, papai! Essa é a mamãe?
Senti meu coração errar uma batida.
Dylan ficou rígido e, num piscar de olhos, puxou a garotinha para o colo.
— Não, Emy — disse ele, com a voz firme, mas sem rudeza.
A menina olhou para mim com curiosidade, os olhos enormes e brilhantes.
— Mas ela é bonita! — declarou com um sorriso travesso.
Dylan suspirou, parecendo derrotado, e lançou um olhar rápido para mim.
— Emma, essa é minha filha, Emily.
Demorei um momento para absorver a informação. Dylan Collins, pai? Isso era uma novidade e tanto.
Abaixei-me um pouco para ficar na altura dela e sorri gentilmente.
— Oi, Emily. Você tem um nome lindo.
A garotinha riu e escondeu o rosto no ombro do pai.
Dylan pigarreou.
— Precisamos ir. Foi um prazer, Parker.
E, sem dar espaço para mais conversa, ele virou-se e saiu com a menina nos braços.
Fiquei ali, observando a cena, ainda surpresa.
— Ele não mudou nada, né? — murmurei para dona Charlotte.
Ela apenas riu.
— Ah, minha querida… você não faz ideia.
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Atualizado até capítulo 51
Comments
Luisa Nascimento
Esse aí sim dá certo com ela.
2025-04-27
0
Ameles
tomara que ela não fique com o James
2025-04-05
2
Rosenilce Silva Ferreira
outro possível parceiro
2025-03-17
0