Eu achei que encontrá-lo não me abalaria tanto. Afinal, já fazia dez anos. Dez anos de distância, de experiências novas, de tentativas de superar. Mas ali, parada no corredor do supermercado, com James a poucos passos de mim, tudo o que achei que tinha enterrado começou a florescer de novo.
E para piorar, ele percebeu.
Havia algo diferente no olhar dele, algo que eu nunca tinha visto antes. Como se estivesse me vendo pela primeira vez, realmente me vendo. Não como a irmãzinha do seu melhor amigo, não como a garota boba que costumava segui-lo com olhos apaixonados, mas como uma mulher.
E pior ainda? Ele estava flertando comigo.
O jeito que inclinou a cabeça levemente, o meio sorriso que surgiu no canto da boca, a forma como seus olhos desceram por um breve segundo pelo meu corpo antes de voltarem aos meus olhos. Eu reconhecia aquele olhar.
Mas eu não ia cair nessa.
Respirei fundo, endireitei os ombros e forcei um sorriso casual.
— Bom te ver, James — disse, pegando uma caixa de leite da prateleira. — Mas preciso ir. Minha mãe está me esperando com as compras.
A expressão dele mudou, como se não esperasse que eu encerrasse a conversa tão rápido. Mas ele apenas assentiu, ainda com aquele sorriso de canto.
— Claro. Não vou te segurar. Mas... — Ele hesitou por um segundo antes de continuar. — A gente devia sair pra tomar um café qualquer dia desses. Colocar o papo em dia.
Tomei um segundo para absorver aquilo. James querendo passar um tempo comigo? O mesmo cara que uma década atrás fez questão de deixar claro que eu era um erro?
Soltei uma risada curta, sem humor.
— Café? Você nunca foi do tipo que toma café comigo, James.
Ele levantou uma sobrancelha, como se aceitasse o desafio.
— Bom, as coisas mudam.
— Algumas coisas, sim — respondi, me virando antes que ele pudesse ver a bagunça que minha mente estava naquele momento.
Eu saí dali sem olhar para trás, mas mesmo enquanto andava pelo mercado, podia sentir seu olhar me acompanhando.
Minha mãe estava descarregando as sacolas do carro quando cheguei ao estacionamento. Assim que me viu, parou o que estava fazendo e estreitou os olhos para mim.
— O que houve?
Me forcei a sorrir e balancei a cabeça.
— Nada.
— Você está pálida.
— Mãe, eu sou naturalmente pálida.
Ela não parecia convencida, mas não insistiu. Apenas pegou as últimas sacolas e seguiu para o carro. Eu a ajudei a colocar tudo no porta-malas e, assim que entrei no banco do passageiro, suspirei fundo.
Não fazia nem vinte e quatro horas que eu estava em Davall e já estava prestes a enlouquecer.
Minha mãe dirigia pela estrada que cortava a cidade, e tudo ali parecia... pequeno. Depois de anos vivendo em Seattle, Davall parecia uma miniatura de cidade, com suas ruas calmas, as mesmas lojinhas, as mesmas casas. Era como se o tempo tivesse parado.
— Você vai querer ir ao jantar na casa do seu irmão amanhã? — minha mãe perguntou, quebrando o silêncio.
Fiz uma careta.
— Preciso mesmo?
— Ele quer ver você lá, Emma. E as crianças estão animadas.
Suspirei. Eu adorava meus sobrinhos, e Davi, apesar de irritante, era meu irmão.
— Tudo bem, eu vou.
Ela sorriu satisfeita e voltou a atenção para a estrada.
Quando chegamos em casa, me joguei no sofá da sala e tentei relaxar. Mas minha mente continuava presa no supermercado.
No olhar de James.
Na maneira como ele sorriu para mim.
Na sugestão casual de um café.
Eu estava prestes a enlouquecer de novo.
No dia seguinte, me arrumei para o jantar na casa do meu irmão. Vesti uma blusa simples de mangas compridas, jeans confortáveis e prendi o cabelo em um coque bagunçado.
Davi morava a algumas ruas da casa dos nossos pais, em um bairro tranquilo. Sua casa era espaçosa, com um quintal grande onde as crianças adoravam brincar.
Assim que toquei a campainha, a porta se abriu e fui recebida por um furacão de crianças.
— TIA EMMA! — gritaram em uníssono, pulando em cima de mim.
Rindo, abracei meus dois sobrinhos e minha sobrinha, tentando me equilibrar enquanto eles se penduravam em mim como pequenos macacos.
— Ok, ok, eu amo vocês também — disse, bagunçando os cabelos deles.
Davi apareceu na porta, os braços cruzados e um sorriso no rosto.
— Você sobreviveu à primeira onda. Parabéns.
Revirei os olhos e entrei, sendo imediatamente recebida pelo cheiro de comida caseira.
A esposa do meu irmão, Marina, veio da cozinha com um avental sujo de molho e um sorriso caloroso.
— Emma! Que bom que você veio!
— Como eu poderia recusar um jantar de boas-vindas? — brinquei, abraçando-a.
Ela sorriu e nos guiou até a mesa, onde a comida já estava servida.
O jantar foi... confortável. Familiar. Por um momento, me permiti esquecer tudo o que estava me atormentando.
Até que Davi resolveu abrir a boca.
— Então, já encontrou alguém da velha turma por aí?
Minha mastigação desacelerou.
— Alguns — respondi vagamente.
Ele estreitou os olhos.
— Tipo quem?
Suspirei. Eu deveria mentir? Mas qual seria o ponto?
— James — murmurei, fingindo indiferença.
O garfo de Davi parou no meio do caminho.
— James?
— Sim, Davi, James. O seu melhor amigo?
Ele franziu a testa.
— E como foi?
— Como sempre. Conversamos um pouco e segui meu caminho.
Davi me encarou por um momento antes de assentir lentamente.
— Só tome cuidado.
Arqueei uma sobrancelha.
— Cuidado com o quê?
Ele bufou.
— Eu conheço o James, Emma. E ele não é exatamente o cara mais confiável quando se trata de sentimentos.
Me segurei para não revirar os olhos.
— Relaxa, Davi. Eu não sou mais uma garotinha apaixonada por ele.
Ele não pareceu convencido, mas deixou o assunto morrer.
Ou pelo menos tentou.
Porque foi exatamente nesse momento que a campainha tocou.
E quem estava do outro lado da porta?
James.
Com uma garrafa de vinho na mão e aquele maldito sorriso de canto.
Davi foi quem atendeu e, ao vê-lo, cruzou os braços e estreitou os olhos.
— O que você está fazendo aqui?
James ergueu a garrafa.
— Marina me convidou.
Davi lançou um olhar acusador para a esposa, que deu de ombros.
— Ele é seu amigo, achei que fosse natural chamá-lo.
Eu queria sumir.
James entrou, olhou ao redor e então seus olhos encontraram os meus.
E ali estava de novo.
O olhar.
Aquele que dizia que ele me via agora. Que me via de verdade.
Aquele que dizia que, para ele, eu já não era só a irmãzinha do melhor amigo.
Engoli em seco.
Eu precisava sair dali.
Mas, de alguma forma, sabia que fugir dessa vez não seria tão fácil.
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Atualizado até capítulo 51
Comments
Laura Valério
Afff tô ficando com raiva dessa menina, parece que 10 anos fora não saiu do lugar.
2025-04-21
0
Luisa Nascimento
Se ainda cair na dele é porque não presta e merece sofrer. ele não teve nenhuma consideração por você.
2025-04-27
1
Onilda Furlan
fugir pra onde???
cidade pequena uns tropeçam nos outro kkkk
2025-03-15
1