Destinado Seja Teu Amor A Mim

Destinado Seja Teu Amor A Mim

Capítulo 9

...Capítulo Nove...

...***...

Aveline mal registravam onde seus sequestradores a levavam. Apenas viu as sombras noturnas dançarem sob as copas enquanto o corcel cavucava o passo. Sentia o corpo pesar sobre a garupa do corcel, os acontecimentos daquele dia tomaram seus últimos resquícios de força. A noite caía sobre a mata fechada sem que pudesse pressentir o destino que lhe aguardava.

Após horas pareceram eras nas sombras da floresta, os pinheiros começaram a clarear. Logo avistou-se uma ampla clareira à luz da lua nova. Lá se estendia um acampamento que fervilhava de movimentado ir e vir de guerreiros mascarados, que afiavam espadas, selavam cavalos ou dialogavam em sussurros estridentes. Sobre a luz do fogo, suas longas capas cinzentas lembravam as asas de um enxame de morcegos sob a lua minguante.

Quando desmontaram, dois homens a ampararam com delicadeza e a conduziram até o centro da clareira. Lá avistou uma tenda maior, de tecidos mais nobres, com bandeiras desconhecidas penduradas.

"Dentro encontrará descanso, Alteza."

Mesmo exausta, Aveline ainda nutria receios. Observou em volta e só enxergou estranhos de armaduras prateadas sob a luz dos archotes, e mais além, os cercando como um exército, a densa mata fechada que escondia seus segredos.

O medo e a desconfiança em seu peito lutavam para dominá-la. Mas o que mais poderia fazer, senão ceder ao inexorável?

Cruzar o tecido de entrada foi como mergulhar em um mar de incertezas. Seus olhos demoraram a se acostumar à penumbra após o calor das fogueiras. Em um canto, apenas, enrolou-se sobre si mesma, abraçando o vestido como um escudo frágil.

Lá fora, os ruídos do acampamento soavam como ecos distorcidos de um mundo que não lhe pertencia mais. Aveline fechou os olhos, mas nenhum descanso encontraria em meio àquelas sombras.

O medo perfurava o peito de Aveline como garras afiadas. Encolhida em seu canto, seu olfato ainda captava os resquícios da festa lá fora - carne assada, vinho derramado, canções alegres em outro idioma.

Porém, entre as dobras do tecido podia escutar também outras vozes, carregadas de uma ânsia selvagem que faziam seus pelos se eriçarem. Homens bêbados expressando seus anseios mais vis primitivos, rindo de modo obscenos aos gracejos de camaradas.

Seria aquela a sorte que lhe aguardava quando a noite findasse? Ou coisas ainda piores poderiam acontecer quando a última fogueira se apagasse? A mente da princesa recusava-se a imaginar tais cenários, mergulhando em uma névoa feverosa para escapar da crua realidade.

Mas os ruídos do acampamento pareciam querer arrancá-la daquele delírio, amedrontando ainda mais seus sentidos abalados. O cheiro de carnes assadas entorpecia sua fome, porém o medo é que a dominava.

E se alguns daqueles selvagens viessem em sua procura, impulsionados pelas trevas do álcool e da lascívia? Seria melhor ficar acordada no escuro, tremendo sob as dobras do vestido, do que cair nas garras da desordem alheia sem meios de se defender. Nunca a liberdade lhe pareceu tão distante.

As horas se arrastaram exaustivas. Aveline acordou sobressaltada com passos próximos. Um cavaleiro depositou comida e água ante ela, afastando-se logo em seguida. Seu estômago roncou, mas receio da comida a impediu de tomar. Apenas observou o reflexo tímido das velas nas paredes da tenda. Havia baús, caixas e uma cama arrumada de forma displicente. Tudo indicava ter sido montado às pressas.

Num dos baús, sob a luz das velas cintilantes, um brasão recortado em couro chamou sua atenção. Um corvo negro sobre fundo azul - reconheceu tê-lo visto antes, embora nem soubesse mais de quem.

Seu reino cortara laços com tantos nobres nos últimos anos, sob a égide de seu pai. Mas quem quer que ocupasse aquele lugar parecia ter alto grau, se julgava pelos pertences.

Seriam aliados? Inimigos? Nada ficara claro desde que fora tirada dos braços de sua vida passada. Sob os parcos móveis, apenas as dúvidas para acompanhá-la naquela longa noite de incertezas.

Aveline foi tirada de seus pensamentos ao ouvir passos pesados se aproximando. O som metálico de placas de armadura ecoou, fazendo sua alma gelar. Rapidamente, correu para se esconder atrás de alguns baús, colocando a mão na boca para abafar a respiração ofegante. Se encolheu no chão, tremendo.

Do outro lado da tenda, os passos pararam. Ouviu farfalhar de tecidos, como se alguém removesse a proteção de metal. Em pânico, Aveline se encolheu ainda mais no escuro, orando para passar despercebida.

"Aveline?"

Uma voz grave soou atrás do esconderijo, seu coração já batia descompassado demais. Quando os passos se aproximaram novamente, ela se encolheu em posição fetal, apertando os joelhos com força. Sentiu a presença parar bem em sua frente, porém estava aterrorizada demais até mesmo para abrir os olhos. Quem quer que fosse, seu destino estava nas mãos do desconhecido.

"Sou eu. Não precisa ter medo." Sua voz soou calma, quase um sussurro.

Aveline estava paralisada. Sua visão se negava a enxergar além da escuridão dos próprios pensamentos. Quando ouviu aquela voz calma chamar seu nome, foi como se pudesse respirar novamente depois de muito tempo submersa.

Lentamente, abriu os olhos marejados e sua vista começou a se acostumar com a penumbra. Uma silhueta se delineava diante dela, ajoelhada.

Reconheceu então as placas negras polidas e a capa azul marinho - era ele, o misterioso homem do casamento. Porém, sem o elmo, podia agora enxergá-lo com clareza.

Uma face jovem de traços nítidos a fitava com intrigante brandura. Cabelos castanhos desalinhados caiam sobre os olhos verdes como esmeraldas, que ostentavam um sorriso cordial. Suas feições eram familiares. E como em um passe de mágica, as memórias esmaecidas vieram à tona. Anos atrás, entre risos e aventuras de infância, um menino estrangeiro que passara uma temporada em seu reino.

E agora tal sorriso a fitava outra vez, porém sob circunstâncias tão distintas. Aveline estava confusa, sem saber se devia sentir medo ou alegria pelo reencontro inesperado após tanto tempo. Apenas fitava o novo desconhecido que tão bem conhecera já.

"Agora se lembra de mim?" perguntou ele.

"Louis... de Provence."

"É bom revê-la, Aveline"

O olhar de Aveline passeava pelas feições de Louis, tentando em vão encontrar respostas para tamanhas coincidências. Ele percebeu seu desconcerto e sorriu de leve.

"Quando soube que iria se casar, eu surtei. Não podia deixá-los aprisionar a liberdade da princesa que um dia conheci."

Quando Louis recebeu a correspondência de Relish naquela manhã, um frio percorreu sua espinha. Embora o reino estivesse rompido com os vizinhos há anos, nunca deixava de ficar atento aos seus desdobramentos.

Com dedos trêmulos, quebrou o selo de cera e correu os olhos pelas linhas do pergaminho. Foi como se uma lâmina gélida rasgasse seu peito. O "casamento" entre Aveline e Lorde Albert não passava de uma farsa para selar algum acordo sombrio.

Ele se lembrou do sorriso gentil e olhar doce de Aveline nas poucas vezes que a vira no castelo, quando criança. Ela merecia bem mais do que ser sacrificada em um arranjo político sórdido. Em um impulso, amassou a carta e a atirou na lareira, vendo-a se desmanchar em brasas crepitantes. Passou o resto do dia trancado em seu quarto, absorto em pensamentos tormentosos.

Quando o sol se pôs, desceu para o jantar ainda em silêncio. Seu pai, notou de imediato a sombra em seu semblante, aquele brilho perigoso em seus olhos esmeralda. Certamente a notícia não o agradara.

Ao anoitecer, houve uma batida nervosa na porta. Era Pierre, o conselheiro real, que entrou ofegante no aposento.

"Meu senhor, vosso filho está reunindo homens e armou as tropas! Parece que vão partir rumo a Relish ainda nesta noite."

Jacques, até então com ar despreocupado, apenas deu de ombros.

"Já era esperado. Louis veio falar comigo há algumas horas."

"O quê?!" exclamou Pierre, atônito. "Vossa Alteza não irá impedi-lo? Uma incursão armada em solo alheio pode provocar um conflito! Isso pode causar um incidente diplomático com Relish!"

"Já cortamos relações com aquele reino há muito tempo. Confio no julgamento do meu filho. Se ele considera certo intervir naquele casamento, deve ter seus motivos."

Não muito depois, ouviram galopes na distância se afastando aos gritos de guerra. Jacques apenas observou pela janela com um meio sorriso, orgulhoso.

Baixar agora

Gostou dessa história? Baixe o APP para manter seu histórico de leitura
Baixar agora

Benefícios

Novos usuários que baixam o APP podem ler 10 capítulos gratuitamente

Receber
NovelToon
Um passo para um novo mundo!
Para mais, baixe o APP de MangaToon!