Capítulo 1
O coração dela ainda estava acelerado.
— Aff… o que está acontecendo comigo? — murmurou Natália, encostando a cabeça no volante por alguns segundos antes de ligar o carro.
Tentou respirar fundo, mas tudo o que conseguia lembrar era do toque acidental das mãos. Aquele olhar intenso, a voz firme com sotaque estrangeiro e o jeito sério do tal Don-Yon ainda a deixavam desconcertada.
— Calma, Naty. Foi só uma entrega. Só uma entrega… — repetiu para si mesma, tentando convencer o próprio corpo a relaxar.
O trânsito estava um caos. Era hora do rush em Florianópolis, e as buzinas pareciam disputar quem seria mais irritante. Se não fosse aquela confusão na empresa, ela já estaria em casa tomando banho e descansando os pés cansados.
O celular começou a tocar. Ela ativou o viva-voz, sem tirar os olhos da rua.
— Pronto?
— Naty, onde você tá? — perguntou uma voz animada do outro lado da linha.
Era Paloma, sua melhor amiga desde sempre — e praticamente sua confidente em tudo.
— Parada no trânsito, por quê?
Natália já desconfiava do motivo.
— Vamos beber? — sugeriu Paloma, empolgada. — Você lembra que dia é hoje, né?
Natália sorriu de canto. Lembrava, sim. Era o aniversário de amizade delas — dez anos de cumplicidade, risadas e desastres compartilhados.
— Ah, Paloma… no meio da semana? Amanhã acordo às cinco pra arrumar a Manu pra escola.
Sua mãe era cuidadora e dormia no trabalho, então Natália cuidava da irmã mais nova todas as manhãs.
— Claro que sei — respondeu Paloma — mas eu tô precisando. O dia no mercado foi um caos.
Paloma trabalhava como subgerente em um supermercado do bairro, e sempre dizia que cada plantão a envelhecia cinco anos.
Natália riu, exausta. — Pensando bem, eu também mereço um copo. Te encontro lá.
— Isso! Até daqui a pouco, mulher! — vibrou Paloma antes de desligar.
Natália soltou um suspiro. O dia tinha sido um desastre completo. Talvez um pouco de conversa e uma cerveja gelada ajudassem a esquecer a vergonha que tinha passado na DonCosméticos.
🌻🌻🌻
O bar era o ponto de encontro da Vila Esperança, um bairro simples, mas cheio de vida. As mesas de madeira estavam ocupadas por vizinhos, risadas e música baixa ao fundo.
Natália estacionou e procurou Paloma com o olhar. A amiga já estava lá — e não estava sozinha.
O estômago de Natália deu um salto quando reconheceu o rapaz sentado ao lado dela. Thiago, o irmão mais velho de Paloma. O mesmo por quem ela suspirava desde os doze anos.
— O que será que ele tá fazendo aqui? — murmurou, ajeitando o cabelo, mesmo sabendo que o vento já tinha bagunçado tudo.
Thiago fazia faculdade de Administração à noite. Era raro encontrá-lo por ali. E, sinceramente, ela não estava preparada para vê-lo naquele dia.
Assim que se aproximou, ele a notou.
— Olha só, quem é vivo sempre aparece — brincou, com aquele sorriso que deixava qualquer um sem ar.
Natália fez uma careta para disfarçar o nervosismo. — Ah, ah, ah… deixa de ser besta.
— Cresceu, mas continua a mesma grosseirona de sempre — provocou ele, rindo.
— E você, o mesmo metido! — respondeu, mostrando o dedo do meio.
Paloma deu uma risadinha. — Que coisa feia, Naty! — disse, mas se divertia com a cena.
— Paloma — resmungou Natália, cruzando os braços — o que esse jumento tá fazendo aqui?
— Calma, garota! — respondeu a amiga. — Ele veio comemorar com a gente.
Thiago abriu um sorriso e Naty sentiu as pernas ficarem bambas. Rapidamente desviou o olhar, tentando parecer indiferente.
— Comemorar o quê? — perguntou, chamando o garçom e pedindo uma cerveja.
— Ele conseguiu uma vaga na DonCosméticos — contou Paloma, orgulhosa.
O coração de Natália deu um pulo.
— Sério? Lá é superdifícil de entrar!
— Sim — respondeu Thiago, encurtando o assunto.
— A moça que ele tá namorando trabalha lá — completou Paloma, sem perceber o golpe que dava na amiga — e foi ela quem ajudou ele a conseguir. Mamãe tá superfeliz!
Natália ficou imóvel por alguns segundos. A palavra “namorando” ecoou na mente dela como uma martelada.
— Ah… que legal. Fico feliz por você, Thi — conseguiu dizer, forçando um sorriso.
Ele agradeceu com um aceno simples, sem notar o quanto aquilo a afetava.
Natália abaixou a cabeça, fingindo brincar com o rótulo da garrafa. O amor que guardava por ele desde a infância nunca passaria disso: um sentimento silencioso, unilateral.
“Amor platônico”, pensou. “A pior invenção do mundo.”
— Bem, então vamos beber! — disse Thiago, tentando quebrar o clima.
— Vamos! — respondeu Natália, erguendo o copo.
E bebeu. Um copo, depois outro, até perder a conta. A última lembrança que teve naquela noite foi do sorriso de Thiago — e da sensação amarga de saber que ele nunca seria dela.
Quando acordou no dia seguinte, nem lembrava como tinha chegado em casa.
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Atualizado até capítulo 57
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