...HORAS ANTES… ...
...(PARTE TRÊS)...
— GUTO? — QUANDO CHEGUEI NA porta da casa, ele pediu para que eu subisse direto. Tranquei a porta antes. Assim que cheguei no que parecia ser uma sala de estar, com um sofá de três lugares e duas poltronas, estava tudo escuro. — Cadê você?
Dei uma volta e pude notar a cozinha ali perto e dois quartos. Ele morava sozinho e usava apenas um deles. Olhei mais um pouco a sala organizada — não era grande, tampouco minúscula. Assim que fiquei olhando para os múltiplos quadros na parede azul escuro, senti os braços dele na minha cintura.
— Você veio — sussurrou, beijando o meu pescoço. — Coisa linda.
— Quase me mata de susto, garoto — reclamei, brincando. Me virei de frente e ele estava nu. Olhei mais abaixo. — Parece que alguém já está no ponto aqui.
— E pronto também — ele me agarrou. — Quero você.
— Mostre-me, então.
Nos beijamos lascivamente até chegar na cama, com ele deixando as minhas roupas no chão.
DEPOIS DE ATINGIR o terceiro ápice, fiquei com a cabeça repousada no peitoral largo dele — ambos exaustos, suados e ofegantes.
— Me fale mais um pouco sobre você — ele beijou o alto da minha cabeça. Aquilo, de alguma forma, mexeu um pouco comigo. Me pegou desprevenido.
— Você acha que eu tenho dignidade o suficiente para falar de mim neste exato momento? — brinquei. Ele deu uma gargalhada alta.
— Por quê? Hein? — Ele fazia círculos com o dedo nas minhas costas.
— Eu estou acabado, meu anjo — dei uma risadinha, beijando o peitoral dele. — Culpa sua.
— Ah, culpa minha… — Ele me apertou, dando mais um beijo no meu cabelo. — Mas você gostou. Eu sei.
— Convencido.
— Vamos tomar banho, comer alguma coisa e sair por aí? — Propôs ele.
— Que programação... — brinquei, mordiscando meu lábio. — Vamos.
A GENTE PREFERIU COMER FORA, perto da praia. Chegando lá, nos sentamos na beira — onde tinha pouca luz e menos gente. Queríamos um pouco de privacidade para brincar um com o outro. Olhei o horizonte escuro, recostado em seu corpanzil. Seu queixo repousava no alto da minha cabeça. Estávamos num clima bem íntimo.
— Então quer dizer que você cresceu na Igreja, tem uma mãe extremamente religiosa e que não se conforma com a sua saída de lá? — Contei sobre a minha vida para ele.
— Exato — brinquei com os dedos dele. — E ainda me deu uma ordem de despejo para sair de casa.
— Caramba. Mulher louca — seu tom era sério. — Desculpe. Eu sei que é a sua mãe e tudo mais…
— Não precisa se desculpar — beijei a mão dele. — Você está certo. Ela é louca mesmo. Apesar de ser a minha mãe.
— Que dilema, garoto.
— Pois é. Mas vou conseguir resolver tudo isso.
— Vai sim — ele beijou a minha testa. — Tudo vai ficar bem pra você. E se der ruim, pode ficar na minha casa.
Houve um momento de silêncio, porque fiquei surpreso com a proposta.
— Eu falei sério, viu? — Guto disse.
— Eu sei — olhei para o horizonte escuro.
— E aí? Decidiu onde vai morar?
— A partir de segunda começo a procurar. Mas tenho umas ideias de onde vou querer ficar…
— Entendi…
— E você? — Olhei para ele. — Além de trabalhar como segurança de hotel que interditou um banheiro só para me pegar, o que você faz da vida?
— Ah… — Ele olhou para baixo e depois para mim. — Você deve ter visto o meu gosto por games e algo parecido, certo?
— Sim. Acho interessante.
— Eu tranquei a minha faculdade de T. I. — Ele fez uma pausa. — Tem mais ou menos um ano. Eu não morava aqui.
— Morava onde?
— Porto Alegre.
— E veio morar aqui.
— Sim. Fui expulso de casa. Meu pai me pegou no flagra, bem na hora H com um carinha.
— Meu maior medo — confessei.
— Pois é — ele ficou pensativo. Mas depois brincou: — Não recomendo levar alguém pra casa dos pais e trepar.
— Jamais faria isso. Minha mãe me matava.
— Meu pai quase fez isso. Mas minha mãe preferiu que eu fosse embora. Estou aqui até hoje, morando naquela casa lá. Minha vida ainda está se ajustando, se é que me entende.
— Entendo — falei. Beijei o rosto dele. — Você quer voltar a fazer T. I. então?
— Se der certo, ainda este ano. Falta um semestre.
— Não é tão ruim — falei.
— Não. Não é.
Ficamos em silêncio até que nos beijamos demoradamente. A brisa era fria e ao mesmo tempo uma delícia.
— Quer comer alguma coisa? — perguntou.
— Sorvete.
Saímos dali de mãos dadas para a sorveteria.
CHEGUEI EM CASA às dez da noite. Assim que fiz menção de subir as escadas, direto para o quarto, vi a minha mãe na poltrona. A TV estava desligada.
— Senta — isso não foi um convite.
— O que foi?
— Apenas senta aí. Agora. — Minha mãe era transparente o bastante para que eu notasse a tentativa dela em manter o próprio controle.
— Tá — me sentei no sofá. — O que aconteceu?
Ela ficou me encarando. O silêncio parecia cada vez mais matador na medida que os segundos passavam.
— Até quando você pretendia esconder de mim? Aliás, mentir pra mim?
— Do que a senhora está falando?
— Não seja cínico, Orlando — ela censurou.
— Mas sobre o quê, exatamente?
Pude ver os olhos dela começando a lacrimejar. Lá dentro, senti que cheguei no fim da linha. Senti que já era tarde demais. Teria que esperar, agora, por todas as consequências possíveis.
— Eu pensei que o meu maior desgosto seria nunca mais te ver dentro da Igreja — começou ela. — Desde que você era pequeno, entreguei a sua vida nas mãos de Deus. Prometi a ele que você apenas seguiria a vontade d’Ele. Sabe por que eu fiz isso? Porque não queria te ver nesse mundo aí, perdido. Pecando. Vivendo na degradação. Como é a sua vida agora. Não venha me convencer do contrário. Quem está errado aqui é você.
— Eu estou seguindo o livre arbítrio que você mesma me negou — atirei.
— Como é? — ela ficou horrorizada. — Eu neguei?
— Negou — fiz uma pausa e continuei: — Sabe por que você negou? Desde o começo, você me fez ser a sua projeção. Usou o nome de Deus como desculpa para que eu pudesse seguir, bem direitinho, tudo aquilo que você queria que eu fizesse. Eu só fiz por achar que estava seguindo o caminho certo...
— Você estava seguindo um caminho certo — ela me interrompeu. — Estava! Eu te eduquei, orientei, gastei muito tempo orando pela tua vida para que você pudesse ficar nos Caminhos do Senhor, meu filho. E olha o que você me fez… — ela começou a chorar.
— Eu só fiz a minha escolha — me segurei para não chorar de raiva. — Minha escolha.
Houve um momento de silêncio.
— Você não se arrepende disso, não? — senti uma pontada de esperança na voz dela. Mas, no fundo, ela sabia que era em vão. — Não sente vontade de voltar? Volta enquanto é tempo, meu filho…
— Não — fiz uma pausa e reforcei. — Não sinto arrependimento algum.
Ela continuou me olhando, horrorizada. Enxugou as lágrimas, respirando devagar.
— Você também não se arrepende de ter virado gay? De ficar por aí, de safadeza, beijando homem escondido na praia? — senti o nojo na voz dela.
— Quem te disse isso? — tive que respirar fundo para não tremer.
— Não interessa — a voz dela era mais cortante do que nunca. — Como se não bastasse o desgosto que você me deu ao sair da Igreja, ainda tem… Ainda tem essa aberração?!
Ela se levantou para andar de um lado para o outro, na sala.
— Agora eu me pergunto onde foi que eu errei — ela chorava. — Onde foi que eu errei com você!? Meu Deus! Eu me dediquei tanto, mas tanto! Queria que você fosse tantas coisas grandes dentro da vida que abriu mão… Mas você jogou tudo no lixo, Orlando! Sua vida espiritual está no lixo!
Fiquei de pé e rebati:
— Eu quebrei as correntes que você pôs em mim. É diferente.
— Você está acorrentado e cego — vociferou ela. E exortou: — O pecado enraizou tanto no teu ser a ponto de pensar que o errado é certo e o certo é errado.
— O meu conceito de certo e errado é bem diferente do seu — rebati.
— Tomara que pegue uma doença e morra, só pra aprender que o salário do pecado é a morte.
— Espero que você morda a sua língua antes de rogar esse tipo de barbaridade — meu tom de voz foi incisivo.
— Gay, Orlando? — Ela fez cara de choro e nojo. — Gay?
— Sempre fez parte da minha natureza. Eu nasci e cresci assim.
Ela me deu um tapa na cara. Bem forte.
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Atualizado até capítulo 60
Comments
Tania Maria Rufino
O conceito de Jesus dela é bem diferente do verdadeiro. 😞
2024-09-08
0
João Daniel
que velha desgraçada, rogando praga pro próprio filho!
2023-11-20
3
Jessy Navarro
Perece surreal mas infelizmente muita gente passa por isso. Ouvir essas palavras.
2023-01-17
3