Four

MAIY

   Ele se foi.

   Meus olhos o observam. Um pensamento surge, envolvendo o que aconteceu hoje. A briga entre o Lucas e o Eric. O que deu nele? Lucas perdeu, totalmente, a cabeça!

   A Larissa. Não lembrava. Espero que ela não tenha se incomodado por eu ter ido embora, sem ela.

   Quando não o vejo mais, resolvo ir embora. Afinal, o que eu faria ali? Esperaria ele voltar? Sei que ele não vai voltar. Então, vou embora, também.

   Alguns minutos depois, chego em casa, finalmente.

   Vou direto para o banheiro. Quero ficar um bom tempo na banheira!

***

   Acabei de passar pela porta, depois de um longo dia de trabalho.

   — Cheguei! — exclamo, como se esperasse alguém dizer: “Bem-vinda de volta!”

   Deixo minhas chaves na mesa. Vou até à cozinha.

   — Rick? Você está por aqui? — o procuro, mas não o vejo em parte alguma.

  Ele deve estar lá fora…

   Como não encontro meu adorável amigo, resolvo ir tomar um bom banho.

   Após sair do banheiro, e me vestir, vou novamente para a cozinha. Estou faminta!

   Depois de ter saciado minha fome, vou para a sala de estar, assistir.

   Estou assistindo algo interessantíssimo. Um anime. Tenho uma paixão súbita por animes. Eles me fazem esquecer, um pouco, a realidade em que vivo.                  Sinceramente, com o passar dos dias, eu me sinto cada vez mais perdida. Estou afundando, me perdendo, em dias sem vida. Estou apenas… sobrevivendo.

   De repente, meu celular começa a tocar. Alguém está me ligando. Pego, imediatamente, o celular e encaro a tela.

   — Dan! — exclamo. Surpresa. — Como posso tê-lo esquecido? — atendo, imediatamente.

   — Ah, finalmente! — Dan diz, mostrando inquietação na voz. — Estou ligando pra você há horas! Pensei que havia acontecido algo grave! — sua voz demostra preocupação e alívio, ao mesmo tempo. Somos amigos, de longa data, como posso ter me esquecido dele? De conversar com ele?

   — Desculpe, hoje o dia foi corrido — é o que consigo dizer.

   — Entendi — diz, de forma suave. — Agora você tem tempo pra falar comigo? — sua voz soa como de uma criança que precisa de atenção. Que quer atenção!

   — Tenho! — afirmo. Sinto como se fosse alguém muito ocupada, que mal tem tempo para conversar com seu melhor amigo.

   — Como foi seu dia? — Dan pergunta, de forma mais casual. — Você já comeu? Aconteceu alguma coisa no trabalho? Ou na escola? Não esconda nada, hein!

   Ele me enche de perguntas. Você parece a tia Lane, às vezes — digo, em pensamento.

   — Meu dia foi igual aos outros… — balbucio, parecendo uma senhora de 80 anos, que já viveu bastante e tudo lhe parece monótono demais. Fico em silêncio, por um breve momento e depois, prossigo: — Já me alimentei. — olho para a TV, que está na minha frente. Como se quisesse estar no anime que, a poucos minutos atrás, estava assistindo. — No trabalho, normal. — sinto vontade de desligar. Falar sobre meu dia, meu trabalho… de mim, se tornou algo frustrante, incômodo. Mas não consigo dizer para ele que suas perguntas me incomodam, que não quero respondê-las.

   — E quanto a você? — minha vez de enchê-lo de perguntas, que na minha opinião, não deveria fazer, não só porque já sei as respostas, mas também, porque é algo desinteressante. — Já se alimentou? Como foi seu dia? Aconteceu algo interessante? — a “hora do interrogatório”, acabou. Finalmente.

   — Calma! — Dan diz, soltando uma risada. Que acho encantadora. Me impressiona como, apesar de ser quase um adulto, ainda tem a risada de uma criança que demonstrar estar feliz, pelo simples fato de existir, de estar ali.

   — Olha… — ele balbucia. — Meu dia foi legalzinho. — Ele sempre diz que seu dia foi “legalzinho”. Não me surpreendo com sua resposta. — Também já comi e não aconteceu nada interessante, hoje.

   Após ele acabar de falar, já não sei o que posso contar-lhe. Ou perguntar-lhe. Não sou o tipo de pessoa que arruma, facilmente, um assunto para discutir.

   Há um silêncio entre nós. Parece que, os dois, não tem mais o que falar. Até que, enfim, Daniel diz algo:

   — Bom, mas cê não falou nada sobre a escola… Aconteceu alguma coisa?

   Como ele...? Seu faro é impressionante! Ele sabe, percebe, quando estou tentando omitir algo dele. Mas meu esforço é inútil. Ele sempre percebe que algo está errado.

   — Maiy! — ele diz, demostrando que sabe que estou omitindo algo dele. — Fala logo!

   Para que esconder? Ele é meu melhor amigo, afinal.

   Suspiro profundamente, antes de abrir a boca e lhe contar tudo o que aconteceu hoje, na escola. Relembrando cada detalhe, me sinto enojada. Ainda não consigo compreender o motivo pelo qual o Lucas agiu daquele jeito. O considerava um amigo, alguém próximo de mim, pelo menos. Mas agora…

   Após terminar de contar ao Dan o que aconteceu. Percebo algo explodir dentro dele, um sentimento de raiva, revolta. Ele me vê como uma irmã, quer me proteger, tenho certeza disso. Sempre foi assim, desde que nos conhecemos. Ele tem cuidado de mim, me dando conselhos e… ele se preocupa comigo. Muito. Eu o vejo como um irmão mais velho. Alguém que eu realmente posso contar. Alguém que, pelo menos, acho, que estará sempre ao meu lado. “Sempre”. Existe mesmo algo eterno?

   — Eu já tinha dito que esse Lucas é um babaca! — exasperado, Dan diz. — Cê tem que me escutar, Maiy! Caramba! — ele não tenta esconder sua raiva. E pra que faria isso? Ele é alguém que deixa claro seus sentimentos. Admiro sua sinceridade.

   — Sei, sei… Desculpe! — digo. Sabia que ele iria dar uma de “irmão mais velho” e iria me dar uma bronca.

   — E esse Eric, hein? Finalmente serviu pra alguma coisa e te ajudou! — ele diz, mais calmo, agora.

   — Sim. Mas… temos um trabalho junto e ele, com certeza, vai agir daquele jeito, que sempre age, comigo.

   — Eu queria muito estar aí, quando essa cara inventa de agir igual um babaca com você! — sua voz sai irritada. — Sério, eu ia dar uma surra nesse cara!

   — Dan! — é tudo que digo. Não quero que ele brigue com o Eric, mas não sei como deixar claro isso. Porém, mesmo sendo péssima em demonstrar meus sentimentos, ele me compreende.

   — Pô, Maiy, cê é muito boazinha!

......................

   Um dia depois do “incidente”, cá estava eu, rumo a escola. Sendo sincera, estou um pouco nervosa. Não conversei com o Eric, desde ontem, e não sei como devo agir com ele e não sei como ele irá agir comigo. Talvez para ele o que fez não tenha tido tanta importância, mas para mim, teve. Sou, realmente, grata a ele. Eu deveria me importar tanto? Deveria acreditar que o que ele fez por mim, teve um significado? Devo acreditar que, por ele ter me ajudado, as coisas irão mudar agora? Ele irá me tratar melhor? Estava perdida em pensamentos, até que, ao fitar alguém que me chamou atenção, alguém que estava em minha frente, me trouxe para a realidade. Para o momento em que estamos e foi quando o notei. Eric?

   — É realmente o Eric? — pergunto para mim mesma, em um tom de voz que apenas eu consigo ouvir.

   Ele está indo sozinho para a escola, mas sempre que o vejo, ele está acompanhado. Será que ele brigou com Pedro e o Gabriel? — fixo meus olhos nele, o analisando. — Não. Não creio que ele tenha brigado com eles, mas…

   Fico pasma quando ele olha para trás, nossos olhares se cruzam. Desta vez, seu olhar não é de ódio ou nojo, ele me olha de um modo que não consigo explicar, um modo que ele nunca havia feito. É um olhar gentil, calmo, até contente e… profundo. Como se seus olhos pudessem enxergar para além de mim. Nunca pensei que ele me olharia deste jeito. Não consigo desviar o olhar. Seus belos olhos, me fascinam. Por fim, um belo sorriso surge em seu semblante. O que o deixa atraente. Ele sorri de forma sincera, como se estivesse feliz por me vê. Percebo que fico corada. Como ele conseguiu fazer isso?

   Ele sorriu? Olhou para mim e sorriu? Não consigo acreditar. O que aconteceu? Por que ele sorriu para mim? Meus olhos me enganaram? Era realmente o Eric?

   Sim, sei que era. Não estou enganada.

   Quando chego na sala de aula, logo o vejo. Ele está em sua carteira do fundo da sala. Está de cabeça baixa. O silêncio predomina o local, sei que ele sabe que estou aqui, mas, nem ele, nem eu, falaremos alguma coisa. Estamos a sós, seria o momento ideal se, caso, ele quisesse me dizer algo, ou, se eu quisesse lhe dizer algo. Mas não trocamos nenhuma palavra.

   Me sento no lugar de sempre. Na frente. O silêncio do local está me preocupando. Até agora, ele não falou nada e nem olhou para mim.

   Ele está quieto demais. O que aconteceu? Não consigo suportar a agonia que estou sentindo. Preciso saber se ele está bem. Se algo aconteceu.

   — Eric, você está bem? — a pergunta sai de meus lábios. Não consigo evitar. Estou realmente preocupada com este garoto. Porém, claro, essa pergunta o pegou de surpresa, até a mim. Ele me fita. Seus olhos demostram incerteza.

   — Hã? Do nada, cê me pergunta isso? — Eric diz, demostrando indignação em sua voz.

   — É claro que estou bem, idiota! — grita, como se dissesse para eu cuidar da minha própria vida. Que não devo me preocupar com ele.

   É… Parece que ele está bem mesmo! — penso. Mas… e se ele não estiver bem? Não me reconheço. Meu corpo se move primeiro que meu cérebro. Logo, já estou em sua frente. Perto demais dele. Consigo ouvir e sentir sua respiração. Minhas mãos, inconscientemente, roçam suas bochechas.

   — Você está repleto de hematomas. Tem certeza que está bem? — minha própria pergunta, me pega de surpresa. Consigo ver em seus olhos, que ele está, também surpreso. Por que fiz isso, afinal? Estamos perto demais. Consigo sentir sua respiração ficando ofegante. Logo, ambos já estão enrubescidos.

   — O que… — sua voz falha. — Idiota!

   — Eu… — antes que eu consiga me explicar, os outros garotos aparecem. Estão gargalhando atrás de mim.

   — Eita! — André grita, sem necessidade disso.

   — Tão de namorinho, é? — Kaio pergunta, gargalhando. Não sei o que dizer. A chegada deles, simplesmente, me pegou desprevenida. Porém, sei que Eric irá explodir daqui a poucos milésimos.

   — Seus imbecis, não é nada disso! — Eric grita, exasperado.

   — Ah, não? — Kaio retruca, rindo de forma maliciosa. — Então o que é?

   — Eu—

   — Maiy, cê não precisa dar satisfação nenhuma pra eles! — Eric afirma, interrompendo-me.

   — Mesmo assim — digo, mantendo a calma. —, não quero que isto se torne um mal-entendido — estão prestando atenção em mim, então, continuo:

   — O Eric está repleto de hematomas. Queria saber se ele estava bem.

   — Ah! — Kaio exclama, em um tom sarcástico. — Então, estava preocupada com ele? — ele me lança um olhar desafiador, confrontante.

   — É, claro! — exclamo, demonstrando minha irritação. — Ele me ajudou, não foi? No mínimo, devo mostrar-lhe que estou preocupada. Que sou grata pelo que ele fez.

   — Você está preocupada comigo? — Eric sussurra. Percebo que os outros não o escutaram. Assinto, de leve, com a cabeça e continuo fitando os garotos.

   — Ei, seus idiotas — Eric grita, em um tom de voz que demonstra que está irritado com eles. Que sua paciência já se esgotou. —, calem a boca! Nem ela, nem eu, devemos satisfação nenhuma para vocês!

   — Ah, Eric! — Kaio retruca — Vai bancar o bonzão, agora? — solta, exasperado.

   — O que você disse, seu babaca? — Eric brada.

   Mesmo ainda machucado, ele quer arrumar briga. Eric! — penso. Não sei o que fazer para que eles não briguem. Não quero que o Eric se machuque, não quero que o machuquem. Para minha sorte, não só minha, mas pra ele também, outros garotos entram na sala. Um deles, é o Pedro. Um garoto realmente sensato e bondoso. Gentil.

   — Ei! — Pedro diz, encarando Kaio e André. — O que vocês estão fazendo aí?

   — Tsc! — Kaio solta, irritado.

   — Lá vem o “senhor certinho”! — indignado, André diz, já se retirando do local, com Kaio.

   Após Kaio e André se retirarem, Pedro me lança um olhar duvidoso e preocupado.

   — Maiy, cê tá bem? — pergunta-me, apreensivo.

   — Sim. Estou. — expresso, de forma sincera e gentil. Pedro me lança um olhar mais calmo, como se eu houvesse retirado um peso enorme de suas costas. Ele estava, demasiadamente, preocupado comigo. Logo em seguida, ele se redireciona para Eric, o fitando.

   — Tsc! Arrumando briga de novo, não é, Eric! — fulo, Pedro diz, como um irmão mais velho ao dar uma bronca no irmão mais novo.

   — Eu não! — Eric protesta. — Foi eles que começaram!

   — Cê não tem jeito mesmo… — Pedro argumenta.

   — O que vocês estavam fazendo mesmo? — Pedro questiona. Sabia que ele iria perguntar, já estava esperando por isso. Eric balbucia algumas palavras, mas não sabe como responder a pergunta com clareza. Então, me inclino, fitando o Pedro e digo:

   — Eu queria saber se o Eric estava bem. Vim até ele e chequei pessoalmente. Estava preocupada, admito. Porém, quando os garotos aparecem e nos encontraram juntos, entenderam tudo errado.

   — Entendi — Pedro diz, aparentemente, surpreso. — Mesmo assim, isso é estanho!

   Poucos segundos depois, o professor entra na sala. Porém, apesar de ser monótono, as aulas passam rápido. Logo, já estamos de saída. Mas, antes de ir embora, preciso ter uma breve conversa com Eric, a respeito do nosso trabalho de biologia.

  — Eric.

  — O que foi? — ele pergunta, me encarando.

  — Lembra do trabalho de biologia? — pergunto e ele me lança um olhar de tédio e vira de costas.

   — Amanhã a gente decide isso. Faremos na sua casa. — ele se vira, me encarando. — Falô?

   — Tudo bem — devolvo seu olhar. O encaro, por alguns milésimos, até que ele sai da sala e vou logo em seguida, mas, no momento em que estava chegando à porta, ouço alguém me chamar. Me viro, procurando a pessoa que disse meu nome.

Larissa.

   — Podemos conversar por um instante? — Larissa pergunta. Ela parece preocupada.

   — Podemos.

   Mantenho meus olhos nela, ao mesmo tempo, presto atenção nos outros alunos que estão saindo da sala. Ela fica em silêncio, por um instante.

   Estamos sozinhas e ela começa a balbuciar:

   — Você gosta do Eric? — Sua pergunta me pegou desprevenida. Estou perplexa. Por que ela me perguntaria isto? Percebo que enrubesço. — Desculpa por perguntar. Eu preciso saber! — ela justifica.

   — Não — balbucio. — Eu não gosto.

   Por que ela está me perguntando isto, afinal de contas?

   — Posso saber por que me pergunta isto? — indago, indignada.

   — Eu… — Larissa balbucia, sem jeito. — Acho que você e o Eric tem sentimentos um pelo outro. Penso que, talvez, você gosta dele — Sua voz falha, porém, logo ela continua: — Gosto do Eric! Estou apaixonada por ele!

   Fico pasma. Tento manter a compostura e a analiso. Sei que, se ela tem mesmo sentimentos por ele, veio me confessar isto porque está insegura. Pensa que possa existir algo entre mim e ele. Que posso roubá-lo dela. Estamos um pouco mais próximos e ela tem receio de que algo aconteça.

   — Entendo perfeitamente — digo, convicta. — Você considera a possibilidade de que algo exista entre mim e ele, não é? Ou que possa existir. — Não dou tempo para ela argumentar e prossigo: — Não existe essa possibilidade! — asseguro. — Nem sequer somos amigos. Quem dirá outra coisa? Entendo que esteja insegura, porém, garanto-lhe, não há nada entre mim e ele! — de forma alguma, uso o “nós”. Não quero que ela pense que existe, ou possa existir, esse “nós”.

   Ela me analisa, incrédula.

   — Tem certeza que não sente nada por ele? — encarando-me, ela pergunta, desconfiada.

   — Tenho! — exclamo, convicta do que digo.

   Após alguns segundos, ela enfim suspira, aliviada. Percebo que está mais calma. Ainda vejo receio em seus olhos, porém, ela está mais segura de si.

   — Fico um pouco mais tranquila por saber! — sussurra, levando a mão ao peito.

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