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A porta do quarto se fechou com um clique suave, deixando para trás o silêncio súbito e a tensão palpável no ar. Malak e Thiago ficaram parados, um de cada lado do ambiente ensolarado, se observando como dois felinos prestes a decidir entre uma briga ou uma trégua desconfortável.

Malak quebrou o silêncio primeiro, sua voz um corte seco no ar doce do quarto. "Vai fazer alguma coisa ou vai ficar olhando para mim?"

Thiago pareceu sair de um transe, corando levemente. "Desculpa.É que... eu tava tão animado para você chegar."

Malak ergueu uma sobrancelha, um gesto lento e deliberado que transmitia puro ceticismo. "O porquê?"A pergunta saiu mais como um desafio do que uma curiosidade genuína.

Ignorando a frieza, Malak virou-se e pegou sua mala de ébano, colocando-a com um baque surdo em cima da cama. Ele abriu as fechaduras com um clique audível e começou a retirar suas roupas, todas em tons de preto, cinza e vermelho sangue, pendurando-as no armário com movimentos precisos. Em seguida, veio o verdadeiro arsenal: um arco negro e elegante, um aljava de flechas com penas escuras, duas espadas curtas de lâmina serrilhada que pareciam absorver a luz, e, por último, um cajado enorme e imponente, talhado em madeira escura e com uma gema vermelha pulsante em sua extremidade.

Thiago não pôde conter um suspiro de admiração e reconhecimento. "Ou... esse é o Cajado de seu pai?"A curiosidade superou a cautela, e ele deu um passo à frente, estendendo a mão quase que involuntariamente para tocar na madeira antiga.

Mais rápido que uma cobra, a mão de Malak agarrou o cajado, puxando-o para longe do alcance de Thiago. Seus olhos âmbar faiscaram por um instante, uma fagulha de possessividade e raiva. "Desculpa,"disse Thiago, recuando rapidamente, as mãos no ar em um gesto de paz.

Malak relaxou um pouco a pegada, mas não totalmente. "E sim. Cajado do meu pai."

"É... impressionante", murmurou Thiago, ainda maravilhado. "Só uma coisa... tem uma regra aqui. Não usamos magias dentro da escola, a não ser nas aulas específicas de prática controlada."

Malak soltou uma risada curta e sem humor. "Vocês não usam. Eu uso. Não sou vocês."

Thiago não se abalou. Ele parecia genuinamente tentando ajudar. "Tudo bem. Você vai ver que, aos poucos, não vai sentir falta. Não precisa usar magia para tudo."

Malak não respondeu. Ele apenas colocou o cajado cuidadosamente contra a cabeceira de sua cama, num lugar de destaque e fácil acesso.

Thiago, tentando mudar o assunto e quebrar o gelo, teve uma ideia. "Se você quiser, podemos ir no Museu de História hoje. É bem interessante."

Malak parou o que estava fazendo e olhou para Thiago, um novo interesse brilhando em seus olhos – um interesse calculista e afiado. "Como seria?"ele perguntou, sua voz um pouco menos cortante.

Thiago se animou visivelmente ao perceber que Malak parecia interessado. "É um museu que fala dos nossos antepassados. Dos grandes heróis e... das grandes batalhas. Tem até um busto do seu pai."Ele fez uma pausa, escolhendo as palavras com cuidado. "Eu sempre gosto de ir lá. É... tranquilo."

Malak manteve a expressão impassível, mas algo se moveu por trás de seus olhos. Um busto de seu pai. A versão deles da história. "Então vamos lá,"ele disse, sua decisão soando final. "Daqui a pouco."

Um sorriso verdadeiro iluminou o rosto de Thiago. "Ótimo!"

Foi quando Malak olhou novamente para o uniforme azul e dourado jogado em cima da cama. Seu nariz se enrugou de desprazo. "Porque ele é tão horrível?"

Thiago deu de ombros, rindo baixo. "Eu gosto dele."

Malak virou o pescoço lentamente, analisando Thiago de cima a baixo com uma intensidade quase desconfortável. "Você tem gosto horrível."

"Minha cor favorita é branco," defendeu-se Thiago, ainda sorrindo. "Ela é ótima para tudo. Transmite paz."

"A minha é preto e vermelho," retrucou Malak, seu sorriso voltando, mas agora carregado de uma promessa sombria. "Pode ter certeza, você vai descobrir o porquê."

O tom e a escuridão repentina em seus olhos fizeram Thiago estremecer visivelmente. Malak viu o susto e começou a rir – uma risada genuína, mas que soava estranha e um pouco cruel no quarto ensolarado. "Adoro isso!"ele disse, secando uma lágrima inexistente. "Bom, pelo menos esse trapo pode ser salvo. Só precisamos fazer alguns ajustes."

Ele estalou os dedos. Uma névoa negra e roxeada, saindo da ponta de seus dedos, envolveu o uniforme. O tecido se contorceu e mudou de forma, as cores se transformando como se estivessem sendo lavadas por tinta. Quando a névoa se dissipou, o uniforme não era mais azul e dourado. Era uma jaqueta justa de couro negro, com detalhes em vermelho sangue, e uma calça de um tecido fosco igualmente escuro. O emblema da escola ainda estava lá, mas agora bordado em fios prateados e quase invisíveis.

"Uau!" exclamou Thiago, seus olhos arregalados de espanto. "Muito melhor!"

Ele então mordeu o lábio, preocupado. "Tem certeza que não tá desobedecendo alguma regra da escola?"

Malak pegou a nova vestimenta, um sorriso de satisfação nos lábios. "Eu não ligo se desobedeço ou não,"declarou, indo em direção ao banheiro para se trocar.

Minutos depois, ele saiu. A transformação era completa. A jaqueta e a calça negras moldavam-se perfeitamente ao seu corpo, fazendo-o parecer mais um príncipe das sombras em missão do que um estudante. O contraste com a claridade do quarto era quase chocante.

Thiago olhou, sem conseguir disfarçar a admiração. "Olha, pode até desobedecer... mas ficou muito bem em você."

Malak ajustou o punho da jaqueta. "Aquilo parecia um pedaço de lixo. Isso,"ele disse, gestando para si mesmo, "isso é apropriado."

E pela primeira vez, Thiago riu de verdade, um som leve que ecoou no quarto, enquanto Malak observava, um plano já se formando em sua mente. O museu seria muito mais do que uma simples visita. Seria o primeiro passo de sua verdadeira missão.

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