Ana

A claridade suave da manhã atravessava as cortinas brancas do pequeno apartamento de Ana como uma carícia. O relógio marcava sete horas, mas para ela parecia cedo demais — não pelo horário em si, mas pelo peso da rotina que sempre se repetia. Levantar, preparar o café, afinar o violão, cantarolar, responder mensagens, escrever versos soltos em cadernos que se acumulavam em sua escrivaninha.

Era uma vida simples, quase previsível. Para muitos poderia soar entediante, mas para Ana era um terreno seguro. Ela gostava do silêncio, gostava de sentir que tinha o controle de cada passo, mesmo que isso significasse abrir mão de oportunidades que exigiam ousadia.

Seu apartamento refletia muito de sua personalidade. Pequeno, mas acolhedor, cheio de plantas em vasinhos coloridos, quadros pendurados com frases poéticas, um mural de fotos com lembranças de shows em barzinhos e momentos com a família. Sobre a mesa de centro, um caderno de capa azul estava sempre aberto, repleto de rabiscos, versos inacabados e palavras que esperavam encontrar uma melodia.

Antes de qualquer coisa, pegou o violão, o objeto mais precioso que tinha. Passou os dedos pelas cordas, dedilhou acordes e, quase sem perceber, começou a cantar:

"Eu não sei se o mundo espera por mim,

mas eu espero pelo mundo...

um passo, um risco, talvez um sim,

um salto fundo..."

Era uma música inacabada, escrita na noite anterior. Sorriu sozinha, meio tímida, meio envergonhada, como se houvesse alguém a observando. Desde pequena, Ana sempre tivera essa mania de cantar como se estivesse escondendo segredos. Diferente de Nilo, que subia em palcos gigantescos com letras ousadas e ritmos eletrizantes, ela cantava descalça, mas também pra multidões, ela cantava sobre o amor e a vida, ela cantava com o coração

ela mechia no celular quando resolveu ler os comentários do vídeo que postou da sua música nova, ela amava gravar vídeos apenas voz e violão, cantando a letra que ela escreverá com a alma, e os comentários mostravam que seus fans sentiam.

“Você canta com a alma.”

“Por isso está no topo das paradas”

“Seu jeito me cura só de ouvir.”

Ana suspirou, sentindo o coração aquecer. As palavras dos fãs eram como pequenos raios de sol entrando em sua vida.

— Sonhe grande... — murmurou, olhando para a caneca de café que usava todas as manhãs.

Era um mantra que repetia para si mesma, mas que raramente colocava em prática. Sonhar, ela sonhava. O que faltava era coragem.

Ana lembrava de como, desde a adolescência, sempre fora a garota cuidadosa. Enquanto suas amigas se jogavam em aventuras amorosas, ela preferia observar de longe, escrever poemas no caderno ou se perder em melodias. Nunca fora a mais ousada, nunca a que arriscava dançar no meio da festa ou beijar alguém por impulso.

Essa cautela a protegia, mas também a prendia. Quantas vezes havia deixado passar oportunidades porque sentia medo? Um festival que a convidou para se apresentar, mas que ela recusou por achar que não estava pronta. Uma viagem para o exterior, que deixou para depois porque era “arriscado demais”.

Era como se vivesse sempre no quase.

Sem saber, o destino já costurava a ironia perfeita. Enquanto Nilo transbordava em excesso — álcool, festas, mulheres, palcos lotados —, Ana vivia em contenção, no silêncio confortável de sua bolha. Ele falava de luxúria e ostentação; ela, de sentimentos e delicadezas.

Dois extremos que, naquele momento, pareciam universos impossíveis de colidir.

O celular tocou , mas dessa vez era uma chamada de vídeo. Vitória, sua melhor amiga.

— Anaaa! — Vitória apareceu na tela, com os cabelos desgrenhados e um sorriso sempre espontâneo. — Já acordou, fada da música?

— Já — Ana sorriu, ajeitando os fios rebeldes atrás da orelha. — Estava compondo um pouco.

— Compondo ou se escondendo do mundo? — Vitória ergueu a sobrancelha com aquele tom provocador que só ela conseguia usar sem soar cruel.

Ana riu, mas não respondeu.

— Amiga, você é maravilhosa, tem uma voz que arrepia até pedra. Mas precisa sair dessa bolha. Não dá pra passar a vida toda em casa mofando, voce só sai pra fazer show

— Eu sei... — Ana suspirou. — Mas eu não sou como você. Não sei me jogar, não sei me expor.

— Tá, mas olha — Clara interrompeu, animada —, ontem eu sonhei com você num palco gigante, cheio de luzes, um monte de câmeras e todo mundo cantando junto. Era tipo... destino.

Ana balançou a cabeça, rindo. Clara sempre sonhava coisas malucas, mas às vezes acertava em cheio.

o que Ana não sabia é que uma escolha poderia mudar a monotonia da sua vida, e trazer emoções que ela nunca havia nem imaginado viver.

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