Capítulo 1 – O princípio do fim
Oslo, Noruega – 2022
O inverno castigava Oslo com temperaturas abaixo de zero. A neve cobria as ruas como um manto silencioso, mas nada disso seria motivo suficiente para Emmy faltar à escola. Sentia-se febril, os olhos pesados e o corpo dolorido, mas sabia que sua mãe jamais a deixaria ficar em casa por causa de uma simples indisposição. Por isso, guardou silêncio.
Levantou-se devagar, tomou um banho quente, vestiu-se, bebeu uma xícara generosa de café fumegante, colocou o casaco grosso e enfrentou o frio da manhã.
Na escola, as horas se arrastaram. As aulas pareciam mais desinteressantes do que nunca, e Emmy mal teve ânimo para conversar com os amigos. Durante o intervalo, não tocou no lanche, preferindo ficar quieta, observando os minutos se arrastarem. Sentia-se fraca, inquieta. Ao menos pôde sorrir ao se despedir de Suzana, sua melhor amiga, quando desceu do ônibus de volta para casa.
Assim que entrou em seu quarto, as forças lhe abandonaram. Naquela noite, quando finalmente deitou-se, sabia que não seria fácil descansar. Havia dias que sonhava repetidamente com algo perturbador. Acordava mais cansada do que quando se deitava.
E não foi diferente.
Pela terceira vez, despertou trêmula, o corpo suado, gelado, o coração disparado. O sonho lhe causava medo e fascínio ao mesmo tempo — uma mistura avassaladora que a confundia. Nada era nítido: os rostos, os lugares, tudo era envolto em sombras. Mas a intensidade era tão real, tão hipnótica, que parecia impossível ter sido apenas fruto de sua imaginação.
— Estou ficando louca... — murmurou, ainda trêmula.
Era madrugada, quase amanhecendo. Emmy precisava se arrumar para mais um dia longo. Tentou afastar o sonho da mente, mas não conseguia. Era extraordinário e assustador. Ela gostava de filmes de terror, sobretudo os que envolviam vampiros, mas a estranha sensação ultrapassava qualquer fantasia.
Tomou café, entrou no ônibus em piloto automático e atravessou o dia como uma sombra. O plano de ignorar aquilo falhara miseravelmente. Quanto mais tentava esquecer, mais obcecada ficava com a presença que rondava seus sonhos. Não conseguia entender por que tinha a sensação de estar sendo observada, drenada.
Naquela noite, ao deitar, o pesadelo voltou com força.
Encontrou-se em uma rua deserta, mal iluminada por postes de luz amarelada. Ao longe, um túnel escuro. Um arrepio percorreu seu corpo. Algumas pessoas se aglomeravam na entrada do túnel, todas vestidas de preto. Seus instintos gritaram para que fugisse, mas então ela o viu.
O estranho.
Era alto, esguio, com o peito amplo parcialmente exposto pela camisa vinho entreaberta. O cabelo negro, comprido, se confundia com a noite, e sua pele pálida lembrava porcelana. Quando sorriu, Emmy sentiu um calafrio percorrer-lhe a espinha. Ele avançou em sua direção com movimentos tão rápidos que, em um piscar de olhos, já estava diante dela.
— Achou o que procurava, milady? — a voz grave e rouca a envolveu como uma melodia proibida.
Antes que pudesse reagir, sua mão firme segurou-lhe a nuca. Os lábios quentes tocaram sua pele, e um arrepio ardente a percorreu. Então, a dor: duas perfurações em seu pescoço, o sangue escorrendo quente, o cheiro metálico no ar. Emmy tentou resistir, mas despertou ofegante em sua cama.
Só que dessa vez havia algo diferente.
A dor em seu pescoço não sumira com o sonho. Correu até o espelho. Duas pequenas marcas estavam lá, vivas e reais.
— Não... não pode ser... — sussurrou, apavorada.
A voz de sua mãe a tirou do transe:
— Emmy, venha almoçar. Está bem?
— Estou... gripada, só isso — respondeu, tentando disfarçar.
Os dias seguintes foram um tormento. O medo não a abandonava. Sentia-se vigiada, via vultos quando estava sozinha. As marcas desapareceram, mas a pele do pescoço ardia como se fosse constantemente tocada por dedos invisíveis.
O tempo passou. Emmy já não conseguia se concentrar na escola, afastava-se dos amigos e até dormia no quarto da mãe, inventando desculpas para não ficar só. Sua intuição gritava que corria perigo, mas não sabia de quê.
Até que Suzana lhe deu uma ideia:
— Escreve um diário, amiga. Um diário dos sonhos. Pode ajudar a controlar isso.
— Controlar?
— Sim. Se você anotar os detalhes, pode até aprender a mudar o rumo dos sonhos.
Naquela tarde, Emmy comprou um caderno. Sentou-se à escrivaninha, encarou a página em branco, hesitou. Riscou, recomeçou, até que enfim encontrou as palavras certas:
"Olá. Nestas páginas vou registrar algo que poderá assustar quem, no futuro, vier a lê-las. Tudo aqui é a mais pura e cruel verdade. Há meses venho sendo atormentada por um demônio de cabelos pretos, pele pálida e um sorriso diabolicamente sensual. Ele surge nos meus sonhos, mas seus atos atravessam a barreira da imaginação e tocam o mundo real. Prepare-se, leitor... estes sonhos podem causar arrepios."
Leu em voz baixa, satisfeita. Preencheu metade do caderno de uma vez, escrevendo como se uma força maior guiasse sua mão. Quando fechou a última página, um arrepio percorreu-lhe a nuca. A sensação de estar sendo observada voltou, mais intensa do que nunca.
Sorriu de leve, encarando a escuridão do quarto.
— Se a sua intenção é me enlouquecer... vai ter que lutar mais por isso.
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Atualizado até capítulo 32
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