No dormitório 7B, o silêncio era pesado como pedra. Cada uma das seis camas ocupadas por garotas que pensavam demais para conseguir dormir.
Melissa se virava de um lado pro outro. A sensação que teve durante a aula ainda a perseguia — aquela sombra... fria... observando.
Do beliche de cima, Bia quebrou o silêncio.
— Cês sentiram aquilo também? Durante o exercício?
Yasmin, na cama ao lado, respondeu com a voz abafada:
— Se "aquilo" for um arrepio descendo a espinha e uma vontade súbita de sair correndo... então sim.
Melissa respirou fundo.
— Não era só energia. Era... uma presença.
Mickaelly deu uma risada baixa, debochada.
— Ah pronto, agora vão dizer que foi o espírito da ex-namorada do professor. Vocês viajam demais.
Bia se levantou na cama, acendendo uma pequena lanterna mágica de bolso.
— Fala sério, Mika. Até você travou quando aquele círculo explodiu.
Mickaelly revirou os olhos.
— Travar é diferente de sentir presença demoníaca, né querida?
Samuel, que dormia num dormitório masculino ao lado, bateu levemente na parede e gritou com a voz divertida:
— Ei, meninas bruxas! Algumas pessoas precisam dormir! Amanhã tem aula de vôo!
Yasmin sorriu.
— Vai sonhando, Sam. Você nem consegue subir numa vassoura sem cair de cara.
— Amor, eu sou leve como uma pluma. — respondeu ele, já rindo.
O clima no quarto aliviou, mas Melissa continuava séria.
Ela se levantou, pegou seu colar de concha — um presente da avó — e foi até a janela.
A noite estava densa. A lua minguante parecia ainda menor do que o normal. As árvores ao redor da escola sussurravam.
E ela ouviu.
Uma voz.
Fraca. Distante. Vinda do bosque ao redor do colégio.
— Melissa...
Ela se afastou, assustada.
— Alguém me chamou? — perguntou, virando-se.
— Ninguém falou nada. — disse Bia, já bocejando.
Melissa voltou a deitar, mas dessa vez manteve o colar apertado contra o peito.
No fundo, ela sabia: alguém, ou algo, estava tentando se conectar com ela. Algo antigo. Talvez ligado à sua origem... ou à magia que existia dentro do colégio.
No dia seguinte, no refeitório, os comentários sobre a aula de energia se espalhavam.
— Cês viram que o professor Arkyn anotou o nome da Melissa depois da aula? — comentou Nick, com um sorriso torto.
— Tipo, anotou mesmo. Naquele caderno preto dele.
Sarah, que comia uma maçã distraidamente, comentou:
— Quem o Arkyn anota, geralmente ou tá em perigo… ou vai ser testado.
Geovanna, sentada mais distante, escutava tudo calada, com os olhos fixos em Melissa do outro lado do refeitório.
Seu círculo de energia tinha estourado. Ela se sentiu exposta. Vulnerável.
E o toque de Melissa… ainda queimava na pele.
Na saída do refeitório, Melissa andava devagar pelos corredores abertos da escola, absorvendo as conversas que ecoavam pelos azulejos antigos. Seu corpo ainda vibrava de forma estranha desde a aula. Havia uma inquietação presa em seu peito, como um segredo esperando ser revelado.
Ela precisava de ar.
Foi até o pátio lateral do colégio, onde poucas pessoas costumavam ir. Um jardim suspenso, com bancos de pedra e flores encantadas que abriam apenas à noite.
Lá, sentada sozinha, estava Kelly.
Os cabelos cacheados da garota caiam sobre os ombros como ondas dançantes, refletindo a luz suave da lua. Seus olhos estavam fechados, e ela ouvia alguma música por fones mágicos — pequenas pedras encantadas que vibravam no ouvido.
Melissa hesitou. Mas algo na tranquilidade daquele momento a puxava, como se já tivesse estado ali antes. Como se algo dentro dela dissesse: "Vai."
— Oi... — disse, se aproximando.
Kelly abriu os olhos devagar, surpresa, mas sem se assustar. Ela tirou um dos fones e sorriu, meio tímida.
— Oi. Você é a sereia do dormitório 7B, né?
Melissa riu, meio sem graça.
— É... acho que esse apelido vai pegar.
— Eu sou Kelly. Dormitório 5A. — disse ela, se virando totalmente para Melissa. — Senta aí, se quiser.
Melissa sentou. O banco estava gelado, mas a presença de Kelly parecia esquentar tudo ao redor.
— Não é todo mundo que conhece esse lugar. — comentou Kelly, olhando o jardim encantado. — Eu venho aqui quando preciso pensar... ou quando quero fugir.
— Fugir de quê? — perguntou Melissa, com curiosidade genuína.
Kelly hesitou, depois deu um sorriso meio triste.
— De mim mesma, às vezes.
A resposta ficou no ar. Melissa entendeu mais do que parecia. As duas ficaram em silêncio por alguns segundos, mas era um silêncio bom. Um silêncio cheio de conexão.
— Eu ouvi você na aula de energia. — disse Kelly. — Você tem... algo diferente. Quando seu círculo quebrou, foi como se o chão tivesse falado.
Melissa ficou surpresa.
— Eu... senti uma presença. Como se algo antigo estivesse tentando me alcançar.
Kelly a olhou nos olhos. Um olhar profundo, morno, gentil.
— Eu acho que você não está sozinha nisso.
Melissa sentiu o coração bater mais rápido. Não por medo — mas por algo novo. Algo suave. Algo que aquecia o peito e o rosto.
Kelly abaixou os olhos, tímida. Sorriu de canto.
— Eu também me sinto assim. Quando falo com você.
As luzes das flores noturnas piscaram ao redor das duas, como se sentissem a energia crescente entre elas.
Nenhuma das duas disse mais nada por um tempo.
Mas naquele instante, entre o silêncio, as flores e os olhares, algo nasceu.
Algo puro.
Algo que nenhuma delas sabia nomear ainda...
Mas que ambas sentiram.
Os corredores de Eclipse College pareciam mais escuros naquela noite.
Melissa caminhava de volta para o dormitório com os pensamentos ainda vibrando com a conversa com Kelly. O jeito como ela falava, o olhar intenso e, principalmente, aquela sensação de paz.
Mas havia algo mais. Um chamado silencioso.
Quando entrou no dormitório, Bia estava sentada na cama com fones e um olhar perdido, Mickaelly discutia com Eshelley sobre uma treta antiga e Samuel se jogava no colchão de costas, rindo alto de alguma piada que ele mesmo contou.
— Oiê, sereiona. — Bia disse, tirando um fone e encarando Melissa com um sorrisinho de canto. — Sumida, hein? Tava onde? Ou melhor... com quem?
— Só... andei por aí. — respondeu Melissa, tentando esconder o sorriso nos lábios.
Eshelley arqueou uma sobrancelha.
— Aí tem coisa. Aposto cinco pedras encantadas que é com a menina do pátio.
— Kelly. — corrigiu Melissa automaticamente, depois se arrependeu.
Samuel deu um gritinho dramático.
— ELA TEM NOME, GENTE! FOFOQUEIRAS! TÁ NASCENDO O ROMANCE DA DÉCADA!
Melissa revirou os olhos, mas o rosto já estava em chamas. Riu também.
Mas enquanto todos riam, algo começou a vibrar no ar.
As luzes piscaram.
Mickaelly se calou.
— Vocês sentiram isso?
Uma corrente fria passou pelo dormitório, fazendo os cabelos de Melissa arrepiarem.
— Isso não foi normal. — disse Eshelley, se levantando.
Do lado de fora, um barulho ecoou. Como uma respiração... vinda do final do corredor.
Melissa olhou para a porta.
— Eu... eu senti isso hoje cedo. Na aula do círculo. É a mesma coisa.
— Melissa — Bia falou baixinho —, você precisa descobrir o que tá chamando por você.
🜃🜁🜄
Na manhã seguinte, as aulas estavam suspensas por conta de uma "flutuação de energia desconhecida", segundo a diretora Helena.
Melissa se encontrou com Kelly novamente. Dessa vez, perto da torre leste, onde ninguém ia. O lugar estava silencioso, com janelas antigas e vitrais mágicos que mostravam cenas de tempos passados.
— Você sentiu ontem à noite? — Melissa perguntou.
Kelly assentiu, séria.
— Tá ficando mais forte. Como se alguma coisa... ou alguém... estivesse tentando atravessar um portal.
As duas ficaram em silêncio.
Kelly tocou suavemente a mão de Melissa.
— Talvez a gente precise descobrir o que a sua energia tá despertando.
Melissa engoliu seco, sentindo a pele arrepiar com o toque.
— E se for perigoso?
— Então a gente enfrenta juntas.
Ao fundo, os vitrais da torre mudaram sua imagem. Um mar escuro... e uma sombra saindo dele.
Ninguém viu.
Ainda.
Mas algo antigo tinha despertado.
E estava vindo.
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Atualizado até capítulo 26
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