O Poder e o Vazio
Aurora Lancaster.
Até seu nome parecia ter sido escolhido para brilhar. Um nome de princesa, bordado em lençóis de linho, gravado em prata nas malas escolares importadas, nos convites para bailes, nas capas de revistas da alta sociedade. Nasceu cercada por cristais, mármore branco e o tilintar de taças de champanhe. Mas entre tudo isso, não havia o som mais essencial: o riso verdadeiro de uma criança amada.
Filha única de um magnata do ramo financeiro, Alexander Lancaster, e da socialite Elisabeth Monroe — falecida em um acidente de carro quando Aurora tinha apenas dois anos —, ela cresceu sob os cuidados de babás, governantas e professores particulares. Seu pai? Um homem frio, ambicioso e ausente. Um rei no topo da pirâmide corporativa, mas um fantasma no papel de pai.
Aurora aprendeu cedo que amor não se comprava, mesmo com todo o dinheiro do mundo.
Seus dias eram cronometrados: aulas de etiqueta, equitação, piano, idiomas e tudo que uma Lancaster deveria dominar. Os sorrisos eram treinados, os gestos calculados. Mas por trás dos muros de mármore da mansão, ela se tornava uma especialista em escapar.
Aos quinze anos, descobriu a liberdade — não entre os corredores da mansão Lancaster, mas nas vielas da cidade que seu pai fingia não existir. Começou a fugir à noite. Usava roupas comuns, maquiagem pesada para esconder sua identidade e frequentava festas em galpões abandonados, becos iluminados apenas pelas luzes coloridas e batidas de trap, funk ou rock underground.
Ali, entre estranhos suados dançando em êxtase, ela sorria de verdade.
— Aurora, isso é loucura! — dizia Alice, sua babá de infância e única figura maternal que teve. — Se seu pai descobrir...
— Ele nunca está aqui, Alice. E quando está, só olha pro meu boletim. Eu tô cansada de ser só um nome. Quero ser uma pessoa.
Apesar do risco, Aurora continuava. A cada escapada, mais viva ela se sentia. Mas o destino, cruel como sempre, logo colocaria um fim naquele pequeno pedaço de liberdade.
O noivado
Aos dezoito anos recém-completos, Aurora acordou com a notícia que mudaria sua vida.
Estava tomando café no jardim de inverno — um cenário de revista, com luz natural caindo sobre a mesa delicadamente posta — quando seu pai entrou, acompanhado de um homem que Aurora reconheceu da televisão.
Gregory Hamilton.
Empresário do setor de tecnologia, quarenta e dois anos, sempre cercado de rumores: contratos ilegais, chantagens, e sussurros sobre sua conduta com mulheres. Aurora sentiu a espinha gelar.
— Pai? O que está acontecendo?
Alexander sentou-se com a frieza habitual.
— Aurora, Gregory será seu noivo. A união das nossas famílias será excelente para os negócios. A cerimônia está sendo preparada.
— O quê?! — Aurora levantou-se, a xícara tremendo em sua mão. — Você... não pode estar falando sério.
Gregory sorriu, encostando-se na cadeira com a arrogância de quem acredita que o mundo lhe pertence.
— Não se preocupe, princesa. Eu saberei cuidar de você.
— Eu não sou um bem pra ser negociado! — Aurora encarou o pai, os olhos marejando. — Você sequer me perguntou!
Alexander cruzou os braços.
— Chega de escândalos. Suas fugas, suas festas... você envergonha o nome Lancaster. Está na hora de crescer.
— Eu não aceito isso. Não vou me casar com esse homem!
Gregory se levantou devagar, andou até ela e segurou seu queixo com firmeza.
— Você vai aceitar. E vai aprender a ser uma esposa. Ou quer que eu mostre ao seu pai as fotos daquela festa em São Cristóvão? Você se lembra, não é? O vestido curto, a bebida, o garoto de brinco... eu tenho tudo.
Aurora engoliu em seco. O rosto queimava, as mãos tremiam.
— Você me perseguiu?
— Eu investi no que é meu. — Ele sorriu. — E você será minha, Aurora. Com ou sem sua boa vontade.
Ela olhou para o pai, buscando uma centelha de proteção. Mas Alexander apenas se levantou, ajustando os punhos da camisa.
— Isso está decidido.
Aurora correu dali, com o coração em pedaços.
Naquela noite, decidiu fugir. Não para sempre, mas o suficiente para respirar. Para se lembrar de quem ela era. E foi assim que encontrou a festa que mudaria tudo.
O encontro com o destino
A festa acontecia em um bairro periférico, em um campo de futebol desativado. Lanternas coloridas penduradas em fios improvisados iluminavam a noite. A música alta vibrava no chão. Os corpos dançavam livres, suados, intensos. Aurora usava jeans rasgados, tênis sujos e um cropped preto que revelava sua barriga. Estava irreconhecível. Estava viva.
Foi quando olhou para o lado e o mundo pareceu parar.
Ele estava encostado em uma moto preta, com uma cerveja na mão, cercado de amigos que riam alto. Alto, corpo atlético coberto por tatuagens, pele bronzeada pelo sol. Mas foram os olhos que a prenderam: azuis como o céu antes da tempestade. Intensos. Perigosos. Lindos.
E ele a viu.
Os olhos se encontraram como se o universo tivesse empurrado os dois em direção um ao outro. Aurora sentiu um arrepio percorrer a espinha. A respiração falhou. O desconhecido sorriu de leve e caminhou até ela.
— Nunca te vi por aqui. — Sua voz era rouca, profunda.
— Eu... tô de passagem. — Aurora tentou sorrir, lutando contra o impacto que aquele homem causava.
— Se é um sonho, espero que você não vá embora tão cedo.
Ela riu, surpresa consigo mesma. Estava corando.
— E você? Tem nome?
— Cael. — Ele estendeu a mão. — E você?
Ela hesitou. Por um segundo, pensou em dizer "Aurora", mas algo a impediu.
— Lua.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Combina. Brilhante, bonita... e impossível de alcançar.
Eles passaram a noite conversando, dançando, rindo. Havia algo magnético entre eles. Não era apenas atração — era como se o destino estivesse brincando de unir dois mundos opostos.
Aurora, por algumas horas, esqueceu o peso do anel de noivado em sua bolsa. Esqueceu Gregory, esqueceu Alexander. Ali, sob as estrelas, ela se sentia livre.
Mas o relógio da realidade estava prestes a soar novamente...
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 36
Comments