O sol ainda nem tinha nascido quando Júlia acordou.
Não que ela tivesse conseguido dormir.
Virou-se de um lado pro outro a noite toda, encarando o teto como se esperasse que alguma força mágica surgisse e dissesse que tudo aquilo era um pesadelo.
Mas não era.
O contrato estava assinado.
E Edward Salvatore viria buscá-la às oito da manhã em ponto.
Ela se levantou devagar, como se cada passo fosse um adeus silencioso à vida que deixaria para trás. Tomou banho em silêncio, prendeu o cabelo em um rabo de cavalo frouxo, colocou a única calça jeans sem rasgos e uma camiseta preta sem estampa.
Nada de maquiagem. Nada de salto.
Ela não ia se fantasiar pra aquele homem.
Era aquilo ou nada.
Fez café — mais para manter a rotina do que por fome — e foi até o quarto do avô, que já estava acordado, sentado na cama, com um livro aberto no colo e os olhos cansados.
— Você tá estranha hoje — ele comentou, franzindo a testa. — Aconteceu alguma coisa?
Júlia forçou um sorriso. Sentou-se ao lado dele e segurou sua mão.
— Eu consegui ajuda, vô. Pra você.
— Ajuda? Como assim?
— Um homem... apareceu. Disse que vai pagar tudo. O hospital, os exames, os remédios.
Ernesto a olhou por longos segundos. Seus olhos estavam turvos, mas ainda enxergavam o essencial.
— E o que ele quer em troca?
Silêncio.
Júlia desviou o olhar. Respirou fundo.
— Que eu case com ele.
O velho ficou quieto. Muito quieto.
— Mas é por pouco tempo — ela completou rápido. — É só um contrato. Nada de verdade. Depois, eu volto. Com dinheiro. Com tudo. Você vai ficar bem, vô. Vai viver mais um monte de anos, vai ver?
Ernesto apertou a mão dela com força surpreendente.
— Júlia... eu preferia morrer do que ver você se vender.
— Não é venda! — ela rebateu, com os olhos marejando. — É só... é o único jeito. Eu tentei tudo. Tudo, vô. E ninguém ajuda. Só ele.
O velho suspirou. E mesmo doente, sorriu com ternura.
— Você é minha menina. Te criei pra ser livre. Forte. Mas eu também sei o quanto seu coração é grande. Grande demais.
Ela mordeu o lábio, tentando conter o choro.
— Me perdoa...
— Só se prometer uma coisa — ele disse, levantando o dedo trêmulo. — Que mesmo que você entre nesse inferno... não deixa ele te apagar. Você nasceu com fogo, lembra?
Ela assentiu. Chorando de verdade agora.
— Prometo.
Do lado de fora, o ronco do motor de um carro preto ecoou pela rua estreita.
O carro estava lá. Ele tinha vindo.
Júlia se levantou, abraçou o avô com força e sussurrou:
— Eu volto. Juro que volto.
Pegou sua mochila velha, respirou fundo e saiu pela porta com o coração aos pedaços.
Do outro lado da calçada, Edward a esperava, encostado em seu carro de luxo, de terno preto e expressão indecifrável.
Ela atravessou a rua como quem vai para a guerra.
— Tá pronta? — ele perguntou, sem emoção.
— Não. Mas vamos logo com isso. Antes que eu mude de ideia.
Ele abriu a porta para ela.
E quando o carro arrancou, Júlia não olhou para trás.
A garota do subúrbio havia morrido ali.
No lugar dela, nascia a esposa de um mafioso.

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Atualizado até capítulo 75
Comments
Fatima Gonçalves
CARAMBA E O AVÔ VAI FICAR SOZINHO
2025-08-12
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