Júlia encarava o contrato como se fosse uma sentença de morte.
As letras pretas dançavam na página, zombando dela.
"Contrato de casamento entre Edward Salvatore e Júlia Ferraz."
Ela passou a mão nos cabelos bagunçados, se afastando do banco traseiro do carro como se estivesse sendo sufocada. A raiva queimava, mas por trás dela havia algo muito pior: impotência.
— Isso aqui é uma piada. Eu não sou uma boneca que você compra com cheque.
Edward permaneceu em silêncio. Apenas a observava, como quem estuda a reação de uma presa encurralada.
— Eu não sou sua solução. Vai procurar outra idiota rica e entediada pra brincar de casinha! — gritou, com os olhos marejados, mas sem derramar uma lágrima sequer.
Ele tirou o contrato das mãos dela com a mesma frieza com que se recolhe uma arma carregada.
— Eu não brinco, Júlia. Muito menos de casinha.
— E por que EU? Por que justo eu?
Ele hesitou por meio segundo.
— Porque você não tem nada. E porque, no fundo, sabe que precisa de mim.
A frase bateu como um tapa.
Ela queria gritar que não. Que tinha orgulho. Que se viraria sozinha.
Mas a imagem do avô tossindo sangue no lençol manchado surgiu como um soco no estômago.
— E se eu aceitar... — ela disse com voz rouca — o que eu ganho, além de perder minha liberdade?
— Você salva o homem que te criou. Ganha dinheiro, estabilidade. Um teto. E quando tudo isso acabar... desaparece com mais do que jamais sonhou em ter.
Júlia baixou os olhos. Estava tremendo. Não de medo. De raiva, sim. De desespero, talvez. Mas, principalmente, da maldita verdade.
Ela não tinha escolha. E odiava isso.
— Eu preciso de tempo. — disse, sem encará-lo. — Isso não é... qualquer coisa.
Edward deu um leve aceno.
— Vinte e quatro horas.
— Só isso?
— Se demorar mais que isso, é porque está procurando um jeito de dizer não. E eu não costumo esperar respostas negativas.
A porta do carro se abriu do lado dela. Marco, o brutamontes de olhar vazio, a esperava para que saísse.
Júlia hesitou. Então desceu.
Antes que batesse a porta, Edward falou:
— Uma última coisa, Júlia. Não se iluda.
Ela parou.
— Isso não é um conto de fadas. Não sou seu príncipe.
Sou o vilão da sua história. E você só está aqui... porque é útil.
A porta se fechou com um estalo seco.
O carro sumiu na escuridão da rua sem nome, deixando Júlia sozinha com o vento frio e um coração pesado como chumbo.
A casa estava silenciosa quando Júlia entrou.
Silenciosa demais.
Fechou a porta com cuidado, como se o peso do mundo estivesse pendurado nos ombros. Suas mãos ainda tremiam, e o coração batia como se quisesse explodir no peito. A conversa com aquele homem — Edward Salvatore — martelava em sua mente como uma maldição que ela não podia ignorar.
No quarto do avô, o som da televisão baixa preenchia o ambiente.
O velho Ernesto Ferraz dormia, com os óculos tortos no rosto e um cobertor remendado até o pescoço. Mesmo doente, ainda ressonava forte, como quem se recusa a partir.
Júlia se aproximou devagar, tirou os óculos dele com cuidado e os colocou na mesinha.
Ficou observando por longos minutos.
O rosto enrugado. A pele fina. O homem que a criou sozinho, mesmo com a vida sendo cruel. O homem que lhe ensinou a andar de bicicleta, que fazia café com açúcar queimado quando o pó acabava, que contava histórias de um mundo onde as pessoas ainda eram boas.
Ela se ajoelhou ao lado da cama e enterrou o rosto nas mãos.
— Por que agora, vô...? Por que você tem que ficar assim justo agora?
A dor transbordou em silêncio.
Ela chorou sem fazer barulho.
Como sempre fez.
Porque chorar alto não era permitido quando se crescia com fome e contas vencidas.
Porque não havia espaço para fraqueza quando o mundo inteiro te ignorava.
Mas ali, sozinha, ela se permitiu. Só por um instante.
Quando voltou para a sala, respirou fundo e tirou do bolso o contrato que havia escondido. O papel ainda tinha o cheiro do carro de luxo. Do perigo. De Edward.
Leu tudo, linha por linha.
“União civil com duração mínima de seis meses.”
“Nenhum vínculo legal após o término.”
“Sigilo absoluto sobre a vida pessoal do contratante.”
“Pagamento integral de todas as despesas médicas do Sr. Ernesto Ferraz.”
Era simples. Cruel. Prático.
Se ela assinasse, vendia sua liberdade.
Se não assinasse, enterraria o avô.
De repente, ouviu a voz dele — do velho — como um sussurro na mente:
“Fogo, menina. Você nasceu com ele. Mas escolha bem onde acende. Porque uma vez queimado... não volta mais.”
Ela levantou o rosto. Os olhos ainda estavam molhados, mas havia decisão neles agora.
Ela não faria isso por Edward.
Faria pelo homem que deu tudo por ela.
Pelo único que a amou de verdade.
Pegou uma caneta qualquer da gaveta e respirou fundo.
O coração pulava no peito, mas a mão não tremia mais.
E então, assinou.
Júlia Ferraz.
A rebelde.
A neta.
A futura esposa de um mafioso.
***Faça o download do NovelToon para desfrutar de uma experiência de leitura melhor!***
Atualizado até capítulo 75
Comments
Fatima Gonçalves
MUITO AMOR PELO AVÔ
2025-08-12
0