Como Tudo Começou (Parte 01)
“Dante permanece sob o chuveiro, a água escorrendo por seu corpo marcado de prazer. Os músculos ainda tremem, os sentidos entorpecidos. Ele fecha os olhos, tentando recuperar o fôlego. Aos poucos, o calor o acalma. O vapor sobe, envolvendo-o como um casulo silencioso. Ele encosta a testa na parede de azulejos frios, o peito arfando devagar.”
DANTE
(Baixo, para si mesmo)
O que foi isso...?
“Alguns minutos se passam. Ele finalmente se move, desligando o chuveiro. Pega a toalha, enxuga-se com movimentos lentos, quase automáticos. O vestiário está vazio. Ele veste a cueca, depois a calça de moletom, passa a camiseta sobre a pele ainda úmida. Os dedos tremem levemente quando ele checa o relógio. 21:30h. Dante pega o celular no banco. Abre o grupo da equipe. Nenhuma mensagem nova. Digita para um dos novatos.”
DANTE
(Msg)
Ainda estão no bar?
(Alguns segundos depois, a resposta chega.)
KNOX
(Msg)
A galera já foi embora, mas tô com dois aqui num barzinho perto do dormitório. Chega aí?!
(Dante encara o celular por um instante. Depois digita.)
“Dante coloca o celular no bolso. Pega a mochila, joga nas costas. Antes de sair, encara por um segundo o box atrás de si. A imagem de Hunter volta à sua mente, o corpo quente, os dentes cravando sua pele, a respiração em seu ouvido. Ele desvia o olhar. Precisa espairecer. Precisa fingir que nada daquilo havia acontecido.”
(Barzinho próximo à universidade. Mesa no canto. Música alternativa tocando ao fundo.)
“Dante entra, varrendo o ambiente com os olhos. Encontra Knox e Noah em uma mesa perto do balcão. Os dois estão rindo alto, copos quase vazios na frente.”
NOAH
(Gritando quando o vê)
Opa! Olha quem resolveu aparecer!
KNOX
Atrasado, mas ainda em tempo de beber. Garçom! Uma dose de tequila e uma cerveja pro nosso campeão!
DANTE
Não precisa, gente... tô de boa.
KNOX
Precisa, sim. A gente classificou, porra. Vai negar um brinde?
(Dante hesita. Então suspira e senta.)
DANTE
Tá. Mas vou pedir batata frita. Preciso comer alguma coisa.
(Noah e Knox trocam um olhar cúmplice e voltam a observar a mesa ao lado, onde três garotas conversam animadamente.)
NOAH
(Baixando a voz)
Tô te falando... a do meio já me olhou três vezes.
KNOX
A da ponta riu de uma piada que eu fiz. Tá no papo.
DANTE
Boa sorte, garanhões. Tô fora dessa hoje.
(Knox vira o rosto para Dante, o encara com uma sobrancelha levantada. Depois aponta com o queixo para o pescoço de Dante, sorrindo para Noah.)
KNOX
Aham. Tá fora porque já tá marcado, né, safado?
(Dante leva a mão ao pescoço, sentindo o ponto sensível da mordida.)
DANTE
Fala baixo, caralho.
NOAH
Ué, quem foi? Conta aí. Alguém da equipe?
KNOX
Ihhhh… misterioso. Agora que vai ter que contar mesmo.
NOAH
É. Solta logo. A gente não vai esquecer isso. É uma das meninas da torcida né?! Só pode!
DANTE
Se não mudarem de assunto, eu vou embora.
(Knox ergue as mãos em rendição.)
KNOX
Tá, tá. Chato do caralho.
(O garçom chega com os pedidos. Os três brindam.)
NOAH
Sério, mas e a vibe da equipe, hein? Nunca vi a galera tão animada. Tipo… parece real, sabe?
KNOX
É porque é. Dessa vez a gente tem chance de fazer história. E a culpa é toda do “quarto de ouro”.
NOAH
É como tão chamando o dormitório do novato de ouro com o campeão. Você e…
(Dante completa em pensamento...)
DANTE
(Pensando)
Hunter...
KNOX
Os dois prodígios da natação universitária que dividem o mesmo quarto?! A galera tá apostando alto.
“Dante força um sorriso. Enfia uma batata na boca. Tudo o que ele queria agora era não pensar nele. Ele mastiga devagar a batata. O sorriso nos lábios já se desfez. O comentário de Noah e Knox sobre o ‘quarto de ouro’ ainda ecoa na mente dele, junto com o nome que ele evitava pronunciar em voz alta: Hunter.”
(O som ambiente do bar fica abafado. Risos, copos tilintando, vozes sumindo… até que tudo é tomado por um som conhecido: o som da água. Splash. O impacto do corpo contra a piscina.)
“Meses antes. Primeiro dia de Dante na universidade. Piscina olímpica, fim de tarde, luz dourada cortando a água. A arquibancada está quase vazia. Dante, de pé, com a mochila nas costas, observa da beira.”
“Dante já tinha ouvido falar do campeão do clube de natação da universidade. Hunter. No ano anterior, o cara tinha quebrado três recordes da liga universitária e rankeado em primeiro lugar no individual. Ele era uma lenda viva na natação. Um monstro competitivo. Um prodígio técnico. Então quando Dante recebeu a bolsa de estudos, ficou empolgado com a ideia de finalmente treinar ao lado dele. Mas nada, absolutamente nada, o preparou para a primeira vez que o viu.”
“Hunter corta a água como uma lâmina. Cada braçada é precisa. A virada é rápida. A aceleração é fluida. Tudo nele parece calibrado para vencer. Dante senta nos degraus da arquibancada. Os olhos não piscam. Não é apenas a técnica, é a maneira como aquele corpo se move, desliza, com um domínio absurdo da água. Os olhos de Dante foca nos detalhes: os ombros largos tensionando, os músculos dorsais se contraindo a cada impulso, os joelhos abrindo espaço para mais uma propulsão. O cara nada como se fosse parte da piscina. Como se fosse dono dela.”
“A técnica beirava a perfeição. Mas o impacto de verdade… veio depois. Hunter chega ao fim da raia. Encosta na borda. Respiração controlada. Depois apoia as mãos na borda e se ergue para fora da piscina, num único movimento, fluído, preciso. A água escorre pelo corpo dele. Gotas marcando o caminho por cada músculo bem definido: braços, peito, abdômen. Os shorts colados à pele. O cabelo loiro-acinzentado molhado, caindo sobre a testa. Os lábios carnudos entreabertos, puxando o ar com tranquilidade. Ele pega uma toalha. Passa lentamente pela nuca. Os bíceps se flexionam. O trapézio salta. A respiração de Dante falha.”
“Dante ficou de pau duro. Não pôde evitar. Foi como um soco seco no estômago, e mais abaixo. Ele abaixa discretamente as pernas. Está de bermuda larga, graças a Deus. Puxa a mochila para o colo, disfarçando. Hunter nem nota. Passa direto por ele sem olhar duas vezes. Os passos molhados ecoam pela lateral da piscina. Mas Dante... não consegue desviar o olhar. A pele molhada, o andar seguro, o silêncio ao redor. Tudo nele parecia provocar. De volta ao presente, o som do bar retorna. Dante ainda mastiga em silêncio, perdido na lembrança.”
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